Direitos dos animais: Uma abordagem incrementadora

AutorGary L. Francione
Páginas111-127
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Gary L. Francione
Revista Brasileira de Direito Animal, e-issn: 2317-4552, Salvador, volume 14, numero 01, p. 111-127, Jan-Abr 2019
Direitos dos animais: uma abordagem incrementadora
animal Rights: An lncremental Approach1
Gary L. Francione2
Resumo: O presente artigo aborda a discussão entre duas diferentes teorias no campo de
defesa dos não humanos: os “direitos” dos animais e o “bem estar” dos animais. Enquanto os
benestarias sustentam que os interesses dos animais podem ser ignorados se as consequências
para os humanos justicarem isso, os que propõem os “direitos dos animais” sugerem um viés
abolicionista, igualando-os aos humanos. Analisa que, se por um lado ambas se contrapõem por
seus objetivos, há autores que entendem que o bem estar animal é a única maneira prática de
concretude dos direitos dos animais. Entretanto, a tese aqui defendida é a abordagem incremental
para os direitos dos animais, a qual é realista e reconhece que estes são seres sensíveis com valores
inerentes, sem com isso representar uma completa ameaça ao status de propriedade dos animais.
PalavRas-chave: Direito dos animais. Bem estar dos animais. Direito de propriedade.
Abolicionismo.
abstRact: This article addresses the debate between two different theories in the eld of
protection of non-human: the “animals’s right” and the “welfare” of the animals. While those
who advocate in favor of the “welfare” of the animals maintain that animal interests may be
ignored if the consequences to humans justify this, the proponents of the “animal rights suggest
an abolitionist bias equating them to humans. Reported that, on one hand both oppose because
of their subjects there are authors who believe that animal welfare is the only practical way of
amimal rights concreteness. However, the thesis defended here is the incremental approach to
animal rights, which is realistic and recognizes that these are sentient beings with inherent value,
without thereby representing a complete threat to the status of animals as a property.
KeywoRds: Animal’s right. Welfare of the animals. Property right. Abolitionism.
sumáRio: 1. Introdução - 2. “Direitos” / “bem-estar”: Uma importante distinção ou uma distração
irrelevante? - 3. Mito n. 1: O “bem-estar” animal funciona - 4. Mito n. 2: o Direito Animal não é
uma Alternativa Realista para o “Bem-Estar” Animal. - 5. Direitos Básicos - 6. Direitos animais:
uma abordagem em partes? - 7. Comclusão – 8. Notas de referência.
Revista Brasileira de Direito Animal, e-issn: 2317-4552, Salvador, volume 14, numero 01, p. 111-127, Jan-Abr 2019
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1 Introdução
Aqueles que se preocupam com a proteção dos animais têm debatido, por algum
tempo, os méritos relativos aos direitos dos animais e o “bem-estar” dos animais como uma
abordagem alternativa para aliviar as angústias dos não-humanos. Este debate tem aspectos
tanto de teorias losócas quanto de estratégias políticas um tanto complicadas, pelo menos
em parte, porque aqueles envolvidos no debate freqüentemente usam conceitos de forma
confusa e inconsistente. A maioria dos que defendem direitos para os animais, porém,
sustenta que, pelo menos alguns animais são sujeitos de direito, e que tratá-los apenas com
meios para ns humanos viola estes direitos. Ativistas dos “direitos dos animais” defendem
que as práticas violadoras dos direitos dos animais deveriam ser abolidas e não meramente
reguladas. A posição do “bem-estar” sustenta que os interesses dos animais podem ser
ignorados se as conseqüências para os humanos justicarem isso. Embora os benestaristas
possam discordar sobre qual o resultado deve ser admitido para suprimir os interesses dos
animais, todos eles aceitam que os animais sejam mortos ou submetidos ao sofrimento em
algumas hipóteses.3
O debate entre “direitos” / “bem-estar” dos animais tem, entretanto, ido numa
direção muito peculiar nos últimos anos. De um lado, muitos da comunidade de proteção
aos animais perecem olhar a distinção: “direitos” / “bem-estar” como envolvida numa
tediosa e irrelevante distração losóca à luz da inevitabilidade da “teoria do “bem-estar”
dos animais e da natureza supostamente utópica e irreal dos direitos dos animais. De outro
lado, muitos dos que apóiam a exploração dos animais parecem não apenas reconhecer a
relevância losóca, política e econômica da distinção, mas também entender os direitos
dos animais como uma concepção que representa uma ameaça prática e imediata a pelo
menos algumas formas de exploração dos animais.
Neste ensaio, eu gostaria de divulgar algumas das noções que costumam informar
a controvérsia “direitos” / “bem-estar”. Primeiramente, vou descrever brevemente as
respectivas posições dos exploradores dos animais e defensores dos animais no debate
“direitos” / “bem-estar”. Em seguida, vou demonstrar que a necessidade dos animais no
campo da teoria do “bem-estar” dos animais como uma maneira de conquistar direitos
para os animais é completamente fora de lugar e que, acrescentando problemas práticos
e morais, há diculdades estruturais com a teoria do “bem-estar” dos animais que fazem
com que esta seja altamente indesejável (senão impossível) nos levar, de qualquer forma,
ao encontro dos direitos dos animais. Em terceiro lugar, vou demonstrar que, embora a
predominante teoria dos “direitos” dos animais, como articulada por Tom Regan (1983),
advogue a imediata abolição de virtualmente todas as formas de exploração dos animais,
Regan consente com uma abordagem mais compartimentada dos direitos dos animais, e que
uma abordagem incrementadora não é inconsistente com a teoria dos “direitos”. Em quarto
lugar, vou demonstrar que há mais aspectos importantes na abordagem dos direitos que
podem ser implementadas de forma realística e prática, mesmo dentro do corrente sistema
jurídico que caracteriza o animal como uma propriedade.
A sabedoria prevalecente é a de que a teoria do “bem-estar” dos animais é a única
abordagem realista para obter justiça para os animais. Eu vou demonstrar que o “bem-
estar” animal não pode servir a este propósito e que , ironicamente, a teoria dos “direitos”
oferece um paradigma realista para a mudança incrementadora buscada pelos defensores
do “bem-estar”.

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