Da Fraude à Execução. Da Fraude contra Credores. Da Fraude à Lei

AutorFrancisco Antonio de Oliveira
Ocupação do AutorDesembargador Federal do Trabalho aposentado do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região
Páginas684-713

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9.1. Da fraude

Com respaldo em Laurent,411 W. B. Monteiro ensina que o juiz, com um pouco de bom senso, discutirá os caracteres da fraude, melhor que o mais sutil jurisconsulto. "Num sentido amplo, porém, ela pode ser conceituada como o artifício malicioso empregado para prejudicar a terceiro". Fraude é, pois, o artifício malicioso que uma pessoa emprega com a intenção de prejudicar o direito ou o interesse de outrem. Pode ser, ainda, a manobra que o devedor pratica contra o seu credor ao assumir obrigações ou mesmo ao alienar bens com o objetivo de tornar-se inadimplente. Pode ser também toda intenção levada à prática de um ato contrário à lei imperativa ou proibitiva. A fraude compõe-se de dois elementos: objetivo (eventus damni), que diz respeito ao prejuízo realmente verificado — não se exige, todavia, a intenção de prejudicar o credor, bastando que o devedor tenha a consciência do prejuízo que possa causar; e subjetivo (consilium fraudis), que compreende a intenção de fraudar, de agir de má-fé, de empregar meios astuciosos, ardis, sempre com o intuito preconcebido de enganar. Fala-se em fraude processual quando se pratica um delito contra a administração da Justiça, o qual consiste em inovar artificiosamente, na pendência de um processo (lide) civil, penal, trabalhista, o estado ou o lugar de coisa, de pessoa, com o objetivo de conduzir a erro o juiz ou o perito.

Se o adquirente dos bens do devedor insolvente ainda não houver efetuado o pagamento do preço e este for aproximadamente o corrente, poderá desobrigar-se depositando o valor em juízo, com a citação de todos os interessados (art. 160, CC). Se o valor for inferior, o adquirente poderá conservar o bem se efetuar o depósito em juízo da quantia que corresponda ao valor real (parágrafo único).

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O credor quirografário, que receber do devedor insolvente a dívida ainda nao vencida, ficará obrigado a repor, em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores, aquilo que recebeu (art. 162, CC).

9.2. Da fraude à execução

Art. 792, NCPC. A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução: I — quando sobre o bem pender ação fundada em direito real ou com pretensão rei-persecutória, desde que a pendência do processo tenha sido averbada no respectivo registro público, se houver; II — quando tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução, na forma do art. 828; III — quando tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial originário do processo onde foi arguida a fraude; IV — quando, ao tempo da alienação ou da oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência; V — nos demais casos expressos em lei.

§ 1º A alienação em fraude à execução é ineficaz em relação ao exequente.

§ 2° No caso de aquisição de bem não sujeito a registro, o terceiro adquirente tem o ónus de provar que adotou as cautelas necessárias para a aquisição, mediante a exibição das certidões pertinentes, obtidas no domicílio do vendedor e no local onde se encontra o bem.

§ 3º Nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, a fraude à execução verifica-se a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar.

§ 4º Antes de declarar a fraude à execução, o juiz deverá intimar o terceiro adquirente, que, se quiser, poderá opor embargos de terceiro, no prazo de 15 (quinze) dias.

O art. 792, retro, comete lapso terminológico, quanto ao termo "averbado". A Lei dos Registros Públicos foi modificada há mais de 4 (quatro) décadas. Antes da modificação, a penhora, a hipoteca etc, eram averbadas e o título de domínio do bem imóvel era registrado. Com a modificação que já se vai há quase meio século, o que era averbado passou a ser registrado e o título de domínio que era registrado passou a ser matriculado. O mesmo lapso (erro) é cometido no art. 844 onde o legislador afirma que o arresto e a penhora são averbados e a penhora é registrada. O arresto, a penhora, a hipoteca etc, são registrados. Ver art. 167, inciso I, n. 5, da Lei dos Registros Públicos. Esse lapso terminológico era cometido pelo Código revogado e continua a sê-lo em vários artigos do Código novo. Não existe desculpa para que o legislador não cumpra a lei que ele mesmo fez, obrando em mau exemplo. Ver art. 167, inciso I, da Lei dos Registros Públicos.

O art. 844 deveria ter a seguinte redação:

Art. 844, NCPC. Para presunção absoluta de conhecimento por terceiros, cabe ao exequente providenciar o REGISTRO do arresto ou da penhora no registro competente, mediante apresentação de cópia do auto ou do termo, independentemente de mandado judicial.

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O registro faz-se necessário para que haja publicidade para com terceiros que se apresentam como res inter alios no tocante à garantia que põe selo no bem objeto da aquisição. E nos termos do art. 240 da Lei dos Registros Públicos: "O registro da penhora faz prova quanto à fraude de qualquer transação posterior". Isso significa que o terceiro adquirente não poderá alegar a boa-fé. A má-fé estará posta júris et de jure. Todavia, se o exequente não efetuar o registro que a lei faculta, atrairá para si o ónus de provar (vis attractiva) que o terceiro adquirente agiu de má-fé. Em se tratando de bem móvel, sem obrigação de registro, é ónus do adquirente do bem provar que tomou todas as providências que lhe davam garantia de um negócio lícito (princípio da transparência), conforme § 2º, do art. 792, NCPC, retro.

De conformidade com o art. 828 do NCPC, que recepcionou o art. 61 5-A do CPC revogado com redação tautológica, temos que:

Art. 828. O exequente poderá obter certidão de que a execução foi admitida pelo juiz, com identificação das partes e do valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis, de veículos ou de outros bens sujeitos à penhora, arresto ou indisponibilidade.

§ 1° No prazo de 10 (dez) dias de sua concretização, o exequente deverá comunicar ao juízo as averbações efetivadas.

§ 2º Formalizada penhora sobre bens suficientes para cobrir o valor da dívida, o exequente providenciará, no prazo de 10 (dez) dias, o cancelamento das averbações relativas àqueles não penhorados.

§ 3º O juiz determinará o cancelamento das averbações, de ofício ou a requerimento, caso o exequente não o faça no prazo.

§ 4º Presume-se em fraude à execução a alienação ou a oneração de bens efetuada após a averbação.

§ 5º O exequente que promover averbação manifestamente indevida ou não cancelar as averbações nos termos do § 2- indenizará a parte contrária, processando-se o incidente em autos apartados.

De conformidade com o art. 61 5-A, acrescentado ao CPC pela Lei n. 11.382/2006 (art. 828, NCPC), "o exequente poderá, no ato da distribuição, obter certidão compro-batória do ajuizamento da execução, com identificação das partes e valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis, registro de veículos ou registro de outros bens sujeitos à penhora ou arresto". O § 1º (art. 828, § 1º, NCPC) obriga a que "o exequente deverá comunicar ao juízo as averbações efetivadas, no prazo de 10 (dez) dias de sua concretização". Todavia, segundo o § 2º (art. 828, § 2º, NCPC), "formalizada penhora sobre bens suficientes para cobrir o valor da dívida, será determinado o cancelamento das averbações de que trata este artigo relativas àqueles que não tenham sido penhorados". Comanda o § 3º (art. 828, § 4º, NCPC) que "presume-se em fraude à execução a alienação ou oneração de bens efetuada após a averbação (arts. 593, 782, NCPC)".

Nota. Onde a lei diz averbação leia-se registro (art. 167, I, n. 5, da LRP).

A nova sistemática tem lugar por ocasião do início da execução e tem a finalidade de alertar terceiros que venham a adquirir bens gravados com penhora, com arresto

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ou gravados com selo de direito real. Evidentemente, se os bens forem alienados, transformando o devedor em insolvente, os adquirentes não poderão alegar boa-fé na aquisição. Não obstante, com o ajuizamento da ação de conhecimento, se a venda de bens transformar o devedor em insolvente já configura a fraude à execução (art. 593, CPC, art. 782, NCPC) e a venda ineficaz. A nova sistemática é salutar e proíbe a venda, mesmo antes da penhora.

Segundo Fadei,412 "alguns casos que a lei prevê de fraude de execução são os seguintes: art. 2º do Dec. n. 22.866, de 28.6.1933, que considera em fraude de execução fiscal as alienações de bens em detrimento da Fazenda; arts. 280 e 281 do Dec. n. 4.857, de 9.11.1939 [revogado pela Lei n. 6.015/73]; art. 672, § 3e, do CPC (art. 856, § 3e, NCPC), no caso de penhora de crédito representada por títulos de crédito, que estejam nas mãos de terceiro, e em que, caso o terceiro negue o débito, em conluio com o devedor, a quitação que este lhe der se considerará em fraude de execução, sendo, portanto, ineficaz". Mendonça Lima413 acrescenta os arts. 168, I, 244 e 245 do Regulamento de Registros Públicos e o art. 185 do CTN.

Cumpre-nos, em rápidas pinceladas, traçar um paralelo entre fraude à execução e fraude contra credores, a primeira regulada pelo direito público e a segunda disciplinada pelo direito...

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