Depositário infiel - Alienante fiduciário - Prisão civil -Inconstitucionalidade - Posicionamento do STF

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Superior Tribunal de Justiça

Habeas Corpus nº 51.936/SP

Órgão julgador: 1a. Turma

Fonte: DJe, 25.06.2008

Relator: Min. José Delgado

Impetrante: Defensoria Pública da União

Impetrado: 1a. Turma do Tribunal Regional Federal da 3a. Região

Paciente: M. A. M.

HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL. DEPOSITÁRIO INFIEL. MANIFESTAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

  1. O Supremo Tribunal Federal, em sessão realizada em 05.06.2007, no HC 90.172/SP, decidiu:

    EMENTA: Habeas Corpus. 1. No caso concreto foi ajuizada ação de execução sob o n. 612/ 2000 perante a 3a. Vara Cível de Santa Bárbara D'Oeste/SP em face do paciente. A credora requereu a entrega total dos bens sob pena de prisão. 2. A defesa alega a existência de constrangimento ilegal em face da iminência de expedição de mandado de prisão em desfavor do paciente. Ademais, a inicial sustenta a ilegitimidade constitucional da prisão civil por dívida. 3. Reiterados alguns dos argumentos expendidos em meu voto, proferido em sessão do Plenário de 22.11.2006, no RE n. 466.343/SP: a legitimidade da prisão civil do depositário infiel, ressalvada a hipótese excepcional do devedor de alimentos, está em plena discussão no Plenário deste Supremo Tribunal Federal. No julgamento do RE n. 466.343/SP, Rel. Min. Cezar Peluso, que se iniciou na sessão de 22.11.2006, esta Corte, por maioria que já conta com sete votos, acenou para a possibilidade do reconhecimento da inconstitucionalidade da prisão civil do alienante fiduciário e do depositário infiel. 4. Superação da Súmula n. 691/STF em face da configuração de patente constrangimento ilegal, com deferimento do pedido de medida liminar, em ordem a assegurar, ao paciente, o direito de permanecer em liberdade até a apreciação do mérito do HC n. 68.584/SP pelo Superior Tribunal de Justiça. 5. Considerada a plausibilidade da orientação que está a se firmar perante o Plenário deste STF - a qual já conta com 7 votos - ordem deferida para que sejam mantidos os efeitos da medida liminar.

  2. Fiel ao posicionamento do STF, concedo o habeas corpus em exame.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Teori Albino Zavascki, por unanimidade, conceder a ordem de "habeas corpus", nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Francisco Falcão, Luiz Fux (voto- vista) e Teori Albino Zavascki (voto-vista) votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Denise Arruda.

    Brasília (DF), 19 de fevereiro de 2008 (Data do Julgamento)

    Ministro José Delgado - Relator

    RELATÓRIO

    O Sr. Ministro José Delgado (Relator): Os fatos que determinaram a impetração do presente habeas corpus estão relatados às fls. 90/91, com fidelidade, do modo seguinte:

  3. Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado pela DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, em favor de MÉRCIA ANTÔNIA MENGHINI, contra ato do Desembargador Federal Johonsom Di Salvo, membro da 1a. Turma do Tribunal Regional Federal da 3a. Região, o qual, na condição de relator do agravo de instrumento interposto em execução fiscal, indeferiu efeito suspensivo ao mencionado recurso, mantendo os efeitos do decreto de prisão civil da paciente, na qualidade de depositária declarada infiel.

    Consta da petição inicial que, nos autos originários de execução fiscal, tendo sido penhoradas duas máquinas industriais e o direito de uso de uma linha telefônica, tais bens da empresa executada foram depositados em mãos da paciente que, na ocasião, residia na Av. Engenheiro Luís Gomes Cardim Sangerard, nº 756, Aclimação, São Paulo/SP.

    Relata a Defensora Pública da União - inclusive fazendo alusão a uma certidão constante dos autos de execução fiscal - que a avaliação dos bens penhorados não logrou êxito, pois a Sra. Oficiala de Justiça não os localizou e, uma vez procedida nova tentativa de intimação da depositária, ora paciente, para que esclarecesse acerca da situação dos bens, o endereço acima descrito não fora encontrado.

    Alega que, então, intimou-se a paciente, por edital, a fim de que apresentasse os bens penhorados, sob pena de ser-lhe decretada a prisão civil.

    Diz que, em 29 de setembro de 2004, fora decretada a prisão civil da paciente pelo prazo de noventa dias e também determinada a expedição de ofício à Defensoria Pública da União, visando à indicação de um Defensor Público para atuar como curador especial na demanda, porquanto a paciente encontrava-se em lugar incerto e não sabido, e não havia ofertado, ainda, qualquer defesa.

    Afirma que, pela Defensoria Pública da União, a paciente interpôs agravo de instrumento em face da decisão que havia decretado a prisão civil, mas esse recurso judicial teria sido desprovido pela 1a. Turma do Tribunal Regional Federal da 3a. Região.

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    Em defesa do direito de liberdade, a impetrante sustenta que a paciente encontra-se na iminência de ser presa de forma ilegal, sob os argumentos a seguir relacionados:

    1. consoante informou a Sra. Oficiala de Justiça, os bens penhorados foram depositados em nome da paciente, a qual, porém, sequer tinha conhecimento de onde eles estariam;

    2. a paciente não pode responder pelo encargo de depositária, porquanto não houve a apreensão prévia dos bens penhorados;

    3. em face da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), subsiste apenas a prisão civil do devedor de alimentos;

    4. a validade do depósito judicial exige a presença simultânea de dois requisitos, que não foram atendidos no caso concreto, quais sejam: a posse do bem pela pessoa que vier a ser nomeada para o encargo e a aceitação expressa do ônus imposto pelo juízo;

    5. descabimento da prisão civil de empregado sem registro na CTPS;

    6. a ordem legal obrigatória de nomeação do depositário não foi obedecida na hipótese em tela.

    É o relatório.

    Foi concedida pela Turma, em sede de agravo regimental, a liminar.

    O Ministério Público, em parecer de fls. 152/158, opina pela prejudicialidade da súplica.

    É o relatório.

    VOTO

    O Sr. Ministro José Delgado (Relator): O habeas corpus em apreciação objetiva afastar prisão civil decretada em decorrência de o depositário ter sido considerado infiel.

    A respeito, sigo a tendência do Supremo Tribunal Federal, que considera inconstitucional a prisão civil do alienante fiduciário e do depositário infiel, conforme revelado no julgamento do HC 90.172/SP, em sessão realizada em 05.06.2007, DJ 18.08.2007, relatado pelo Ministro Gilmar Mendes, cuja ementa assim ficou registrada:

    EMENTA: Habeas Corpus. 1. No caso concreto foi ajuizada ação de execução sob o n. 612/2000 perante a 3a. Vara Cível de Santa Bárbara D'Oeste/SP em face do paciente. A credora requereu a entrega total dos bens sob pena de prisão. 2. A defesa alega a existência de constrangimento ilegal em face da iminência de expedição de mandado de prisão em desfavor do paciente. Ademais, a inicial sustenta a ilegitimidade constitucional da prisão civil por dívida. 3. Reiterados alguns dos argumentos expendidos em meu voto, proferido em sessão do Plenário de 22.11.2006, no RE n. 466.343/SP: a legitimidade da prisão civil do depositário infiel, ressalvada a hipótese excepcional do devedor de alimentos, está em plena discussão no Plenário deste Supremo Tribunal Federal. No julgamento do RE n. 466.343/ SP, Rel. Min. Cezar Peluso, que se iniciou na sessão de 22.11.2006, esta Corte, por maioria que já conta com sete votos, acenou para a possibilidade do reconhecimento da inconstitucionalidade da prisão civil do alienante fiduciário e do depositário infiel. 4. Superação da Súmula n. 691/STF em face da configuração de patente constrangimento ilegal, com deferimento do pedido de medida liminar, em ordem a assegurar, ao paciente, o direito de permanecer em liberdade até a apreciação do mérito do HC n. 68.584/SP pelo Superior Tribunal de Justiça. 5. Considerada a plausibilidade da orientação que está a se firmar perante o Plenário deste STF - a qual já conta com 7 votos - ordem deferida para que sejam mantidos os efeitos da medida liminar.

    Isso posto, concedo o habeas corpus. Expeça-se o salvo-conduto.

    É como voto.

    VOTO-VISTA

    HABEAS CORPUS. DEPOSITÁRIO INFIEL. PACTO...

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