Das Nulidades no Direito Processual do Trabalho

AutorMauro Schiavi
Ocupação do AutorJuiz Titular da 19a Vara do Trabalho de São Paulo
Páginas507-514

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1. Conceito e espécies

Nulidade, segundo a melhor doutrina, é a privação dos efeitos de um ato jurídico. Na esfera processual, a nulidade acarreta perda do efeito de um ato processual, vale dizer: o ato processual não produzirá os efeitos pretendidos.

Autores há que preferem a expressão invalidade processual. Nesse sentido, é a visão de Aldacy Rachid Coutinho1:

“Mais coerente é a visão da invalidade como a atipicidade do ato ou a qualidade do ato viciado, que resulta em uma tendência à ineficácia, desde que seja alegada e não estejam presentes fatores impeditivos, ou ainda, se não ministrado nenhum remédio jurídico que tenha sanado o defeito.”

Pensamos ser a invalidade gênero, do qual as nulidades absolutas e relativas são espécies.

É consenso na doutrina que as nulidades dos atos processuais podem ser absolutas, relativas, ou até mesmo o ato processual pode ser inexistente. De outro lado, há as chamadas irregularidades processuais, que são uma espécie de nulidade de menor potencial.

São nulos os atos processuais quando violem normas de ordem pública e interesse social. O ato nulo não está sujeito à preclusão e pode ser declarado de ofício pelo juiz. São relativas as nulidades quando não violem normas de ordem pública. Dependem da iniciativa da parte, não podendo ser conhecidas de ofício.

Os chamados atos inexistentes contêm um vício tão acentuado que não chegam a produzir efeitos. Entretanto, a doutrina tem dito que mesmo os atos inexistentes devem ter seus efeitos cassados por decisão judicial. Portanto, os atos inexistentes seguem o mesmo regime das nulidades absolutas.

Nesse contexto, Teresa Arruda Alvim Wambier: “Cremos que se deve repetir em relação aos atos inexistentes o que foi dito com respeito aos atos nulos: há necessidade,

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em princípio, de pronunciamento judicial, provocado por ação meramente declaratória, para que tal ‘vida artificial’, há pouco referida, tenha fim”2.

A irregularidade não retira os efeitos dos atos, tampouco enseja declaração de nulidade. Nesse sentido, ensina Vicente Greco Filho3:

“A mera irregularidade representa a violação da norma instituidora do modelo e que não acarreta ineficácia. Ora a mera irregularidade não tem qualquer sanção, como, por exemplo, a violação da norma contida no art. 169, que prescreve que os atos devem ser escritos com tinta escura e indelével ou que é vedado usar abreviaturas, ora a sanção é extraprocessual, não interferindo no andamento do processo, como, por exemplo, o excesso de prazo praticado pelo juiz, que pode acarretar-lhe sanções disciplinares, não invalidando, porém, o ato praticado fora do tempo.”

2. Princípios das nulidades
2.1. Prejuízo ou transcendência

O eixo central da declaração das nulidades, tanto no Direito Processual Civil como no Processual do Trabalho, é a existência de prejuízo (pas de nullité sans grief). Este princípio é oriundo do art. 114, 2a parte, do Código de Processo Civil francês. Se o ato processual, embora defeituoso e contenha vícios, não causou prejuízos a uma das partes, não deve ser anulado. A regra vale tanto para as hipóteses de nulidade como anulabilidade.

Conforme Carlos Henrique Bezerra Leite4: “O princípio do prejuízo, também chamado de princípio da transcendência, está intimamente ligado ao princípio da instrumentalidade das formas. Significa que não haverá nulidade sem prejuízo manifesto às partes interessadas. O princípio do prejuízo é inspirado no sistema francês (pas de nullité sans grief).”

Nesse sentido, dispõe o art. 794 da CLT, in verbis:
“Nos processos sujeitos à apreciação da Justiça do Trabalho só haverá nulidade quando resultar dos atos inquinados manifesto prejuízo às partes litigantes.”

Como bem adverte Aldacy Rachid Coutinho5, o prejuízo atua, em verdade, como um impeditivo de declaração, ou seja: o ordenamento jurídico garante a eficácia daquele ato que, mesmo sendo inválido, emana efeitos na ordem processual. É sabido que mesmo os atos nulos geram efeitos. Atua o prejuízo, então, como uma vedação dirigida ao juiz para que não declare a invalidade (preexistente à declaração), deixando o ato desconforme tal como se encontra e garantindo que aqueles efeitos

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gerados não mais serão atacados. Portanto, sem prejuízo, há nulidade com eficácia permanente e preservada.

No mesmo diapasão, destacamos as seguintes ementas:

“Aplicação do rito sumaríssimo. No sistema adotado pelo Código de Processo Civil, aplicado subsidiariamente na Justiça do Trabalho, a anulação do ato processual viciado obedece a certas regras, contidas na lei ou impostas pelos princípios gerais, que dão uma feição à teoria da nulidade. Tais regras compreendem o princípio da instrumentalidade das formas, contido no brocardo pas de nullité sans grief, segundo o qual só devem ser anulados os atos imperfeitos se o objetivo não tiver sido alcançado, pois o que interessa é o objetivo do ato e não o ato em si mesmo. Tal princípio encontra-se formulado no § 1º do art. 249 do CPC, que diz: ‘O ato não se repetirá nem se lhe suprirá a falta quando não prejudicar a parte’. No caso dos autos, não obstante tenha o Tribunal Regional convertido o rito processual para o sumaríssimo quando da análise do recurso ordinário, tal procedimento não importou em prejuízo às partes, tendo em vista que aquela Corte apreciou toda a matéria submetida a julgamento, ocasião em que fundamentou a decisão com suas razões de decidir, não inviabilizando, assim, o reexame da controvérsia nesta esfera recursal.” (TST – 1a T. – RR
n. 1.511/1998.071.15.00-7 – rel. Luiz Philippe V. de M. Filho – DJ 4.4.2003 – p. 623) (RDT n. 5 – maio de 2003)

“Nulidade processual – CLT, art. 795. “Não se reconhecerá a nulidade do ato processual, sem demonstração de manifesto prejuízo e motivada fundamentação da impugnação, por ausência de interesse jurídico” (CLT, art. 795), à luz da Moderna Escola Processual, que vem, progressivamente, revelando a natureza instrumental do processo, em prestígio da tutela urgente do direito material e consumação dos direitos fundamentais.” (TRT – 15a R. – 2a T. – Ac. n. 42.104/97 – rel. José Pitas – DJSP 12.01.98 – p. 30)

“Nulidade processual — Poder diretivo do juiz. Constitui moderna tendência evolutiva do Direito Processual a concentração cada vez maior de poderes diretivos e instrutórios nas mãos dos Órgãos Estatais encarregados de prestar a jurisdição, o que, de um lado, permite a apuração o quanto mais...

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