Da injúria racial à violência institucional: interseccionalidade da violência de gênero sob a perspectiva da mulher negra

AutorTânia Regina Zimmermann - Danielle Mendes Muniz
CargoAdvogada. Pesquisadora do Programa Fellow Visitor da Università degli Studi di Milano/Bicocca. Doutora e mestre em Direito de Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural pela Université Paris- Sanclay (Paris 11). Mestre em Direito Propriedade Intelectual e Direito Internacional pela Université Panthén-Sorbone (Paris 1). Pós-Graduação em ...
Páginas125-142
Direitos Culturais, Santo Ângelo, v.13, n.29, p. 125-142 jan/abr.2018
DA INJÚRIA RACIAL À VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL:
INTERSECCIONALIDADE DA VIOLÊNCIA DE GÊNERO SOB A
PERSPECTIVA DA MULHER NEGRA
FROM RACIAL INJURY TO INSTITUTIONAL VIOLENCE:
INTERSECTIONALITY OF GENDER VIOLENCE UNDER BLA CK
WOMAN'S PERSPECTIVE
Danielle Mendes Muniz1
Tânia Regina Zimmermann2
Resumo: Este artigo apresenta discussões sobre injúria racial com
foco na violência contra as mulheres negras, em u ma perspectiva de gênero
cujas interfaces traduzem-se na permanência intrínseca do racismo e por fim,
na violência institucional. Na pesquisa bibliográfica faremos um paralelo
histórico com as configurações coloniais brasileiras e seu passado escravista
cujos resquícios submetem ainda no tempo presente as mulheres negras a
uma posição hierárquica inferior e negativada. Também apresentamos uma
análise sobre o conceito de violência psicológica e moral e da t ipificação
relativa aos crimes de injúria qualificada, no contexto da a bordagem trazida
pela Lei Maria da Penha. Diálogos amp los para alçar a complexidade da
solidez do machismo e racismo na sociedade traduzem-se em saídas positivas
para a efetividade jurídica e cultural.
Palavras-Chave: Violência; Gênero; Racismo.
Abstract: This article discusses racial abuse with a focus on
violence against black women, from a gender perspective whose interfaces
translate into the intrinsic permanence of racism and, finally, in stitutional
violence. In this context, it seeks to make a historical parallel with the
Brazilian colonial configurations and its slave past whose remnants still
present black women in a lower an d negative hierarchical position. We also
present an analysis about the concept of psychological and moral violence
and the classification of crimes of qualified injury, in the context of the
approach brought by the Maria da Penha Law. Broad dialogues to raise the
complexity of the solidity of machismo and racism in society translate into
positive outlets for legal and cultural effectiveness.
Key words: Violence; Genre; Racism
Sumário: Considerações Iniciais. 1 Intersecções entre rompimento
e permanência das estruturas; 2 Configurações da violência racial e de
gênero; Considerações Finais. Referências.
1 Acadêmica do 4º ano do curso de Direito da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, Unidade
Naviraí.danny_mendess@hotmail.com
2 Doutora em História e professora da graduação e programas de mestrado da UEMS.
taniazimmermann@gmail.com
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Direitos Culturais, Santo Ângelo, v.13, n.29, p. 125-142 jan/abr.2018
Considerações Iniciais
As lutas engajadas pelo movimento feminista ganham cada vez mais força
no p aís, no entanto, essa luta é rec ebida com repulsa por parte da sociedade que
não reconhece o discurso proferido por essas mulheres, sobretudo em relação a
temas como o racismo e a violência sexual.
Os direitos embora amplos, mas não atribuídos em sua amplitude
justificam a militância feminina marchando pelas ruas bradando p ara ser
respeitadas, ouvidas, tornando-se representante s e não mais representadas.
Vivemos, nesse sentido, uma massificação do discurso de empoderamento:
mulheres como sujeito afastam-se gradualmente do papel coadjuvante.
A violência empregada contra a mulher, no contexto das mulheres negras,
ultrapassa a questão de gênero, e transcende, sobrepondo a ela, outras formas de
opressão. Neste sentido, este artigo discute a interseccionalidade da violência de
gênero em relação às mulheres ne gras, pois consideram na análise, outros
marcadores sociais, neste caso, os sistemas de opressão de racial.3
Para além destes fatores, pretende-se ainda analisar a violência
institucional que o portuniza a essas mulheres um embate ainda maior ao
experimentar o sabor de uma opressão desmedida por partes d os órgãos de apoio e
atendimento as mulheres em situação de vulnerabilidade, neste caso, as mulheres
vítimas de violência de gênero no âmbito da violê ncia doméstica e imersas na
estrutura que se solidifica através da discriminação racial.
Dentro desta perspectiva de análise, o movimento feminista negro surge
como uma tendência de lutas específicas, voltado para mulheres negras que não se
veem representadas, visto que o impacto sobre elas não é só do patriarcalismo, mas
combinam ao seu histórico de submissão e dependência social, o racismo que junto
à violência sexista reforçam a ideia estereotipada do que configura a mulher e
negra no Brasil.
1 Intersecções entre rompimento e permanência das estruturas
É necessário reconhecer que a violência sobre as mulheres negras
acontece em contexto diverso e questionar seus mecanismos é analisar o caso
concreto para propor soluções que considerem suas especificidades, pois deve-se
erradicar não só a violência, mas entendê-la através de um histórico racista que
precisa ser discutido e liquidado.
O ativismo da mulher negra reconhece que são vítimas de uma dupla
opressão que não é representada por outros “feminismos”. A partir disso, inclui
novas pautas como, no caso brasileiro, o genocídio da juventude negra e como isso
tem impactado as mulheres negras nas situações de violência que atribuem em seu
3 Para an álise do conceito de raça e racismo, referencio Noberto Bobbio (1998, p. 1059), que entende
raça uma atribuição conceitual sem fundamento científico e por racismo reconhece nã o a descrição da
diversidade das raças ou de grupos étnicos humanos, realizada pela Antropologia Física ou pela
Biologia, mas a referência do comportamento do indivíduo à raça a que pertence e, principalmente, o
uso político de alguns resultados aparentemente, científicos para levar à crença da superioridade de uma
raça sobre as demais. Este uso visa justificar e consentir atitudes de discriminação e perseguição contra
as raças que se consideram inferiores.

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