Dos limites da jurisdição nacional e da cooperação internacional (Arts. 21 ao 41)

AutorJosé Antônio Ribeiro de Oliveira Silva - Carlos Eduardo Oliveira Dias - Guilherme Guimarães Feliciano - Manoel Carlos Toledo Filho
Ocupação do AutorJuiz Titular da 6ª Vara do Trabalho de Ribeirão Preto - Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça - Juiz Titular da 1ª Vara do Trabalho de Taubaté - Desembargador do Trabalho do TRT-15
Páginas61-83
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LIMITES DA JURISDIÇÃO NACIONAL
Esta norma, que corresponde à do art. 88 do CPC
de 1973, dene, como o próprio título do capítulo
evidencia, os “limites da jurisdição nacional”. Isso por-
que o Estado brasileiro é soberano em seu território,
motivo pelo qual as regras do processo que ele dis-
ciplina se aplicam aos processos conduzidos pelas
autoridades judiciárias brasileiras, é dizer, pelos ju-
ízes brasileiros.
Daí que até mesmo pessoas naturais ou jurídi-
cas estrangeiras se sujeitam aos efeitos das decisões
judiciais tomadas no Brasil, especialmente nas si-
tuações jurídicas descritas neste art. 21: 1ª) se o réu
tiver domicílio em qualquer município do território
brasileiro e, sendo pessoa jurídica, basta que ela te-
nha agência, lial ou sucursal no Brasil para que se
considere aqui domiciliada; 2ª) se a obrigação (de
dar ou pagar, fazer, não fazer e entregar coisa) ti-
ver de ser cumprida no Brasil; 3ª) se o fundamento
da ação for fato ocorrido ou ato jurídico praticado em
nosso território. Em qualquer dessas situações, o au-
tor pode ajuizar sua demanda no Brasil, observando
as normas de distribuição de competência (critérios
material, funcional e territorial).
Claro que, em situações limítrofes como essas,
pode haver também a propositura de ação perante
órgãos jurisdicionais estrangeiros, vale dizer, em
outros países, envolvendo as mesmas partes, com a
mesma causa de pedir e inclusive o mesmo pedido,
não se podendo falar, nesse caso, em litispendência
e coisa julgada, a teor do art. 24 do novo Código de
Processo Civil. O que poderá haver é a homologação
de decisão estrangeira para que surta efeitos no
Brasil, nos moldes dos arts. 960 a 965 do CPC de 2015,
o que será objeto de comentários oportunamente.
PROCESSO DO TRABALHO
À primeira vista, parece plenamente compatível
com o processo do trabalho esta norma do art. 21
do novo Código de Processo Civil porque, a rigor,
os juízes e tribunais do trabalho somente podem
exercer a jurisdição trabalhista nos limites do terri-
tório brasileiro, sendo competentes para todas as
ações trabalhistas aqui ajuizadas, ainda que envol-
vam pessoas naturais ou jurídicas estrangeiras.
Contudo, dadas as especicidades das relações
jurídicas trabalhistas, no processo do trabalho temos
regras próprias e, portanto, não necessitamos do re-
gramento do CPC.
Embora as regras do art. 651 e §§ da CLT se re-
ram a critérios de competência territorial, elas
também fazem referência à jurisdição trabalhista e a
seus limites, bastando uma leitura atenta, especial-
mente de seu § 2º, para isso constatar.
Duas situações podem ser destacadas: 1ª) o tra-
balhador, brasileiro ou estrangeiro, prestou serviços
a empregador (brasileiro ou estrangeiro) que tem
domicílio no Brasil, ainda que se trate de lial ou
agência aqui sediada, em território brasileiro; 2ª) o tra-
balhador brasileiro prestou serviços a empregador
(brasileiro ou estrangeiro) que tem domicílio no Bra-
sil, mas o fez no estrangeiro.
Em ambas as hipóteses o trabalhador pode ajui-
zar ação trabalhista perante autoridade judiciária
brasileira, que será competente para o processamento
e o julgamento da demanda.
TÍTULO II
DOS LIMITES DA JURISDIÇÃO NACIONAL E DA COOPERAÇÃO
INTERNACIONAL
CAPÍTULO I
DOS LIMITES DA JURISDIÇÃO NACIONAL
Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que:
I — o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil;
II — no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação;
III — o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil.
Parágrafo único. Para o f‌im do disposto no inciso I, considera-se domiciliada no Brasil
a pessoa jurídica estrangeira que nele tiver agência, f‌ilial ou sucursal.
Comentário de José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva
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Comentários ao Novo CPC
Na primeira hipótese, se os serviços foram
prestados no Brasil as obrigações trabalhistas cor-
respondentes serão regidas pela legislação brasileira
(Constituição da República, CLT e legislação espar-
sa), devendo a ação ser ajuizada na Vara do Trabalho
que tem “jurisdição” sobre o local em que o traba-
lhador prestou os serviços, ainda que tenha sido
contratado em outro lugar ou até no estrangeiro,
em conformidade com a regra do art. 651, caput, da
CLT.
Na segunda hipótese, a regra aplicável é a do § 2º
do art. 651 da CLT, segundo a qual a “competência”
das Varas do Trabalho estende-se às lides ocorri-
das em agência ou lial no estrangeiro, desde que
o trabalhador seja brasileiro e não haja convenção
internacional dispondo em contrário. O que impor-
ta, então, é a nacionalidade do trabalhador, e não da
empresa. De se destacar: essa regra não é de compe-
tência territorial, mas de “jurisdição”, porque ainda
que aplicável a normativa trabalhista do país onde
os serviços foram prestados, presentes estes dois
requisitos — trabalhador brasileiro e ausência de
convenção internacional em sentido contrário —, a
ação trabalhista pode ser ajuizada no Brasil. É dizer,
ainda que os fatos tenham ocorrido em outro país (no
exterior) e as obrigações trabalhistas correspondentes
sejam regidas por outro ordenamento jurídico, para
a proteção aos trabalhadores brasileiros, a eles se
faculta a propositura de sua demanda em território
brasileiro, numa clara situação de “extensão da juris-
dição trabalhista” dos juízes brasileiros.
Portanto, essa regra do § 2º não dene compe-
tência territorial, tanto que, xada a “competência”
da Justiça do Trabalho brasileira, há de se procurar
nas demais regras deste art. 651 a denição do juízo
competente, em razão do território.
Embora tenhamos que comentar essa situação
mais adiante, convém já apontar que, nesse caso, a
doutrina do processo do trabalho entende que com-
petente seria a Vara do Trabalho do local da sede ou
lial da empresa no Brasil, ou a do local da contrata-
ção antes de o empregado ir para o exterior.
No entanto, perlhamos entendimento no sen-
tido de que, no caso examinado, a ação pode ser
ajuizada no local do domicílio do trabalhador ou na
Vara do Trabalho da localidade mais próxima, numa
interpretação sistemática e lógica dos §§ 1º e 2º do
art. 651 da CLT, concretizando-se, assim, o princípio
da facilitação do acesso à justiça, uma vez que o tra-
balhador, desempregado e hipossuciente, poderia
fazer a opção pelo local que considerasse mais con-
veniente à defesa de seus direitos. Esta diretriz se
aplica com maior razão se a empresa a ser deman-
dada não tiver sede ou lial no Brasil. A propósito, a
doutrina majoritária entende possível o ajuizamento
dessa demanda em território brasileiro. Veja-se:
“... não obstante os obstáculos operacionais para a
propositura da demanda em face de empresa que não
tenha sede ou lial no Brasil, mostra-se perfeitamente
possível a noticação do empregador por carta
rogatória, sendo competente a Vara do Trabalho, por
aplicação analógica do art. 88, I e II, do CPC. Se ele
aceitará, ou não, submeter-se à jurisdição da Justiça
Laboral brasileira, já é problema alheio à questão da
competência.” (LEITE, 2011, p. 280-281).
Quanto ao direito material aplicável ao contrato
de trabalho do trabalhador que prestou serviços no
estrangeiro, a Súmula n. 207 do TST rmava o enten-
dimento de que seriam as leis em vigência no país
da prestação de serviços e não aquelas do local da
contratação que iriam reger a relação jurídica traba-
lhista, em conformidade com o princípio da lex loci
executionis.
Entrementes, com a alteração do caput do art. 1º
da Lei n. 7.064/82, a jurisprudência passou a enten-
der que seria aplicável a norma do inciso II do art. 3º
da referida lei, segundo a qual se deve assegurar ao
trabalhador transferido para trabalhar no exterior,
“a aplicação da legislação brasileira de proteção ao traba-
lho, naquilo que não for incompatível com o disposto nesta
Lei, quando mais favorável do que a legislação territorial,
no conjunto de normas e em relação a cada matéria”. Ou-
tra não poderia ser a diretriz, pois pode ocorrer sério
desrespeito — com base na lei do país da prestação
dos serviços — aos direitos fundamentais do traba-
lhador, assegurados pela Constituição da República
Federativa do Brasil. Nesse caso, é indene de dúvida
que a aplicação da lei brasileira (mais protetiva) ao
trabalhador brasileiro que trabalha no estrangeiro se
reveste de plausibilidade e materializa o m maior
buscado pelo sistema jurídico, qual seja, o respeito à
dignidade humana (do trabalhador). Por isso mes-
mo foi cancelada, em 2012, a Súmula n. 207 do TST.

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