Das sanções principais

AutorCalil Simão
Ocupação do AutorDoutorando em Direito pela Universidade de Coimbra (PT). Mestre em Direito
Páginas751-836

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76 Sanções principais

Devemos reiterar que as sanções aplicáveis à conduta ímproba já se encontravam previstas pelo constituinte. Ao legislador ordinário foi facultado instituí-las conforme já assentado na norma. Neste momento não trataremos da possibilidade de o legislador inová-las. Sobre o tema já fizemos os comentários necessários no Capítulo XIV (supra, nº 50).

A Lei de Improbidade Administrativa estabeleceu, nos incisos do art. 12, seis espécies de sanção: 1) perda dos bens ou valores; 2) ressarcimento integral do dano; 3) perda da função pública; 4) suspensão dos direitos políticos; 5) multa civil; e 6) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios.

Podemos classificar as sanções punitivas previstas, levando em conta o bem jurídico por ela alcançado, em três grupos: a) restrição temporária de direitos1155; b) restrição definitiva de direitos1156; c) penas pecuniárias1157.

Constituem interdição temporária de direitos as sanções de suspensão dos direitos políticos e a proibição de contratar e receber benefícios do Poder Público. A interdição definitiva é permanente, sendo representada pela figura da perda da função pública. No grupo das penas pecuniárias encontram-se a perda de bens e valores e a multa civil.

Passaremos ao objeto deste capítulo, que é analisar cada uma das sanções previstas pela Lei nº 8.429/92, fixando o seu devido conceito, efeito e abrangência.

76. 1 Colaboração premiada e Lei de Improbidade Administrativa

A corrupção atualmente tem um viés diferente (infra n. 2.3), pois não está dirigida a simples violação da livre concorrência, mas destinada a causar enriquecimento ilícito e/ou dano ao erário.

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O fenômeno da corrupção é devidamente estruturado sob o aspecto organizacional, o que torna mais difícil o seu combate (característica piramidal).1158Muitas das vezes estamos diante de um sistema complexo que demanda um conjunto de ações para sua completa elucidação.

No mister de detectar e delimitar as ações de corrupção, a participação de sujeitos envolvidos é de suma importância, sempre que possível.

A única arma de barganha que os investigadores têm para convencer sujeitos corruptores a colaborar para o deslinde de um caso complexo de corrupção é por meio de uma possível diminuição de pena ou mesmo do perdão judicial.

Sobre o tema, a Lei nº 8.429/92 não tratou especificamente, mas no art. 17, § 1º, registrava a impossibilidade de acordos:

Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar. § 1º É vedada a transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput.

Nesse dispositivo, assentava-se a grande discussão sobre a possibilidade de aplicação, por analogia, do instituto da diminuição de pena ou perdão previstos pelas Leis 9.807/99 (art. 13 e 14) e 12.850/13 (arts. 4.º a 6º):

Art. 13. Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a conseqüente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado:

I - a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa;

II - a localização da vítima com a sua integridade física preservada;

III - a recuperação total ou parcial do produto do crime.

Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.

Art. 14. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime, na localização da vítima com vida e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um a dois terços.

Art. 4º. O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados:

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I - a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas;

II - a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;

III - a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa; IV - a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa;

V - a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada. § 1º. Em qualquer caso, a concessão do benefício levará em conta a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso e a eficácia da colaboração. § 2º. Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal). § 3º. O prazo para oferecimento de denúncia ou o processo, relativos ao colaborador, poderá ser suspenso por até 6 (seis) meses, prorrogáveis por igual período, até que sejam cumpridas as medidas de colaboração, suspendendo-se o respectivo prazo prescricional. § 4º Nas mesmas hipóteses do caput, o Ministério Público poderá deixar de oferecer denúncia se o colaborador: I - não for o líder da organização criminosa;

II - for o primeiro a prestar efetiva colaboração nos termos deste artigo. § 5º Se a colaboração for posterior à sentença, a pena poderá ser reduzida até a metade ou será admitida a progressão de regime ainda que ausentes os requisitos objetivos. § 6º O juiz não participará das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração, que ocorrerá entre o delegado de polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor. § 7º. Realizado o acordo na forma do § 6º, o respectivo termo, acompanhado das declarações do colaborador e de cópia da investigação, será remetido ao juiz para homologação, o qual deverá verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade, podendo para este fim, sigilosamente, ouvir o colaborador, na presença de seu defensor. § 8º O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais, ou adequá-la ao caso concreto. § 9º Depois de homologado o acordo, o colaborador poderá, sempre acompanhado pelo seu defensor, ser ouvido pelo membro do Ministério Público ou pelo delegado de polícia responsável pelas investigações. § 10. As partes podem retratar-se da proposta, caso em que as provas autoincriminatórias produzidas pelo colaborador não poderão ser utilizadas exclusivamente em seu desfavor. § 11. A sentença apreciará os termos do acordo homologado e sua eficácia. § 12. Ainda que beneficiado por perdão judicial ou não denunciado, o colaborador poderá ser ouvido em juízo a requerimento das partes ou por iniciativa da autoridade judicial.

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§ 13. Sempre que possível, o registro dos atos de colaboração será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audio-visual, destinados a obter maior fidelidade das informações.

§ 14. Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade.

§ 15. Em todos os atos de negociação, confirmação e execução da colaboração, o colaborador deverá estar assistido por defensor.

§ 16. Nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador.

Art. 5º São direitos do colaborador:

I - usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica

II - ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados;

III - ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes;

IV - participar das audiências sem contato visual com os outros acusados;

V...

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