Dos crimes contra a incolumidade pública

AutorFrancisco Dirceu Barros - Antônio Fernando Cintra
Ocupação do AutorMestre em Direito, Promotor de Justiça Criminal e Eleitoral, Doutrinador e especialista em Direito Penal e Processo Penal - Advogado criminalista há vinte e nove anos. Procurador do Estado, pós-graduado em Direito Público, escritor com sete o livros lançados
Páginas953-1067

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CAPÍTULO I Dos crimes de perigo comum

· Vide arts. 180 a 329, CC/1916; e arts. 1.511 a 1.590, CC/2002.

Incêndio

1. Tipo penal abstrato

Art. 250. Causar incêndio, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem:

· Vide art. 173, CPP.

· Vide art. 26, "e", Lei 4.771/1965 (Código Florestal).

· Vide art. 10, "a", Lei 5.197/1967 (Proteção à Fauna).

· Vide art. 20, Lei 7.170/1983 (Lei de Segurança Nacional).

· Vide Lei 9.605/1998 (Crimes e Infrações Administrativas contra o Meio Ambiente).

Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

Aumento de pena

§ 1º. As penas aumentam-se de um terço:

I - se o crime é cometido com intuito de obter vantagem pecuniária em proveito próprio ou alheio; II - se o incêndio é:

  1. em casa habitada ou destinada a habitação;

  2. em edifício público ou destinado a uso público ou a obra de assistência social ou de cultura;

  3. em embarcação, aeronave, comboio ou veículo de transporte coletivo;

  4. em estação ferroviária ou aeródromo;

  5. em estaleiro, fábrica ou oficina;

  6. em depósito de explosivo, combustível ou inflamável;

  7. em poço petrolífero ou galeria de mineração;

  8. em lavoura, pastagem, mata ou floresta.

    · Vide art. 41, Lei 9.605/1998 (Crimes e Infrações Administrativas contra o Meio Ambiente).

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    Incêndio culposo

    § 2º. Se culposo o incêndio, a pena é de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.

    · Vide art. 89, Lei 9.099/1995 (Juizados Especiais).

    2. Tipicidade concreta ou material

    - Regra geral: Haverá tipicidade concreta ou material com a lesão ao objeto jurídico analisado no caso concreto.

    - Exceção: entendemos ser possível a aplicação do princípio da insignificância na chamada lesão ínfima ao objeto jurídico, desde que sejam identificados os vetores cuja presença, segundo o STF (HC 84412/SP - Rel. Ministro Celso de Mello), legitima o reconhecimento desse princípio, quais sejam: a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.

    3. Elemento subjetivo do delito de incêndio

    - O elemento subjetivo do tipo é o dolo.

    4. Elemento normativo do delito de incêndio

    - No § 2º, a culpa é o elemento do tipo normativo em conformidade com a moderna concepção de Direito Penal, desenvolvida por Claus Roxin.

    - Na ótica da doutrina tradicional, a culpa é elemento subjetivo do tipo.

    5. Elemento subjetivo-normativo (Preterdolo)

    - No delito em estudo não se admite a forma preterdolosa.

    6. Objeto jurídico e resultado jurídico

  9. Objeto jurídico do delito de incêndio

    - O legislador, ao criar e estabelecer pena para o delito supracitado, teve como principal objetivo proteger a incolumidade pública, tendo-se em vista o perigo comum que pode resultar das chamas provenientes de um incêndio.

    b) Resultado jurídico

    Perigo concreto ao objeto jurídico "incolumidade pública".

    7. Resultado naturalístico

    - É delito material, exige, in casu, a ocorrência perigo concreto de dano.

    STJ: Na taxionomia generalizada, existem, no que se liga a resultado, duas abordagens. Em relação ao resultado jurídico (ofensa ao bem jurídico), os delitos poderiam ser de perigo (concreto ou, então, presumido) e de dano. Em relação ao resultado material (resultado material ou evento natural resultante inseparável), os crimes podem ser, segundo grande parte dos doutrinadores pátrios, materiais, formais e de mera conduta. Assim, de início, nesta linha, todo delito tem seu resultado jurídico (dano ou perigo a bem jurídico), mas nem todo crime apresenta um resultado natural ou material (só para os materiais ele se apresenta imprescindível). Nesta dupla abordagem, que não apresenta qualquer relação direta ou biunívoca, é de se notar que existem crimes de perigo e que são, simultaneamente, materiais. É o que ocorre com o delito de incêndio. Ele é material (sem o fogo ele não poderia existir) e de perigo concreto (e comum). (HC 104371/ SE, rel. Min Felix Fischer, 5.ª Turma, j. 18.11.2008).

    7.1. Lesão ao objeto jurídico (Consumação)

    - Consuma-se o delito com o efetivo estabelecimento da situação de perigo concreto comum.

    7.2. Perigo de lesão fatal ao objeto jurídico (Tentativa)

    - A tentativa só é possível no incêndio doloso, uma vez que o crime culposo, em regra, não admite tentativa.

    8. Persecução penal judicial do delito de incêndio

    8.1. Ação penal

    A ação penal é pública incondicionada.

    De forma excepcional, é possível ser interposta a ação privada subsidiária da pública na hipótese prevista no artigo 5º, inciso LIX, da Constituição Federal.

    8.2. Início da persecução penal judicial

    O início da persecução penal judicial no crime em comento ocorre de três formas:

  10. No incêndio culposo, o delito é de menor potencial ofensivo; portanto, não havendo possibilidade da transação penal, o início da persecução penal judicial ocorre de duas formas:

    1) Com o recebimento da denúncia que é ofertada pelo representante do Ministério Público;

    2) Com o recebimento da queixa-crime subsidiária da pública na hipótese prevista no artigo 5º, inciso LIX

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    (será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal), da Constituição Federal.

    Nas demais modalidades:

  11. Com o recebimento da denúncia que é ofertada pelo representante do Ministério Público;

  12. Com o recebimento da queixa-crime subsidiária da pública na hipótese prevista no artigo 5º, inciso LIX (será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal), da Constituição Federal.

    8.3. Início da persecução penal extrajudicial

    1) No caso da ação penal pública incondicionada, o início do procedimento inquisitorial ocorre com uma das formas infracitadas:

  13. Portaria da autoridade policial de ofício, median-te simples notícia do crime.

  14. Ofício requisitório do Ministério Público.

  15. Requerimento de qualquer pessoa do povo - notitia criminis (art. 27 do CPP).

  16. Auto de prisão em flagrante.

    · Entendemos que o atual artigo 5º, inciso I, do Código de Processo Penal, que autoriza o juiz a requisitar o Inquérito ex officio, não foi recepcionado pela Constituição Federal. Hoje, o sistema acusatório no Processo Penal brasileiro tem assento constitucional, o que não ocorria anteriormente. Assim, quando a Carta Magna preconiza, no seu art. 129, inciso I, ser exclusividade a iniciativa da propositura da ação penal pública ao Ministério Público, vedam-se ao juiz os procedimentos ex officio, cujo interesse maior é dos titulares da ação penal. Esta será uma das inovações do novo Código de Processo Penal.

    2) No caso da ação penal privada subsidiária da pública, o início do procedimento inquisitorial ocorre com o requerimento do ofendido ou representante legal (art. 100, § 2º, do Código Penal, ou do artigo 30, c.c. artigo 29 do Código de Processo Penal), ou, em caso de morte, do cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

    9. Preceito penal secundário (Das penas)

  17. Na forma simples, a pena é de reclusão, de três a seis anos, e multa.

  18. Na forma majorada a pena é aumentada de um terço.

  19. No caso do incêndio culposo a pena de detenção, de seis meses a dois anos.

  20. Na forma qualificada pelo resultado, devemos considerar duas hipóteses:

    1ª hipótese: se do crime doloso de perigo comum resulta lesão corporal de natureza grave, a pena privativa de liberdade é aumentada de metade; se resulta morte, é aplicada em dobro.

    2ª hipótese: no caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; se resulta morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço.

    9.1. Possibilidade de suspensão condicional do processo

    No delito em comento, só é possível a suspensão condicional do processo na modalidade culposa, eis que a pena mínima é inferior a 1 ano; portanto, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena.

    Nas formas simples, majorada e qualificada pelo resultado (lesão corporal grave ou morte), não é possível a suspensão do processo em virtude de a pena cominada ser superior a um ano.

    9.2. Possibilidade de transação penal

    A transação penal só é possível na modalidade culposa, eis que a pena máxima é inferior a 2 (dois) anos.

    Exceção 1: impossibilidade da transação penal no caso de concurso material, continuado e formal. (No mesmo sentido: Superior Tribunal de Justiça STJ; RHC 27.068; Proc. 2009/0213659-4; SP; Sexta Turma; Rel. Min. Og Fernandes; Julg. 31/08/2010; DJE 27/09/2010) LEI 9.099, art. 61; CP, art. 71).

    Nas formas simples, majorada e qualificada pelo resultado (lesão corporal grave ou morte), não é possível a transação penal, visto tratar-se de modalidades em que a pena máxima é superior a 2 (dois) anos; entretanto, a Lei nº 11.313/2006 tornou possível a aplicação dos Institutos do Juizado Especial Criminal nos crimes de menor potencial ofensivo conexos ao rito comum, dispondo no parágrafo único do artigo 69 da Lei 9.099/95 que:

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    Na reunião de processos, perante o Juízo comum ou o Tribunal do Júri, decorrentes da aplicação das regras de conexão e continência, observar-se-ão os institutos da transação penal e da composição dos danos civis.

    9.3. Análise da possibilidade de concessão da fiança extrajudicial e judicial

  21. Fiança extrajudicial:

    No crime de incêndio na forma culposa, não estando presente nenhuma das hipóteses previstas nos incisos I e IV do novo artigo 324 do Código de Processo Penal, é possível a autoridade policial arbitrar a fiança, pois é delito que tem pena máxima de prisão não superior a quatro anos...

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