Dissídio (ação) individual

AutorCarlos Henrique Bezerra Leite
Páginas224-269
224 Carlos Henrique Bezerra Leite
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DISSÍDIO (AÇÃO) INDIVIDUAL
1. Terminologia, conceitos e espécies
A CLT, em seu Título X (“DO PROCESSO JUDICIÁRIO DO TRABA-
LHO”), dedica o Capítulo III aos “Dissídios Individuais” e o Capítulo IV aos
“Dissídios Coletivos”.
Não obstante, os arts. 837 a 841 da CLT, que integram a Seção I do referido
Capítulo III do Título X, tratam apenas da “Forma de Reclamação e da Notica-
ção”, sendo certo que o art. 840 disciplina que a “reclamação poderá ser escrita
ou verbal”.
Vê-se, portanto, que o Texto Consolidado confunde a denominação de
importantes institutos e não prima pela boa terminologia da moderna ciência
processual. Vale dizer, a CLT utiliza promiscuamente os termos “processo”,
“dissídio” e “reclamação” como se fossem expressões sinônimas, o que pode
gerar confusões para a boa interpretação e aplicação das normas de direito
processual do trabalho.
A rigor, a palavra “dissídio” signica conito, discórdia, dissidência,
dissensão. Logo, é impróprio utilizá-la como sinônimo de processo ou de ação.
É importante advertir que o art. 7º, inciso XXIX, da CF emprega expressa-
mente o termo “ação”, ao prever, como direito fundamental dos trabalhadores:
ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo pres-
cricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de
dois anos após a extinção do contrato de trabalho” (grifos nossos).
O termo “reclamação”, por sua vez, é um resquício da época em que a
Justiça do Trabalho pertencia ao Poder Executivo, ou seja, é uma expressão
inerente ao direito administrativo.
A legislação processual civil faz nítida distinção entre ação e processo,
sendo ambos inconfundíveis com dissídio. Aliás, este último termo sequer inte-
gra o elenco dos institutos do direito processual civil pátrio.
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Destarte, adotando-se o diálogo das fontes do processo do trabalho e do
processo civil à luz do fenômeno da constitucionalização do direito processual,
podemos armar que os termos “dissídio individual” ou “reclamação traba-
lhista individual” signicam “ação individual”.
Dissídio individual (ação individual) é um direito fundamental reconhecido
a toda pessoa física ou jurídica, bem como a alguns entes sem personalidade jurí-
dica, mas com capacidade processual, de invocar a jurisdição, que é um serviço
público essencial prestado pelo Estado-Juiz.
Na CLT, há duas espécies de dissídios: dissídio individual e dissídio
coletivo.(1)
O dissídio individual se subdivide em: dissídio individual simples e dissí-
dio individual plúrimo.
No dissídio individual simples, o reclamante, que pode ser o empregado
ou o empregador, é o próprio titular do direito material alegado na ação que
gura no seu polo ativo.
No dissídio individual plúrimo são dois ou mais empregados os reclaman-
tes que formam um litisconsórcio ativo facultativo (CLT, art. 842). Vale dizer,
nesta espécie de demanda trabalhista os empregados de uma mesma empresa
podem litigar como reclamantes no mesmo processo. Não há previsão para o
dissídio individual plúrimo proposto por empregadores, mas pode haver litis-
consórcio passivo facultativo de empresas, tal como ocorre nas ações em que o
autor pede a responsabilidade principal do empregador formal e subsidiária do
tomador dos serviços (TST, Súmula n. 331, IV).
O dissídio coletivo pode ser: de natureza econômica, de natureza jurídica,
originários, de revisão e de greve (vide Capítulo XIX).
2. Elementos da ação individual trabalhista
Para que o dissídio individual (ação individual) possa existir validamente,
é preciso que reúna alguns elementos sem os quais não haverá uma adequada
relação jurídica processual entre o Estado-Juiz e aquele que invoca a prestação
jurisdicional. Assim como ocorre no processo civil, os elementos da ação traba-
lhista são: as partes, o pedido e a causa de pedir.
As partes são elementos subjetivos da ação, também chamadas de sujei-
tos ou sujeitos da ação, gurando nos polos ativo e passivo da relação jurídica
processual. Como já vimos, quando há pluralidade de pessoas (ou entes com
capacidade processual) no polo ativo, temos o litisconsórcio ativo; no polo
(1) Sobre dissídio coletivo, ver Capítulo XIX.
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passivo, litisconsórcio passivo. Quando, porém, há pluralidade de pessoas no
polo passivo e ativo ao mesmo tempo, temos o litisconsórcio misto.
Outro elemento da ação é o pedido, conhecido por elemento objetivo ou objeto
da ação, que se classica em imediato e mediato. O primeiro consiste em solicitar
que o Estado dirima o conito de interesses, por uma das cinco formas de presta-
ção jurisdicional, enquanto o segundo diz respeito ao bem da vida vindicado pelo
autor da ação.
Como terceiro e último elemento identicador da ação, temos a causa de
pedir, na qual residem os motivos fáticos e jurídicos que justicam a invocação
da tutela jurisdicional.
O NCPC determina que, ao elaborar a petição inicial, o autor deve aduzir
“os fatos e fundamentos jurídicos do pedido” (NCPC, art. 319, III), sendo que
ambos constituem a “causa de pedir”.
A CLT, embora exija que na petição inicial escrita o autor formule pedido,
não faz referência aos fundamentos jurídicos do pedido. Ao revés, exige, tão
somente, “uma breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio” (art. 840,
§ 1º). Essa peculiaridade decorre, como é curial, da possibilidade do jus postu-
landi (CLT, art. 791) das próprias partes, que, via de regra, não possuem conhe-
cimentos técnicos para formular “fundamentos jurídicos do pedido”.
A causa de pedir, portanto, abrange os fatos jurídicos (ou seja, aqueles
fatos que têm importância para o Direito) e os fundamentos jurídicos do pedido.
Certo segmento da doutrina arma que os fatos (jurídicos) dos quais brota
o direito constituem a causa de pedir remota e os fundamentos jurídicos do
pedido, a causa de pedir próxima. Há, porém, uma corrente doutrinária que
sustenta serem os fatos (jurídicos) a causa de pedir próxima, enquanto os funda-
mentos jurídicos do pedido, causa de pedir remota. Há, ainda, uma subclassi-
cação doutrinária que divide a causa de pedir em: causa de pedir remota ativa,
que é aquela que geriu o direito (exemplo: o contrato, o acidente etc.), isto é,
a relação jurídica de direito material; causa de pedir remota passiva, que diz
respeito ao fato que estimula a pessoa a ajuizar a ação (exemplo: o prejuízo, o
inadimplemento etc.).
A doutrina nacional é praticamente unânime em armar que o nosso
sistema processual (civil e trabalhista) quanto à causa de pedir adotou a
teoria da substanciação (ou substancialização) da causa de pedir, pois exige que
a petição inicial contenha a descrição dos fatos e dos fundamentos jurídicos
(NCPC, art. 319, III; CLT, art. 840, § 1º), contrapondo-se, portanto, à teoria da
individualização (ou individuação), que se contenta com os fundamentos jurídi-
cos, sendo irrelevantes os fatos.
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