Dos direitos trabalhistas garantidos aos empregados acidentados

AutorCláudia Salles Vilela Vianna
Ocupação do AutorAdvogada, Mestra pela PUC/PR, Conferencista e Consultora Jurídica Empresarial nas Áreas de Direito do Trabalho e Direito Previdenciário, Coordenadora dos cursos de pós-graduação da EMATRA/PR e PUC/PR
Páginas127-172

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10.1. Pagamento dos primeiros dias de afastamento

O primeiro direito do trabalhador, quando da ocorrência de acidente de trabalho, refere-se ao pagamento, pela empresa, dos primeiros dias de afastamento e sobre o qual já me manifestei nos subitens 8.1.4 e 8.2.2 desta obra, quando tratei especificadamente das características do auxílio-doença e da aposentadoria por invalidez.

Assim, para que não fique repetitivo o conteúdo abordado, mas considerando a importância do tema, remeto o leitor a tais considerações, até porque entendo pela inconstitucionalidade dos dispositivos, devendo competir à Previdência Social o pagamento de todo o período, assim como ocorre para os demais segurados do Regime Geral de Previdência Social.

Cumpre aqui destacar, apenas, que sobre esse pagamento não deve incidir contribuição previdenciária (nem pela empresa, nem pelo trabalhador), porque não se trata de parcela remuneratória, destinada ao pagamento da prestação de serviços. Trata-se de benefício, cujo pagamento foi atribuído à empresa por força da Lei n. 8.213/91, mas que não guarda qualquer relação com a previsão de contribuição social disposta no art. 195,1, a, da CF/88. Confira-se:

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

1 - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:

  1. a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;

Por não se enquadrar no conceito de "rendimentos do trabalho" e, assim, não possuir natureza remuneratória, referido pagamento não poderia integrar o conceito de salário de contribuição, como assim prevê, inclusive, a própria redação do inciso I, art. 28, da Lei n. 8.212/91. Confira-se:

Art. 28. Entende-se por salário de contribuição:

I - para o empregado e trabalhador avulso: a remuneração auferida em uma ou mais empresas, assim entendida a totalidade dos rendimentos pagos, devidos ou creditados a qualquer título, durante o mês, destinados a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa;

Na prática cotidiana, contudo, há a cobrança de contribuição previdenciária sobre tal parcela, de forma inclusive automática, por meio do preenchimento da informação no formulário GFIP/SEFIP que é mensalmente encaminhado à Previdência Social.

Sobre o tema, o STJ já mantém entendimento pacificado quanto à ilegalidade, mas as decisões se aplicam somente às empresas que ajuizaram as respectivas ações judiciais, não havendo efeito erga omnes.

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Trabalhadores e empresas prejudicados podem e devem, portanto, ingressar com as ações judiciais necessárias à recuperação da contribuição que foi indevidamente paga, sendo pacífico o entendimento jurisprudencial no Superior Tribunal de Justiça, como já dito, e conforme ilustra o seguinte julgado (destaque meu):

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA A CARGO DA EMPRESA. INCIDÊNCIA SOBRE FALTAS ABONADAS.

  1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que incide contribuição previdenciária sobre os valores relativos ao abono de faltas, diferentemente do que ocorre com a importância paga nos quinze dias que antecedem o auxílio-doença, que não detém caráter salarial, de modo que não é qualquer afastamento do empregado que implica sua não incidência.

  2. Agravo regimental não provido.

(STJ - AgRg no REsp 1489916/PR - lâ Turma - Relator Ministro Benedito Gonçalves - Dje de 11.3.2015)

10.2. Depósito de FGTS durante o afastamento

Prevê expressamente a Lei n. 8.036/90, no art. 15, § 5a,99 a obrigatoriedade do depósito de FGTS durante a licença por acidente de trabalho, sendo a redação expressa do dispositivo a seguinte:

Art. 15. Para os fins previstos nesta lei, todos os empregadores ficam obrigados a depositar, até o dia 7 (sete) de cada mês, em conta bancária vinculada, a importância correspondente a 8 (oito) por cento da remuneração paga ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador, incluídas na remuneração as parcelas de que tratam os arts. 457 e 458 da CLT e a gratificação de Natal a que se refere a Lei n. 4.090, de 13 de julho de 1962, com as modificações da Lei n. 4.749, de 12 de agosto de 1965.

[...]

§ 5e O depósito de que trata o caput deste artigo é obrigatório nos casos de afastamento para prestação do serviço militar obrigatório e licença por acidente do trabalho.

Já o regulamento, constante do art. 28 do Decreto n. 99.684/90, repete os mesmos termos da lei ordinária, assim dispondo sobre o tópico:

Art. 28.0 depósito na conta vinculada do FGTS é obrigatório também nos casos de interrupção do contrato de trabalho prevista em lei, tais como:

[...]

El - licença por acidente de trabalho;

É certo, pois, o direito aos depósitos fundiários durante os primeiros dias de afastamento (pagos pela empresa, em face da Lei n. 8.213/91), bem como também enquanto perdurar o benefício de auxílio-doença acidentado concedido pelo INSS (espécie B91).

A questão que se impõe é a existência desse direito quando, impossibilitado de recuperar a capacidade laborativa para a profissão habitual ou de ser reabilitado pelo INSS para atividade diversa, passa o trabalhador a receber o benefício de aposentadoria por invalidez e, para elucidação do direito, cumpre transcrever as disposições contidas na CLT:

Art. 475. O empregado que for aposentado por invalidez terá suspenso o seu contrato de trabalho durante o prazo fixado pelas leis de previdência social para a efetivação do benefício.

§ 1e Recuperando o empregado a capacidade de trabalho e sendo a aposentadoria cancelada, ser-lhe-á assegurado o direito à função que ocupava ao tempo da aposentadoria, facultado, porém, ao empregador, o direito de indenizá-lo por rescisão do contrato de trabalho, nos termos dos arts. 477 e 478, salvo na hipótese de ser ele portador de estabilidade, quando a indenização deverá ser paga na forma do art. 497.

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§ 2e Se o empregador houver admitido substituto para o aposentado, poderá rescindir, com este, o respectivo contrato de trabalho sem indenização, desde que tenha havido ciência inequívoca da interinidade ao ser celebrado o contrato.

Art. 476. Em caso de seguro-doença ou auxílio-enfermidade, o empregado é considerado em licença não remunerada, durante o prazo desse benefício.

É possível observarmos que, no art. 475, ao mencionar a aposentadoria por invalidez, a CLT informa a ocorrência de suspensão contratual, e no art. 476, quando se refere ao auxílio-doença, menciona uma situação de licença não remunerada.

Assim também faz referência o art. 63 da Lei n. 8.213/91. Confira-se:

Art. 63. O segurado empregado, inclusive o doméstico, em gozo de auxílio-doença será considerado pela empresa e pelo empregador doméstico como licenciado.

Parágrafo único. A empresa que garantir ao segurado licença remunerada ficará obrigada a pagar-lhe durante o período de auxílio-doença a eventual diferença entre o valor deste e a importância garantida pela licença.

Por tais razões, e porque o vocábulo "licença" refere um afastamento temporário, o Tribunal Superior do Trabalho vem mantendo o entendimento de interpretar restritivamente as disposições do inciso III do art. 28 da Lei n. 8.036/90, mantendo a obrigatoriedade do depósito fundiário tão somente no período do auxílio-doença, sem abrangência do período de aposentadoria, conforme ilustra a seguinte ementa:

RECURSO DE REVISTA. DEPÓSITOS DE FGTS. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRABALHO OU DOENÇA OCUPACIONAL. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO.

Suspenso o contrato de trabalho em decorrência de aposentadoria por invalidez, não há obrigatoriedade do empregador de efetuar os depósitos do FGTS, na medida em que o art. 15, § 5e, da Lei n. 8.036/90 refere-se a tal obrigatoriedade apenas nos casos de afastamento para prestação do serviço militar obrigatório e de licença por acidente do trabalho. Recurso de revista conhecido e provido. (TST - RR - 1019-36.2012.5.05.0461 - 2â Turma -Relatora Ministra Delaíde Miranda Arantes - Julgamento em 25/02/2015- DEJT de 6.3.2015)

Entendo que essa é, de fato, a melhor interpretação que deve ser conferida às regras vigentes, mas acredito que, havendo comprovação de culpa ou dolo na ocorrência do sinistro, por parte do empregador, terá a vítima o direito de postular o valor correspondente a esses depósitos em ação indenizatória.

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