Da intervenção de terceiros

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Páginas134-167
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dos art. 9º e 468, da CLT), ou diz inexistirem essas
lesões (e, consequentemente, a norma interna será
válida). Não seria admissível, lógica e juridicamen-
te, que a sentença declarasse ser o regimento interno
válido para alguns trabalhadores e inválido para ou-
tros, se todos se encontrassem na mesma situação de
fato e de direito — identidade, aliás, que justicou a
formação do litisconsórcio.
c) Litisconsórcio necessário e unitário. Será neces-
sário o litisconsórcio toda vez que for exigida a
presença, no mesmo processo, do conjunto das pes-
soas legalmente legitimadas pela relação jurídica de
direito material que deu origem ao conito inter-
subjetivo de interesses. Sem a citação de todas essas
pessoas a sentença será nula ou inecaz (arts. 114
e 115, I e II). Esclareça-se que o que faz a sentença
destituída de ecácia, na espécie, não é a falta de
comparecimento de um ou mais dos litisconsortes,
e sim a ausência de sua citação. Os textos moder-
nos, rompendo com antigas tradições, não exigem
a presença da parte em juízo para que a relação
processual se estabeleça e se desenvolva com regu-
laridade. Corolário disso é a gura da revelia.
A unitariedade do litisconsórcio em exame radica
em que (ao contrário do simples) o mérito deve ser
apreciado de maneira uniforme para todos aqueles
que se encontram agrupados em um ou em ambos
os polos da relação processual.
O que desassemelha, portanto, o litisconsórcio
necessário e unitário do facultativo e unitário é, ape-
nas, o ato determinante da constituição de um e de
outro, pois o primeiro é produto do comando legal;
o segundo, da vontade da parte.
d) Litisconsórcio necessário e simples. Em regra, o
litisconsórcio que for necessário será unitário, pois
a unitariedade parece advir da necessidade que as-
sinala a constituição dessa espécie litisconsorcial.
Em situações bem menos frequentes, todavia, o li-
tisconsórcio pode ser necessário e simples, como
aconteceria, e. g., no processo civil, se a sentença
declarasse o usucapião, embora excluísse parte da
área, em decorrência de contestação apresentada por
um dos connantes.
Às modalidades litisconsorciais que examina-
mos poderiam, ainda, ser adjungidas outras, que
implicariam, p. ex., litisconsórcio facultativo-al-
ternativo-simples; facultativo-alternativo-unitário;
facultativo-eventual-simples; facultativo-eventual-
-necessário, que se apresentariam nas forma ativa
ou passiva, originária ou superveniente. Essa viabi-
lidade de múltiplas combinações entre as diversas
modalidades de litisconsórcio demonstra, de um
lado, a riqueza do universo de que fazem parte; de
outro, a complexidade prática e doutrinária a que
tais imbricações soem conduzir.
TÍTULO III
DA INTERVENÇÃO DE TERCEIROS
CAPÍTULO I
DA ASSISTÊNCIA
Seção I
Disposições Comuns
Introdução
O CPC anterior indicava como formas de inter-
venção de terceiros: a) a oposição (arts. 56 a 61); b) a
nomeação à autoria (arts. 62 a 69); c) a denunciação
da lide (arts. 70 a 76); c) o chamamento ao processo
(arts. 77 a 80). A assistência não era considerada in-
tervenção de terceiro (arts. 50 a 55).
Alterando esse critério, o CPC vigente: a) excluiu
do elenco das intervenções de terceiros: 1) a oposi-
ção e 2) a nomeação à autoria; b) incluiu no rol: 1)
a assistência; 2) o incidente de desconsideração da
personalidade jurídica; 3) o amicus curiae. Sendo
assim, são estas, no sistema do CPC atual, as moda-
lidades de intervenção de terceiro:
• assistência;
• denunciação da lide;
• chamamento ao processo;
incidente de desconsideração da personalidade
jurídica;
• amicus curiae.
Dediquemo-nos à assistência.
Resumo histórico
A origem remota da assistência, como forma de
intervenção voluntária em processo alheio, parece
ter as suas raízes no direito Romano. Bártolo, em
seus escritos, alude à assistência como intromissão
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de terceiro no processo, para auxiliar o autor ou o
réu (ad adiuvandi reo vel actorem), sem confundi-la
com a oposição (ad infringendum iura competitorum).
Da gura em estudo se ocuparam as Ordenações
Filipinas, no Livro 3º, Título XX, § 32, e o Regula-
mento Imperial n. 737. Estatuía o art. 124, deste:
“Para ser o assistente admitido, é preciso que ele
alegue o interesse aparente que tem na causa: se é
ador, sócio, consenhor de coisa indivisa, vendedor
de coisa demandada”.
Estava também na Consolidação de Ribas: “O as-
sistente pode ser admitido como tal, desde que prove
o interesse que tem na causa, embora não o tenha fei-
to por artigos e nem com audiência das partes”.
O CPC de 1939 previa, unicamente, a assistência
litisconsorcial (art. 93). O fato de esse estatuto pro-
cessual não haver dedicado nenhuma disposição à
assistência simples espelha o preconceito que Pedro
Batista Martins — elaborador do anteprojeto — ti-
nha sobre essa modalidade. São dele estas palavras:
“O Código reagiu contra as tendências individualis-
tas das legislações anteriores, que transformaram o
instituto da assistência em instrumento de conluio e
de má-fé” (“Comentários”, I, n. 238).
Premido, talvez, pelas circunstâncias, o eminen-
te jurista teve de ceder em parte, inserindo naquele
estatuto processual, como armamos, a gura da as-
sistência litisconsorcial.
A CLT é, rigorosamente, omissa quanto ao tema
da assistência. Como esta não é incompatível com o
processo do trabalho, a solução reside na incidência
supletiva, neste processo, dos arts. 119 a 124, daque-
le Código.
Conceito
Assistência (1) é ato pelo qual terceiro (2) inter-
vém, (3) de maneira voluntária, (4) em processo
alheio, (5) motivado pelo interesse jurídico (6) em
que a sentença seja favorável ao assistido.
Justiquemos essa denição.
(1) É o ato pelo qual terceiro. Trata-se, realmente,
de terceiro, porque a pessoa que se mete de permeio
no processo não está vinculada à relação material
controvertida, estabelecida entre as partes. Mesmo
que a sua interveniência seja aceita, o assistente não
se torna parte, mas simples auxiliar do assistido, a
quem o art. 121, do CPC, em má técnica, se refere
como auxiliar da “parte principal”, como se o as-
sistente também se tornasse parte (secundária). Em
suma, o assistente não é parte, senão que sujeito inte-
ressado do processo.
Embora o assistente manifeste interesse próprio e
postule também em nome próprio, defende, na ver-
dade, direito alheio.
Como auxiliar que é, o assistente não pode prati-
car atos contrários aos interesses do assistido.
(2) Intervém. O art. 119, do CPC, faz uso do ver-
bo intervir no sentido de alguém intrometer-se, de
meter-se de permeio em processo em que não está
em jogo um seu direito, senão que um seu interesse
jurídico.
(3) De maneira voluntária. Nenhuma norma legal
obriga o terceiro a intervir em processo alheio. A
sua intervenção, portanto, será sempre voluntária,
segundo seja o seu interesse jurídico em realizá-la.
Note-se que o art. 119, caput, do CPC, diz que o ter-
ceiro poderá intervir, a indicar, portanto, que se trata
de uma faculdade deste.
Está claro, pois, que nem mesmo o juiz poderá
determinar que terceiro intervenha, na qualidade de
assistente, contra a vontade deste.
(4) Em processo alheio. É óbvio que a ideia de in-
tervenção se encontra logicamente adjungida a
processo alheio, ou seja, a conito de interesses em
que gurem como autor e réu pessoas distintas da-
quela que deseja intervir. Contudo, como cou dito,
o assistente não se torna parte, mas mero auxiliar de
uma das partes (assistido). Trata-se, portanto, quase
sempre, de uma assistência ad adiuvandum tantum.
Como é de elementar conclusão, o processo
alheio, no qual o terceiro deseja intervir como assis-
tente, é aquele em que ainda não se formou a coisa
julgada material (CPC, art. 502). Se a res iudicata
se constituiu, a causa deixa de estar pendente (CPC,
art. 119, caput), fechando-se, em razão disso, a pos-
sibilidade de haver intervenção. Esta será admitida,
porém, na execução, se houver embargos do devedor,
hipótese em que o assistente poderá ter interesse em
que a sentença resolutiva desses embargos seja favo-
rável a uma das partes (credor ou devedor).
(5) Motivado pelo interesse jurídico. Em que pese ao
fato de o art. 17 do CPC declarar que para postu-
lar em juízo seja necessária a existência de interesse
(sem qualicá-lo de econômico ou moral, como fazia
o art. 2º, caput, do CPC de 1939), que constitui, por
isso, uma das condições da ação, esse interesse, para
efeito de assistência, deve ser jurídico, como demons-
tra o art. 119, caput, do CPC atual. Coerente com essa
disposição legal, estabelece a Súmula n. 82, do TST:
A intervenção assistencial, simples ou adesiva, só
é admissível se demonstrado o interesse jurídico e
não o meramente econômico”. Um esclarecimen-
to: a Súmula em tela alude à assistência simples ou
adesiva; não se trata, contudo, de duas espécies de
assistência, senão que de uma só, pois os vocábulos
“simples” e “adesiva” são, para os efeitos da assis-
tência, sinônimos. O oposto da assistência simples é a
litisconsorcial, conforme veremos mais adiante.
Entrementes, abrindo uma exceção a essa regra,
a Lei n. 9.469, de 10.7.97, após estatuir, no art. 5º,
caput, que a União poderá intervir nas causas em
que gurarem, como autoras ou rés, autarquias,
fundações públicas, sociedades de economia mista
e empresas públicas federais, dispôs, enfaticamen-
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te, no parágrafo único: As pessoas jurídicas de direito
público poderão, nas causas cuja decisão possa ter ree-
xos, ainda que indiretos, de natureza econômica, intervir,
independentemente de demonstração de interesse jurídi-
co, para esclarecer questões de fato e de direito, podendo
juntar documentos e memoriais reputados úteis ao exame
da matéria e, se for o caso, recorrer, hipótese em que, para
ns de deslocamento de competência, serão consideradas
partes”(destacamos).
(6) Em que a sentença seja favorável ao assistido. O
interesse jurídico do terceiro, em intervir na qua-
lidade de assistente de alguma das partes, está
intimamente vinculado ao desejo de que a sentença
seja favorável ao assistido. Esse interesse deve existir
tanto na assistência simples quanto na litisconsorcial,
conforme procuraremos demonstrar mais à frente,
ao nos ocuparmos com as espécies de assistência.
Justicativa da assistência
Conquanto alguns autores de outrora tenham
manifestado certa antipatia pela assistência, em vir-
tude de as leis da época a haverem transformado
em instrumento de conluio e de má-fé (LOPES DA
COSTA. Direito processual civil brasileiro. Rio de Janei-
ro, 1959, v. I, n. 483), as fontes romanas revelam que
essa modalidade de intervenção em processo alheio
foi concebida, justamente, para evitar que o conluio,
a má-fé, ou mesmo a negligência de um dos litigan-
tes viesse a acarretar danos a terceiros. Essa prática
teria sido inaugurada no período da extra ordinem
cognitio (iniciada no séc. III, d.C, e instauradora da
justiça pública, pois o pretor passou a apreciar o mé-
rito das demandas e a proferir sentença).
Postas à frente as razões históricas da assistên-
cia, verica-se que o seu uso como instrumento de
conluio ou de má-fé, com a nalidade de prejudicar
terceiro, decorreu de lamentável deturpação do ins-
tituto, estimulada por situações de outros tempos.
Mais do que nunca, entretanto, se justica, mo-
dernamente, a presença dessa gura em nosso
ordenamento processual, como providência desti-
nada a permitir que terceiro intervenha em processo
alheio, para, agindo no interesse próprio, promover
a defesa do direito a quem assiste (ut causam aiuvat ad
vitoriam). Como coadjutor, o terceiro atuará ao lado
de um dos contendores, praticando, um e outro, atos
que possam assegurar a obtenção de um provimento
jurisdicional favorável ao direito ou ao interesse do
assistido, pois essa vitória na causa representará, em
última análise, a preservação, a tutela dos interesses
que levaram o terceiro a intrometer-se no processo.
Não se pode negar, contudo, que em determina-
das hipóteses o que o impele a intervir na relação
processual estabelecida entre autor e réu não é, ne-
cessariamente, o desejo de auxiliar um deles, e sim
a preocupação de impedir o conchavo, o concerto
lesivo, a conspiração contra seus legítimos interes-
ses. Inexistente em nosso sistema processual a gura
da assistência, o terceiro caria em enormes dicul-
dades para encontrar outro expediente legal que
pudesse evitar velhacadas dessa natureza.
Sem que devam ser desconsideradas essas preo-
cupações do terceiro, a regra a ser observada é a de
que o escopo da assistência se concentra em adjuvar
uma das partes envolvidas no conito de interesses;
essa atuação em prol de um dos litigantes corres-
ponde, sob certo aspecto, à oportunidade que a lei
concede ao terceiro para promover a defesa dos seus
interesses, antes do momento em que, provavelmen-
te, pretendia fazê-lo (em outro processo).
Curiosamente, a assistência quase não tem sido
praticada no processo do trabalho. É razoável su-
por que esse escasso manejo da assistência seja, em
boa medida, reexo da pobreza histórica da doutri-
na trabalhista sobre o assunto, pois a ela incumbia,
por excelência, exaltar a utilidade desse instituto; ou
armar o contrário.
Atendidos os requisitos de legitimidade (CPC,
art. 17), de interesse jurídico (CPC, art. 119) e de
competência (CF, art. 114), poderá ser admitido, em
tese, como assistente, no processo do trabalho:
a) um trabalhador em relação a outro; b) o sindi-
cato em relação ao trabalhador; c) um trabalhador
em relação ao sindicato; d) o sindicato em relação
ao empregador; e) um empregador em relação a
outro empregador.
Ilustremos, com exemplos, a nossa armação.
a) Um trabalhador ingressa em juízo, alegando
ser detentor de estabilidade no emprego, instituída
pelo empregador, mediante norma interna genérica,
e haver sido despedido sem justa causa, pedindo,
em razão disso, a sua reintegração. Ao contestar, o
empregador alega que a norma interna invocada
pelo autor não lhe atribui — e nem a qualquer ou-
tro trabalhador — estabilidade no emprego. Como
essa norma interna é genérica, vale dizer, aplicável
a todos os trabalhadores daquela empresa, qualquer
outro trabalhador da empresa poderia requerer a
sua admissão no processo, na qualidade de assis-
tente do autor, porquanto teria manifesto interesse
jurídico em que a sentença fosse favorável a este.
Eventual sentença desfavorável ao autor poderia, de
certa forma, prejudicar as pretensões do assistente, a
serem formuladas em ação futura, com base na mes-
ma norma interna.
b) Conquanto as entidades sindicais estejam
legalmente legitimadas a agir na qualidade de subs-
titutas processuais dos integrantes da categoria, isso
não as impede — ao contrário, as autoriza — de in-
tervir, em determinados processos, como assistente
do trabalhador, esteja este gurando como autor ou
como réu. O requisito essencial para essa interven-
ção é existência de interesse jurídico, por parte do
assistente.
Seria o caso, por exemplo, de estar-se discutindo,
na causa, qual a natureza jurídica (salarial, ou não)

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