Direito de ir e vir relativizado

AutorMarcus Gomes
CargoJornalista
Páginas36-40
36 REVISTA BONIJURIS I ANO 32 I EDIÇÃO 664 I JUN/JUL 2020
CAPA
Marcus GomesJORNALSTA
DIREITO DE IR E VIR
RELATIVIZADO
Em 1918, o mundo se viu às voltas com a gripe espanhola e 50 milhões
de mortos. Foi um aprendizado. Um século depois, vivemos uma crise de
dimensão ainda desconhecida, em que a vida e a saúde devem prevalecer
Ahistória se repetiu. Há
102 anos, quando a gri-
pe espanhola irrom-
peu no mundo, houve
quem minimizasse
seus efeitos. Af‌inal, saíramos
da primeira guerra mundial (a
“guerra para acabar com todas
as guerras”, segundo o presi-
dente dos  Woodrow Wil-
son, que foi vítima da gripe e
esteve por um f‌io) e não have-
ria como obrigar a população a
obedecer novamente a toques
de recolher ou leis de circula-
ção, tolhendo-lhe o direito de
ir e vir.
As mortes em escala indus-
trial f‌izeram com que gover-
nos e nações mudassem de
ideia. As medidas sanitárias
impuseram a quarentena de
navios, a notif‌icação compul-
sória de casos, o fechamen-
to de escolas e a redução da
missa nas igrejas. No ápice da
pandemia, que ceifou a vida
de, pelo menos, 50 milhões de
pessoas em todo o mundo e
infectou 500 milhões (1/4 da
população à época), as portas
do comércio foram fechadas
e todo e qualquer evento que
estimulasse a concentração de
pessoas foi cancelado, como
teatro e futebol. Qualquer se-
melhança, portanto, com os
dias de hoje não é mera coin-
cidência.
Os que desobedeceram as
recomendações pagaram um
preço alto. No f‌im de 1918,
quando os soldados desmobi-
lizados retornavam da guerra,
uma manifestação religiosa
reuniu 200 mil pessoas na
Filadélf‌ia, nos Estados Uni-
dos. Uma semana depois, o
resultado era devastador:
todos os hospitais da região
estavam lotados e havia cinco
mil mortos.
No Brasil, que registrou 40
mil mortes em quatro meses
– de setembro de 1918 a janei-
ro de 1919 –, a gripe espanhola
deixou marcas profundas. En-
tre as vítimas, estava o presi-
dente Rodrigues Alves, eleito
para um segundo mandato
após uma década. Foi sob seu
primeiro governo, em 1904, que
o Rio de Janeiro enfrentou a
febre amarela, a peste bubô-
nica e a varíola, nessa ordem.
Alves, que perdera uma das f‌i-
lhas para a febre amarela, con-
tara com a ajuda do cientista
Oswaldo Cruz para pôr um f‌im
à série de enfermidades trági-
cas. A gripe espanhola, porém,
não estava na lista. Sequer
Rev-Bonijuris664.indb 36 19/05/2020 15:14:29

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