Território, desenvolvimento endógeno e capital social em Putnam e Bourdieu

AutorAntonio César Ortega - Vitor Alberto Matos
CargoDoutor em Economia pela Universidade de Córdoba, Espanha - Professor Titular aposentado do Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlândia, Minas Gerais,Brasil
Páginas35-60
Política & Sociedade - Florianópolis - Vol. 12 - Nº 24 - Mai./Ago. de 2013
3535 – 60
Território, desenvolvimento endógeno
e capital social em Putnam e Bourdieu
Antônio César Ortega1
Vitor Alberto Matos2
Resumo
O estudo do desenvolvimento não deve se restringir a um único campo teórico. Estudos recentes
sugerem a interação entre economia, história, sociologia e outras ciências humanas e sociais na
perspectiva do território como construção social, apoiada na cooperação e reciprocidade, ainda
que de natureza conf‌lituosa. Muitas dessas perspectivas partem do princípio de que a constru-
ção de um território requer a existência de “capital social” elevado que possibilite um ambiente
favorável ao engajamento visando ao desenvolvimento. Em Putnam, por exemplo, o capital social
é um aspecto essencial para a apreensão do caráter endógeno do desenvolvimento. Crítico dessa
perspectiva, Bourdieu, por sua vez, ressalta a necessidade de se introduzirem aspectos simbólicos
para a compreensão do desenvolvimento como construção coletiva dos agentes locais. Apesar
de certa proximidade entre suas formulações, sobretudo no tratamento teórico-interpretativo do
capital social no que se refere à sua extensão, as divergências entre esses autores não são despre-
zíveis. Interpretações interdisciplinares, mesclando elementos simbólicos, culturais e econômicos
são destacadas na análise de Bourdieu como elemento facilitador de diálogos envolvendo pensa-
mentos e escolas diversif‌icados, mas com profunda visão de interconexão.
Palavras-chave: Território. Desenvolvimento. Distritos industriais. Capital social.
1 Doutor em Economia pela Universidade de Córdoba, Espanha, e professor associado do Instituto de Economia
da Universidade Federal de Uberlândia, Minas Gerais, Brasil. É pesquisador e/ou consultor de organizações
multilaterais (FAO/ONU). É autor de artigos publicados nas revistas Economía, Sociedad y Territorio (2012),
Segurança Alimentar e Nutricional (2012), Econômica (Niterói, 2012), Revista de Economia e Sociologia Rural
(Impresso, 2011), entre outras. É autor de obras como Territórios deprimidos: os desaf‌ios das políticas de
desenvolvimento rural (Alínea/Edufu, 2008) e Desenvolvimento sustentável: homem e natureza no cerrado
mineiro” (Editora Roma, 2007), entre outros. E-mail: acortega@ufu.br.
2 Professor Titular aposentado do Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlândia, Minas Gerais,
Brasil. Doutor em Economia de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, Brasil. É autor de artigos
publicados na Revista Brasileira de Gestão e Desenvolvimento Regional (2009), na Revista Jurídica do Uni-
araxá (2005) e na Revista de Ciência e Tecnologia, Recife (1998), entre outras.
E-mail: vamatos@netsite.com.br.
http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2013v12n24p35
Território, desenvolvimento endógeno e capital social em Putnam e Bourdieu| Antônio César Ortega - Vitor Alberto Matos
36 35 – 60
1. Introdução
A literatura acadêmica que aborda o desenvolvimento territorial abrange
um diversicado espectro, que se estende desde perspectivas centradas nos
referenciais liberais, as quais partem do princípio da homogeneização ou ho-
rizontalização dos espaços, até formulações enfatizando a heterogeneidade em
função das condições econômicas, políticas, sociais e culturais concentradas
espacialmente em determinada localidade ou região. Essa polissemia do con-
ceito durante longo período contrapôs o intervencionismo estatal e as ações
autorreguladas do mercado.
Entre os anos 1970 e 1990 do século XX, frutos das tecnologias da in-
formação e comunicação, surgiram argumentos associando sua difusão global
ao desaparecimento das fronteiras e à perda de autonomia política e econô-
mica dos governos nacionais e locais, traduzidos segundo Haesbaert (2006)
pela expressão “m dos territórios”. Nas abordagens propostas por organis-
mos mundiais multilaterais, o desenvolvimento territorial é visto como “re-
ação autônoma” (PECQUEUR, 1987), em que condições virtuosas, a partir
das potencialidades internas aos territórios, promoveriam endogenamente o
desenvolvimento. Contrariamente, Pecqueur (1987), Boyer (2001), Benko
(2002), Reis (2002), entre outros, que ressaltam a heterogeneidade, mesmo
em tempos de globalização, sugeriam a capacidade de as iniciativas territoriais
gerarem formas virtuosas de inserção produtiva nos circuitos globais. Em ou-
tros termos, entende-se que o “território é nexo, ligadura e junção de conuên-
cias e conitualidades de projetos de sujeitos sócio-políticos” (BRANDÃO,
2007, p. 53).
Essa perspectiva que reconhece a heterogeneidade territorial supõe uma
abordagem interdisciplinar que associe economia, particularmente a institu-
cional, história, sociologia e outras ciências humanas e sociais3. A abordagem
institucional seria uma “tentativa de entender as possibilidades para o desen-
volvimento endógeno de economias de dinâmicas territorializadas, assentadas
na cooperação, em aprendizagem, conhecimentos tácitos e culturas técnicas
3 De acordo com Muls (2008, p. 3), na perspectiva territorial podemos identif‌icar aspectos ligados a instituições
formais (governos, sindicatos, representações de interesse) e aspectos associados a instituições informais,
como cooperação, conf‌iança, reciprocidade, altruísmo, todos destinados à regulação do comportamento das
pessoas em suas interações sociais.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT