Direito animal e a inconstitucionalidade da 96a emenda à Constituição Brasileira

AutorDaniel Moura Borges - Heron José de Santana Gordilho
CargoUniversidade Federal da Bahia, Salvador, BA, Brasil - Universidade Federal da Bahia, Salvador, BA, Brasil
Páginas199-218
Direito Animal e a Inconstitucionalidade da 96a
Emenda à Constituição Brasileira
Animal law and the Unconstitutionality of the 96th Amendment to the
Brazilian Constitution
Heron José de Santana Gordilho
Universidade Federal da Bahia, Salvador – BA, Brasil
Daniel Moura Borges
Universidade Federal da Bahia, Salvador – BA, Brasil
Resumo: O presente artigo de revisão utiliza o
método interpretativo sistemático e, a partir de
pesquisa bibliográfica e documental, a análise da
constitucionalidade da Emenda Constitucional
n. 96, de 6 de julho de 2017, que excepcionou
a norma constitucional proibindo a prática de
atividades que submetam os animais à cruelda-
de, sempre que a atividade for considerada uma
manifestação cultural registrada como patrimô-
nio cultural imaterial. O artigo demonstra que
as emendas constitucionais, promulgadas pelo
poder constituinte derivado, não podem exceder
os limites materiais de reforma constitucional
estabelecidos em cláusulas pétreas, dentre eles,
a estabilidade dos direitos e garantias individuais
(art. 60, § 4º, IV da CF). O artigo analisa, ainda,
os argumentos apresentados pela Ação Declara-
tória de Inconstitucionalidade n. 227.175/2017,
concluindo pela inconstitucionalidade da referi-
da Emenda, uma vez que a prática de atos cruéis
contra os animais constitui uma ofensa direta ao
direito fundamental individual desses animais a
um meio ambiente sadio e equilibrado.
Palavras-chave: Controle de Constitucionalida-
de. Vaquejada. Direitos de Terceira Dimensão.
Abstract: This review article uses the systematic
interpretive method, and from a bibliographical
and documentary research, analysis of the
constitutionality of Constitutional Amendment
No. 96 of July 6, 2017, which excepted the
constitutional norm that prohibits the practice
of activities that subject the animals to
cruelty, whenever the activity is considered a
cultural manifestation registered as intangible
cultural heritage. The article demonstrates that
constitutional amendments promulgated by
the derived constituent power can not have the
material limits of constitutional reform set forth
in substantive clauses, including the stability
of individual rights and guarantees (article 60,
§ 4, IV of the CF). The article also analyzes
the arguments presented by the Declaratory
Action of Unconstitutionality n. 227,175 /
2017, concluding that the said Amendment is
unconstitutional, since the practice of cruel
acts against animals constitutes a direct offense
against the individual fundamental right to a
healthy and balanced environment.
Keywords: Control of Constitutionality.
Rodeo. Third-dimensional Rights.
Recebido em: 04/02/2018
Revisado em: 22/03/2018
Aprovado em: 29/03/2018
http://dx.doi.org/10.5007/2177-7055.2018v39n78p199
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200 Seqüência (Florianópolis), n. 78, p. 199-218, abr. 2018
Direito Animal e a Inconstitucionalidade da 96a Emenda à Constituição Brasileira
1 Introdução
No dia 6 de junho de 2017 foi publicada a Emenda Constitucional
(EC n. 96/17), que, ao acrescentar o § 7º ao artigo 227 da Constituição
Federal (CF), estabelece que as práticas desportivas que utilizem animais
não são consideradas cruéis, desde que sejam manifestações culturais re-
gistradas como patrimônio cultural imaterial.
O Congresso Nacional (CN) inicialmente aprovou a Lei n.
13.364/2016 para declarar a vaquejada como patrimônio cultural imate-
rial, em processo legislativo que sequer ouviu a opinião do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), órgão competente
para realizar estudos científicos e o registro das práticas que integram o
patrimônio cultural imaterial do país.
Na verdade, a Emenda n. 96/17 foi promulgada apenas oito me-
ses após a decisão que julgou a ADI n. 4.983/15 que, em 6 de outubro
de 2017, declarou inconstitucional a Lei do Estado do Ceará que regula-
mentava a prática de vaquejada, em um claro exemplo “ativismo congres-
sual”, uma espécie de reação legislativa com o mero objetivo de reverter
uma decisão do STF (BRASIL, 2017), o que se constitui em grave ofensa
ao princípio da separação dos poderes.
Em razão desse movimento de deslegitimação do STF, em 5 de se-
tembro de 2017, o Procurador Geral da República (PGR), por meio da
ADI n. 227.175/2017, arguiu a inconstitucionalidade da Emenda n. 96/17,
uma vez que o próprio STF já havia, repetidamente, decidido que práticas
desportivas e culturais que violem a integridade física dos animais, inclu-
sive a vaquejada, são inconstitucionais.
Inicialmente, este artigo irá abordar os limites materiais das mudan-
ças constitucionais a partir da teoria das normas constitucionais inconsti-
tucionais de Oto Barchof. Em seguida, será demonstrado que o direito ao
meio ambiente sadio e equilibrado, em sua dimensão subjetiva, é um di-
reito fundamental individual de terceira dimensão, constituindo-se, assim,
em uma das cláusulas pétreas da Constituição Federal.

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