Desenvolvimento, instrumentalização do saber e governamentalidade

AutorAna Paula Poll
Páginas356-371
DESENVOLVIMENTO, INSTRUMENTALIZAÇÃO DO SABER E
GOVERNAMENTALIDADE
Ana Paula Poll1
Resumo:
O objetivo deste trabalho de orientação teórico empírica é demonstrar a manutenção de uma agenda pró -desenvolvimento
  passado. A despeito das descontinuidades históricas e políticas que separam as décadas
de 1940 e a primeira década do século XXI, a instrumentalização do saber é o elo que reúne o presente e o passado
recente. A trajetória da jovem cidade de Volta Redonda/RJ nos permite pensar acerca dos aspectos subjetivos e sub-
reptícios que envolvem as noções de desenvolvimento que compartilhamos, e com as quais as políticas públicas devem
lidar para produzir sua própria governabilidade hoje. Este artigo, resultado de pesquisa qualitativa, busca revelar a
imbricada relação entre desenvolvimento, instrumentalização do saber e governamentalidade.
Palavras-chave: Desenvolvimento. Poder. Saber. Governamentalidade. Volta Redonda/RJ
DEVELOPMENT, INSTRUMENTALIZATION OF KNOWLEDGE AND GOVERNAMENTALITY
Abstract:
The objective of this work (with empirical theoretical orientation) is to demonstrate the maintenance of a pro-development
agenda that reissues the 'old' agenda of the past. In spite of the historical and political discontinuities that separate the 1940s
and the first decade of the 21st century, the instrumentalization of knowledge is the link bet ween the present and the recent
past. The trajectory of the young city of Volta Redonda / RJ allows us to think about the subjective and sub-subjective
aspects that involve the notions of development that we share, and with which public policies must deal to produce their own
governability today. This article, the result of qualitative research, seeks to reveal the imbricated relat ionship between
development, instrumentalization of knowledge and governamentality.
Keywords: Development. Power. Knowledge. Governamentality. Volta Redonda/RJ.
Artigo recebido em: 13/09/2018 Aprovado em: 28/03/2019
DOI: http://dx.doi.org/10.18764/2178-2865.v23n1p356-370
1 Bacharelado em Ci ências Sociais. Doutora em Ciências Humanas (Antropologia Cultural) pelo PPGSA do Instituto de
Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professora Associada do Instituto
de Ciências Humanas e Sociais de Volta Redonda (ICHS) da UFRJ. Endereço: Universidade Federal Fluminense. Rua
Desembargador Ellis Hermydio Figueira, 783 - sala 307, Bloco A Aterrado. Volta Redonda RJ. E-mail:
anapaulapoll@yahoo.com.br
Ana Paula Poll
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1 INTRODUÇÃO
Na primeira década do século XXI observamos a implantação de grandes projetos de
desenvolvimento no Brasil. Esses projetos foram conduzidos principalmente pelo governo federal como
parte do Programa de Aceleração do Crescimento, também conhecido como PAC. Conduzidos pelo
governo de Luís Inácio Lula da Silva e Dilma Roussef. Neste contexto, observamos a construção de
empreendimentos que envolveram vultosos recursos financeiros obtidos através de consórcios
privados e públicos. Empreendimentos que demandaram grande aporte de mão de obra. Seguindo o
otimismo financeiro, arrefecido pelo cenário político e econômico do ano de 2015, o setor privado
também foi responsável, sozinho, por grandes investimentos. A idealização e implementação desses
projetos foram relacionadas a um novo ciclo de desenvolvimento, numa clara alusão ao
desenvolvimentismo das décadas de 1940 e 1950.
Esse novo ciclo de desenvolvimento também chamou a atenção da comunidade
acadêmica que passou a olhar atentamente para seus desdobramentos. No Brasil, na primeira década
do século XXI, refinarias de petróleo, hidrelétricas, portos, entre outros empreendimentos, ganharam
destaque. Na esteira desses investimentos, o sul fluminense viu surgir um parque automobilístico entre
as cidades de Itatiaia, Resende e Porto Real. Para os mais otimistas um novo ABC, uma referência ao
que representou para a produção automobilística brasileira, décadas atrás, as cidades paulistas de
Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul.
Na década de 1940, perto dali, a cidade de Volta Redonda1 foi planejada, construída para
fornecer as bases da industrialização do país, o aço. A cidade já nasceu símbolo do desenvolvimento
do Brasil. E o que a cidade símbolo do desenvolvimento, no passado, teria a nos dizer sobre
desenvolvimento hoje? Como o desenvolvimento, ou melhor, o discurso hegemônico sobre ele,
naquele município, configurou saberes e definiu os atores e seus respec tivos papéis na transição do
antigo ao aclamado novo ciclo (2005-2014)? São essas as respostas que este artigo pretende
responder.
Argumentamos neste trabalho2, de caráter teórico e empírico, que foi definindo o
desenvolvimento, seu sentido, o que representava e o que não estava contido em seu escopo, que
várias relações sociais e papéis foram estabelecidos. Nesse caso, o que está em jogo não são técnicas
de poder como a coerção ou a proibição (alicerçadas no controle dos recursos financeiros), longe
disso. Ao contrário, foi definindo semanticamente o que era desenvolvimento e quem eram os atores
qualificados para tratar desse processo que o poder público, com a colaboração de agentes privados,
produziu no passado e continua produzindo no presente sua governabilidade.

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