Do inadimplemento das obrigações

AutorBassil Dower, Nelson Godoy
Ocupação do AutorProfessor Universitário e Advogado em São Paulo
Páginas309-321

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25. 1 Apresentação

Nesta parte final do Direito das Obrigações, o nosso Código Civil separa a disciplina sob os seguintes títulos: "Do adimplemento e extinção das obrigações" e "Do inadimplemento das obrigações". São dois fenômenos diversos. Já tratamos do primeiro. Passamos para o estudo do segundo: "Do inadimplemento das obrigações".

O inadimplemento das obrigações, ou seja, o não cumprimento das obrigações encontra-se sistematizada e ordenada com suas causas e efeitos, na seguinte seqüência:

  1. as causas: aqui trataremos da mora e respectivo descumprimento (inadimplemento absoluto e relativo, total e parcial);

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  2. os efeitos: analisaremos as perdas e danos, os juros, a cláusula penal e as arras ou sinal.

    Em cada capítulo faremos um estudo dessas figuras, começando pela mora, no próximo capítulo. Entretanto, no presente capítulo, trataremos da inexecução obrigacional derivada de fato não imputável ao devedor, situada na categoria de caso fortuito ou força maior, que não traz o dever de indenizar para qualquer das partes.

25. 2 Regra geral sobre o inadimplemento

A regra geral sobre o inadimplemento encontra-se no art. 389 do CC, in verbis:

"Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado".

Como as obrigações são criadas, devem ser cumpridas pelos sujeitos e, uma vez executadas no tempo, modo e nas condições estipuladas, produzem o fim desejado. Vale dizer, com a execução da prestação, a obrigação se extingue.

Nascida a obrigação, o devedor tem o encargo de realizá-la e o credor o direito de exigi-la no tempo e modo convencionados. Não cumprida a prestação no tempo e modo pactuados, fica o devedor sujeito a pagar uma indenização dos eventuais prejuízos sofridos pelo credor, que são obtidos pela apuração das perdas e danos, consoante mostra a regra geral transcrita acima.

Portanto, quem não cumpre a obrigação tem o dever de indenizar pelos prejuízos que causou.

Exemplificando: A firma "A", proprietária de uma fábrica de gelo, contrata "B" para instalar novos equipamentos com o fim de elevar a produção diária de 24.000 quilos para 48.000 quilos. Entrando em funcionamento, verificou-se que a produção esperada não se consumou, alcançando, apenas, 36.000 quilos diários.

Para obter a produção desejada, "A" contratou "C" que corrigiu os defeitos de instalação do novo equipamento, obtendo, assim, a produção desejada.

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Facilmente constata-se o prejuízo que teve "A" e, assim, pode propor ação com base no referido art. 389 do CC, para apurar as perdas e danos em face da inexecução de uma obrigação. Os prejuízos estão evidentes: o que "A" deixou de produzir a mais, desde a época da instalação dos equipamentos por parte de "B" e o que pagou para "C".

A regra prevista no artigo supratranscrito é de caráter geral: ocorrendo o não cumprimento de uma obrigação pelo modo e no tempo devidos, (no caso por parte de "B") responde por perdas e danos, dando lugar a uma ação de indenização de prejuízos. Vale dizer, um ato que causa dano ao credor, intencionalmente ou não, deve o devedor repará-lo, pagando o prejuízo.

A responsabilidade consiste, pois, na obrigação de reparar os danos causados a outrem pela violação do dever de cumprir com a obrigação. Assim, abrange tanto a obrigação de reparar danos resultantes do inadimplemento, da má-execução como o atraso no cumprimento de obrigações negociais. Não pode haver responsabilidade sem a existência de um prejuízo sofrido por alguém, em conseqüência do não cumprimento da obrigação. São danos patrimoniais e morais, suscetíveis de serem avaliados em termos pecuniários, como vimos no exemplo dado acima.

25. 3 Inadimplemento das obrigações decorrentes dos contratos unilaterais e bilaterais

Sempre devemos ter em mente que as obrigações são relações jurídicas em que o devedor assume o dever de dar, fazer ou não fazer alguma coisa em favor do credor e, para que esta relação exista, é necessária uma causa originária. Essa causa ou causas são as fontes das obrigações e o "contrato" é uma delas.

"Contrato" é acordo de vontade entre duas ou mais pessoas com a finalidade de adquirir, modificar ou extinguir direitos. Ele gera principalmente obrigações. Se essas obrigações se destinam apenas a uma das partes, diz-se que esse contrato é unilateral; se as obrigações forem para as duas partes, o contrato é bilateral. Na compra e venda, por exemplo, o contrato é bilateral, porque nasce a obrigação para o vendedor de transferir o domínio do bem e, para o comprador, a de pagar o preço.

O art. 392 do CC diz, que: "Nos contratos benéficos, responde por simples culpa o contratante, a quem o contrato aproveite, e por dolo aquele

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a quem não favoreça". Vale dizer, responderá pelo dever de ressarcir os danos causados, aquele a quem o contrato aproveite ou ao outro se agir dolosamente.

Exemplificando: o comodato, que é o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis (CC, art. 579), é considerado um contrato benéfico porque somente uma das partes colhe proveito no contrato. Seria injusto a parte a quem cabe o encargo de favorecer a outra, reparar danos ou prejuízos por simples culpa. A lei favorece a pessoa a quem o contrato não aproveita, que só responde quando age dolosamente. Já o comodatário, o favorecido, responde pela reparação dos danos ou dos prejuízos a que deu causa por simples culpa, de modo que terá que conservar a coisa, como se fosse sua própria, bem como usá-la de acordo com o contrato ou com sua natureza, sob pena de responder por perdas e danos. Se negligenciar na conservação da coisa, ou der à mesma destinação diferente da pactuada, responderá culposamente, com reparação do prejuízo ao comodante.

Se o contrato for bilateral e oneroso, em que ambas as partes têm direitos e obrigações recíprocas, bastará uma simples culpa de uma das partes para que se lhe impute a obrigação de indenizar a parte prejudicada. "Nos contratos onerosos, responde cada uma das partes por culpa" (CC, art. 392, segunda parte). "Deixando o titular da obrigação de tomar as cautelas necessárias para evitar os danos, por eles responde até a resilição245bilateral do contrato de locação" (in RT 680/132). É o caso do imóvel locado, que sofre arrombamento após a desocupação, mas antes da entrega das chaves. Em casos fortuitos não-caracterizados como este, a indenização é devida.

25. 4 Exclusão da responsabilidade por caso fortuito ou força maior

"Em transporte rodoviário de mercadoria, embora o roubo de carga seja considerado caso de força maior, a companhia transportadora não terá sua responsabilidade afastada pelo evento se se obrigou, expressamente, a inde-nizar o contratante em tal hipótese, conforme inteligência do art. 1.058 (novo, art. 393) do CC" (in RT 761/256).

Poderá acontecer, antes de ocorrer a extinção da obrigação existente, o não-cumprimento da prestação em virtude de atos ou fatos alheios, estranhos à

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vontade do devedor. Se isto ocorrer, este não estará sujeito a reparar o dano ocasionado, exceto se a pessoa se obrigou, expressamente, a indenizar o contratante em tal hipótese, consoante mostra a ementa do acórdão destacado. "O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado" (CC, art. 393).

25.4. 1 Caso fortuito ou força maior

"O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir"246(parágrafo único do art. 393). "Reconhecida a culpa da transportadora pela falta de cuidado na proteção da carga, ensejando a ocorrência da sua subtração, - decidiu o tribunal - não é caso de reconhecer-se a isenção fundada em força maior" (in RT 759/195). "A morte de passageiro de trem causada por assalto à mão armada afasta o dever de indenizar do transportador, uma vez que se caracteriza como hipótese de caso fortuito ou força maior, pois não se insere nos próprios riscos inerentes ao transporte" (in RT 759/247).

"Caso fortuito", segundo De Plácido e Silva, "é expressão especialmente usada, na linguagem jurídica, para indicar todo caso, que acontece imprevisivelmente, atuado por uma força que não se pode evitar".247

"O defeito do veículo, em algum de seus componentes, que provoca o acidente, não se enquadra ao conceito de caso fortuito, ou força maior", explica Arnaldo Rizzardo. E continua: "O fato de o...

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