Desconto de duplicada não aceita - responsabilidade do banco endossatário por indenização decorrente da ação de sustação de protesto, uma vez devolvida a mercadoria pelo endossante-sacado

AutorHaroldo Malheiros Duclerc Verçosa
Páginas203-210

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REsp 185.269-SP - 3° T. do STJ Rei. Min. Waldemar Zveiter j. 25,9.2000 DJU 6.11.2000

Ementa oficial: O banco que recebe por endosso, em operação de desconto, duplicata sem causa, responde pela ação de sustação de protesto e deve indenizar o dano dele decorrente, ressalvado seu direito contra a endossante.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da 3a T. do STJ, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr, Min. Ari Pargendler, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Ari Pargendler e Menezes Direito. Não participaram do julgamento os Srs. Ministros Pádua Ribeiro e Nancy Andrighi (2, art. 162, RISTJ).

Brasília, 25 de setembro de 2000.

Carlos Alberto Menezes Direito, Presidente. Waldemar Zveiter, Relator.

Relatório

O Exmo. Sr. Min. Waldemar Zveiter:

Jaime Cia. e outros moveram ação declara-tória de inexistência de obrigação cambial, c/c cancelamento de protesto e indeniza-ção por perdas e danos, contra Têxtil Trevisam e Rolim Ltda. e Banco do Estado de São Paulo S/A, alegando, em síntese, que comprou mercadorias da primeira ré, devolvendo-as em seguida, o que foi aceito pela vendedora, não obstante, logo após, receberam aviso de cobrança de duplicata através do Banespa, denunciando ao mesmo a devolução das mercadorias e que se tratava de duplicata sem aceite, advindo, porém, protesto, o que lhes causou prejuízos de ordem material e moral, insistindo este último em protestar o título sabendo da devolução das mercadorias.

O eminente Juiz sentenciante julgou procedente o pedido em relação à primeira ré e improcedente quanto ao Banco do Estado de São Paulo S/A aduzindo para tanto

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que: "Por se tratar de endosso traslativo, tem aplicação os princípios da autonomia e abstração, que informam o direito cam-biário, sendo desse modo inaplicável ao Banespa o fato das mercadorias terem sido devolvidas e desse fato ter sido regulamente informado antes de levar o título a apontamento, pois seu direito de endossatário é o emergente do título e não do negócio subjacente, como alegou.

Assim sendo a devolução das mercadorias não retiraria do Banespa o direito de levar a duplicata objeto do contrato de desconto bancário a apontamento por falta de pagamento, o que providenciou no trintídeo legal (vencimento em 10 de maio e apontamento em 19 de maio); até porque confessa a co-réu em sua contestação que não "providenciou a cobertura de sua conta corrente para débito do título que descontou, tanto que meses após o ato do protesto, veio a ser acionada pelo banco em execução fundada justamente no contrato de desconto bancário" (f.).

Os autores interpuseram apelação e a 2â Câmara Extraordinária do 1° TACivSP, por unanimidade, negou-lhe provimento, mantendo na totalidade do r. decisum mono-crático, em aresto assim ementado (f.):

Declaratória. Cambial. Duplicata. Existência de contrato de desconto configu-radorde título executivo. Possibilidade ainda assim do protesto, pois a lei não veda a dupla garantia do mesmo crédito. Recursos improvidos.

Opostos embargos declaratórios pelos autores, foram rejeitados (f.).

Inconformados, ainda, Jaime Cia. e outros interpuseram o presente recurso especial, com fulcro na alínea a do permissivo constitucional, no qual alegam violação aos arts. 159 e 160,1, do CC (f.).

Sustentam, em síntese, notificado o banco da devolução da mercadoria e sabedor de que nenhuma responsabilidade de pagamento poderia ser atribuída à sacada-recorrente, cabia-lhe protestar o título apenas com a finalidade de resguardar-se quan-to ao direito de regresso, com a ressalva de não restringir o nome da empresa que sabia não ser devedora.

"Além do mais", continua, "havia contrato de desconto de duplicata firmado entre a co-ré emitente e o Banespa, com cláusula expressa de que a responsabilidade da emitente independia da cambial, donde o banco estava amplamente amparado quanto ao recebimento de seu crédito, inexis-tindo necessidade de tirar o protesto".

Ao final, acrescenta, que o recorrido agiu exacerbadamente, pois sabia que a operação mercantil havia sido desfeita e tinha "título executivo" substituto da duplicata, devendo, por isso, responder, junto à co-ré, pelos danos reconhecidos na sentença.

O banco recorrido, em contra-razões, sustenta que houve "endosso-mandato" e mesmo que assim não fosse estaria amparado pelo § 4° do art. 13 da Lei 5.474/68, pois o protesto era medida necessária para resguardar o direito de regresso contra a sacadora-endossante (f.).

O apelo foi admitido às f. É o relatório.

Voto

O Exmo. Sr. Min. Waldemar Zveiter (relator): O acórdão recorrido assim dirimiu a controvérsia (f.):

A duplicata sacada pela co-ré, com vencimento para 10.5.1995, foi descontada junto ao Banespa, como se vê pela proposta de f.

O banco remeteu-a a protesto, que foi tirado em 25.5.1995 (f.). A seguir, na data de 25.7.1995, ajuizou execução contra a sacadora-endossante, fundando-a na proposta de desconto e na duplicata.

Não há que se cogitar, portanto, de mero endosso-mandato. O banco, na verdade, adquiriu o título.

Afirmam os recorrentes, desnecessário o protesto, pois a referida proposta de desconto já possibilitava ao credor a execução, e até em maior amplitude. A com-

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pra e venda, como a co-ré reconhece, fora desfeita, não se justificando a remessa da duplicata a Cartório.

Ocorre, no entanto, que a lei não proíbe o endosso antes do aceite da duplicata (RT 575/270, decisão do STF, e RT 701/ 178, do STJ), nem a duplicidade de títulos executivos para representação da mesma obrigação. Para impedir a perda da eficácia cambial, o banco-endossatário estava obrigado a tirar o protesto, sem o que não poderia, com base apenas na duplicata, acionar a sacadora (inexistindo aceite no título, contra a apelante é que não poderia agir).

Não estava obrigado a desistir daquele título, podendo permanecer com a dupla garantia, mormente porque a proposta de desconto constitui documento que por vezes tem sua executividade questionada na jurisprudência.

Sérgio Carlos Covello (Contratos Bancários, 2â ed., Saraiva, p. 291) lecio-na que, "para o...

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