Dimensionamento dos direitos políticos e da presunção de inocência no âmbito das normas constitucionais

AutorAndré Nogueira Cavalcante
Páginas5-63
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CAPÍTULO 1
DImensionamento dos direitos
políticos e da presunção de inocência
no âmbito das normas constitucionais
1.1 Introdução
A incursão no tema não pode se dar sem a análise da
Constituição Federal sob a ótica do constitucionalismo moder-
no, a denir princípios e regras constitucionais, normatividade
do texto constitucional e direitos fundamentais.
Portanto, no que se refere à presunção de inocência e
nos contornos da Constituição Federal de 1988, temos revela-
da a inuência das teorias iluministas sobre o sistema penal e
processual penal, a pugnar pela estrita legalidade das punições
e pela igualdade entre acusação e defesa, em um processo pú-
blico e acusatório, no lugar de um procedimento inquisitório
e secreto, tratando-se, desse modo, em reação ao sistema até
então vigente, baseado na tortura da pessoa do acusado, o qual,
desde já, era considerado culpado, cabendo a si demonstrar a
própria inocência, não sem antes se submeter a medidas de res-
trição à liberdade pessoal (GOMES FILHO, 1991, pp. 10 e 11).
6André Nogueira Cavalcante
Abalizando o entendimento corrente quanto à presun-
ção de inocência, temos a importante constatação de Guilher-
me de Souza Nucci (2010, p. 245):
No curso do processo, entre o recebimento da denún-
cia ou queixa e a sentença, várias medidas restritivas
podem ser autorizadas judicialmente. Cuidando-se de
restrição a direitos fundamentais, não se pode aplicar
o benefício da dúvida em prol da sociedade; necessita-se
resguardar o interesse individual, visto que o estado na-
tural é de inocência.
De outra banda, podemos armar com Bester (2005,
pp. 50 e 51), que os direitos políticos são tributários do prin-
cípio da soberania popular, exsurgidos do reconhecimento de
direitos e da limitação do poder público, conteúdo básico das
chamadas constituições liberais clássicas, colacionando-se,
ainda, a doutrina de José Afonso da Silva (2006, p. 344), no
seguinte sentido:
A Constituição traz um capítulo sobre esses direitos,
no sentido acima, como conjunto de normas que regula
a atuação da soberania popular (arts. 14 a 16). Tais nor-
mas constituem o desdobramento do princípio demo-
crático inscrito no art. 1º, parágrafo único, quando diz
que o poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente.
Anote-se que o instituto jurídico das inelegibilidades
está diretamente ligado ao conteúdo dos direitos políticos,
haja vista que se consubstancia, conforme José Afonso da Silva
(2006, p. 388), no impedimento à capacidade eleitoral passiva
(direito de ser votado).
Desse modo, passemos a analisar o tema sob a ótica do
constitucionalismo, conforme segue.
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Ficha limpa e presunção de inocência
1.2 Constituição e Constitucionalismo
O termo “constitucionalismo” signica limitação do poder
estatal e supremacia da lei (BARROSO, 2011, p. 27).
Ora, constitucionalismo remete à Constituição, a princípios
e regras constitucionais, cabendo observar que, de acordo com a
doutrina de Bonavides (2012, pp. 266 e 267), os princípios consti-
tucionais “se fazem a chave de todo o sistema normativo”, sendo
o resultado de uma longa caminhada teórica que veio a constitu-
cionalizar os princípios gerais de direito, infundindo-lhes o traço
qualitativo mais importante, qual seja, o da normatividade.
Em que pese a longa trajetória do direito ocidental, pode-se
estabelecer, como marco inicial do constitucionalismo, a Magna
Charta de 1215 que, restrita a resguardar os direitos feudais dos
barões ingleses, ao longo do tempo assumiu o papel de carta geral
de liberdades públicas (BARROSO, 2011, p. 32), tendo inuencia-
do, por exemplo, o conceito de presunção de inocência, tida como
desdobramento lógico do princípio do devido processo legal, este
último referenciado na Magna Charta, funcionando como um dos
princípios regentes da Constituição Federal e do Novo Código de
Processo Civil, conforme se depreende da leitura de seu art. 1º:2
Outro princípio regente concentra-se no devido pro-
cesso legal, cuja raiz remonta à Magna Carta de 1215
(“Nenhum homem pode ser preso ou privado de sua
propriedade a não ser pelo julgamento de seus pares
ou pela lei da terra”) [...] Buscou-se uma garantia e
2Art. 1o O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os
valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Fe-
derativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código [...] O dispositivo
alberga expressamente a necessidade de o CPC ser ‘ordenado, disciplinado
e interpretado’ com observância do ‘modelo constitucional’ [...]”. (BUENO,
2015, p. 41)

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