Da Petição Inicial no Direito Processual do Trabalho

AutorMauro Schiavi
Ocupação do AutorJuiz Titular da 19a Vara do Trabalho de São Paulo
Páginas555-580

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1. Conceito e fundamentos

Petição inicial é a “peça escrita em que o demandante formula a demanda a ser objeto de apreciação do juiz e requer a realização do processo até final provimento que lhe conceda a tutela jurisdicional.”1

No dizer de Arruda Alvim2, a petição inicial é o edifício do processo. Nela se expressam e se condensam, já no limiar do processo, todas as linhas básicas sobre as quais se desenvolverá, constituindo-se a expressão relatada dos fatos, a que deve se opor a outra parte. Com base nesse contraditório, de fato, é que será proferida a sentença.

Diante do princípio da inércia da jurisdição, a petição inicial é a peça formal de ingresso do demandante em juízo, em que apresenta seu pedido, declina a pessoa que resiste ao seu direito, explica os motivos pelos quais pretende a atuação jurisdicional e pede ao Estado-Juiz a tutela do seu direito.

Do conceito que adotamos, a petição inicial apresenta as seguintes características:

  1. peça formal: a petição inicial é peça formal, pois deve ser elaborada, observados os requisitos previstos em lei (arts. 840 da CLT e 319 do CPC)3. Ainda que a

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    CLT admita a petição inicial verbal, ela deve ser reduzida a termo, conforme o § 2º, do art. 840 da CLT;

  2. rompe a inércia do Judiciário: pela petição inicial se provoca o exercício da jurisdição, que deve dar uma resposta à pretensão que foi trazida a juízo4;

  3. individualiza os sujeitos da lide: é estabelecido o limite subjetivo da lide, ou seja, em face de quais pessoas a jurisdição atuará;

    A petição inicial deve individualizar as partes do conflito trabalhista, que no Processo do Trabalho são denominadas: reclamante e reclamado.

  4. motivo da lide e pedido: o demandante deve dizer os motivos pelos quais há resistência de seu direito e em razão dos quais pede a tutela jurisdicional.

    Também deve o demandante fazer o pedido, que é o objeto da lide, o bem da vida pretendido. O pedido balizará toda a atuação jurisdicional.

    Como bem adverte Jorge Luiz Souto Maior5: a petição inicial é a materialização do ato (no sentido de manifestação de vontade) de se exercitar o direito de ação e é, ao mesmo tempo, ato introdutório do processo. Apresentada a um juiz ou simplesmente distribuída em um órgão jurisdicional, por quem tenha capacidade de ser parte, considera-se proposta a ação e instaurado o processo. A petição inicial, materialização do direito de ação, é, assim, um dos pressupostos processuais ou requisito extrínseco do processo.

    A importância da inicial é vital para o processo, pois é ela que baliza a sentença, que não pode se divorciar dos limites do pedido (arts. 141 e 492 do CPC)6, e é em cima dela que o réu formulará sua resposta, resistindo ao direito do autor.

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    Pelo princípio do dispositivo que norteia o Processo, todas as pretensões que pretende o reclamante postular no Processo devem ser articuladas no corpo da inicial (princípio da eventualidade da inicial), sob consequência de, salvo quando a lei permitir (aditamento ou emenda da inicial), não poder mais alegar qualquer outra matéria na mesma causa (preclusão consumativa). De outro lado, se a matéria não estiver prescrita, o reclamante poderá, em outro processo, mesmo com suporte em idêntica causa de pedir do processo anterior, aduzir novas pretensões, mediante nova petição inicial.

    A experiência tem-nos demonstrado que a inicial baliza os destinos do processo, pois uma petição inicial bem articulada possibilita o exercício do direito de defesa e propicia a exata compreensão da lide pelo juiz. De outro lado, uma petição inicial mal formulada pode comprometer o direito do demandante, inviabilizar o direito de defesa e dificultar por demais a tarefa do juiz ao sentenciar.

    Como bem adverte Wagner D. Giglio7, “a petição inicial constitui peça de fundamental importância. Dela depende, em boa parte, o êxito da ação. Deve, por isso, ser cuidadosamente redigida, sopesando-se cada palavra, o encadeamento lógico da exposição e a correta formulação do pedido, inclusive quanto aos cálculos matemáticos, para eliminar dúvidas e facilitar a execução. Sua redação deve obedecer aos requisitos do estilo: clareza, precisão e concisão. E deve, finalmente, vir acompanhada dos documentos que a informam.”

2. Requisitos da petição inicial trabalhista

Requisito, do latim requisitu, significa, segundo consta da definição do Dicionário Aurélio, uma “exigência legal necessária para certos efeitos”8.

Os requisitos da inicial são os elementos que ela deve conter, disciplinados na lei, como condição de validade da inicial e viabilidade de prosseguimento da relação jurídica processual. A petição inicial apta, ou seja, a que preenche os requisitos legais, constitui pressuposto processual de validade e desenvolvimento do processo.

Como lembra Jorge Luiz Souto Maior9, os requisitos da petição inicial, como elementos de constituição válida e regular do processo, podem ser analisados a qualquer tempo e, uma vez verificada a irregularidade na formulação da pretensão, há a possibilidade da extinção do processo, sem julgamento do mérito, desta feita com base no inciso IV do mesmo artigo. Daí a pertinência que se deve ver na inserção desses dois incisos na lei, visto que a lei não possui palavras inúteis. Por isso, uma vez deferida a inicial, deferida está. O mesmo, no entanto, não se pode dizer quanto ao indeferimento, que pode ser reformado, mesmo em primeira instância (art. 331 do CPC).

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Segundo destaca a doutrina, a inicial deve observar os requisitos estruturais, extrínsecos e formais:

  1. requisitos estruturais: são os previstos no art. 840 da CLT, aplicando-se, no que for compatível com os princípios do Processo do Trabalho, os requisitos do art. 319 do CPC (art. 769 da CLT);

  2. requisitos extrínsecos: não se referem à inicial, mas à propositura da demanda — documentos que devem acompanhá-la (art. 320 do CPC) e à procuração ad judicia, o preparo (ação rescisória) etc.;

  3. requisitos formais: conforme a CLT, a petição inicial pode ser escrita ou verbal. A petição escrita geralmente é elaborada por advogado e a petição verbal, pelo funcionário da Secretaria da Vara, que redige a termo a reclamação verbal formulada pelo trabalhador. Não obstante, mesmo a verbal, deve ser redigida, pois o Juiz do Trabalho somente tomará contato com a petição inicial escrita.

A inicial do inquérito para apuração de falta grave (art. 853 da CLT), bem como do dissídio coletivo (art. 856 da CLT), por imperativo legal, deve ser escrita.

Também a inicial deverá ser elaborada em duas vias, pois uma via irá para o Processo, e a outra, para o reclamado.

A inicial também deve vir acompanhada dos documentos que o autor pretende juntar como prova no Processo (art. 320 do CPC, 787 e 845 da CLT).

A inicial trabalhista deve ser assinada pela parte ou pelo advogado. Sem a assinatura, a petição inicial é inexistente. Entretanto, pensamos que o Juiz do Trabalho deva conceder o prazo de dez dias (art. 321 do CPC) para que o signatário compareça em Secretaria para assinar a inicial, sanando este vício processual, considerando-se, caso haja a assinatura, a demanda proposta na data da propositura.

3. Requisitos da inicial trabalhista exigidos pela CLT

Diz o art. 840 da CLT:
“A reclamação poderá ser escrita ou verbal. § 1º Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante. § 2º Se verbal, a reclamação será reduzida a termo, em duas vias datadas e assinadas pelo escrivão ou secretário, observado, no que couber, o disposto no § 1º deste artigo. § 3º Os pedidos que não atendam ao disposto no § 1º deste artigo serão julgados extintos sem resolução do mérito.” (NR)

No Processo Civil, o art. 319 do CPC traça os requisitos da inicial. Dispõe o referido dispositivo legal:

“A petição inicial indicará:

I – o juízo a que é dirigida;

II – os nomes, os prenomes, o estado civil, a existência de união estável, a profissão, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, o endereço eletrônico, o domicílio e a residência do autor e do réu;

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III – o fato e os fundamentos jurídicos do pedido;

IV – o pedido com as suas especificações;

V – o valor da causa;

VI – as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados;

VII – a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação ou de mediação.

§ 1º Caso não disponha das informações previstas no inciso II, poderá o autor, na petição inicial, requerer ao juiz diligências necessárias a sua obtenção.

§ 2º A petição inicial não será indeferida se, a despeito da falta de informações a que se refere o inciso II, for possível a citação do réu.

§ 3º A petição inicial não será indeferida pelo não atendimento ao disposto no inciso II deste artigo se a obtenção de tais informações tornar impossível ou excessivamente oneroso o acesso à justiça.”

Sendo escrita ou verbal, a petição inicial trabalhista deve conter os requisitos do art. 840, § 1º, da CLT, quais sejam: o endereçamento, a qualificação do reclamante e do reclamado, uma breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante. Confrontando-se os requisitos da...

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