Da ética do advogado

AutorHélio Vieira - Zênia Cernov
Páginas407-450

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O CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, ao instituir o Código de Ética e Disciplina, norteou-se por princípios que formam a consciência profissional do advogado e representam imperativos de sua conduta, os quais se traduzem nos seguintes mandamentos: lutar, sem receio, pelo primado da Justiça; pugnar pelo cumprimento da Constituição e pelo respeito à Lei, fazendo com que o ordenamento jurídico seja interpretado com retidão, em perfeita sintonia com os fins sociais a que se dirige e as exigências do bem comum; ser fiel à verdade para poder servir à Justiça como um de seus elementos essenciais; proceder com lealdade e boa-fé em suas relações profissionais e em todos os atos do seu ofício; empenhar-se na defesa das causas confiadas ao seu patrocínio, dando ao constituinte o amparo do Direito, e proporcionando-lhe a realização prática de seus legítimos interesses; comportar-se, nesse mister, com independência e altivez, defendendo com o mesmo denodo humildes e poderosos; exercer a advocacia com o indispensável senso profissional, mas também com desprendimento, jamais permitindo que o anseio de ganho material sobreleve a finalidade social do seu trabalho; aprimorar-se no culto dos princípios éticos e no domínio da ciência jurídica, de modo a tornar-se merecedor da confiança do cliente e da sociedade como um todo, pelos atributos intelectuais e pela probidade pessoal; agir, em suma, com a dignidade e a correção dos profissionais que honram e engrandecem a sua classe. Inspirado nesses postulados, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelos arts. 33 e 54, V, da Lei n. 8.906, de 04 de julho de 1994, aprova e edita este Código, exortando os advogados brasileiros à sua fiel observância.

A ética constitui um dos mais importantes princípios que devem nortear o advogado, pois caminha lado a lado com a competência e a coragem, tornando-o respeitado e bem-sucedido. Um cidadão que trata seus pares com ética dificilmente se desviará dessa conduta em sua vida profissional. Como bem leciona CARLOS FERNANDO CORREA DE CASTRO, "Todas as profissões que tratem de bens e valores humanos, especialmente aqueles bens imateriais, ou que representem pessoas ou cidadãos, devem ter regras de conduta firmes e claras, que orientem seus profissionais no atendimento de seus semelhantes ou pacientes" (Ética Profissional e o Exercício da Advocacia, Juruá, p. 16). Quando um bacharel torna-se advogado, atrela sua atuação permanentemente à ética, tanto que esta consta do próprio juramento feito na sessão de entrega de sua credencial. O Código de Ética da Advocacia contém regras gerais de conduta aplicáveis às relações pessoais e profissionais (com seus clientes, com as partes, com as autoridades, com os servidores e com seus colegas), o sigilo profissional e a publicidade, entre outros aspectos. O atual Código de Ética, aprovado nas sessões plenárias de abril, maio, junho e agosto de 2015, trouxe importantes adequações a uma realidade moderna cujo texto anterior não estava abrangendo. Entre os avanços importantes deste Código está a virtualização dos processos administrativos no âmbito da OAB, mediante a inserção do processo eletrônico. Esta já se mostrava necessária em virtude da modernização que se instalou na vida de toda a cidadania mundial e que, no futuro, tende a eliminar o uso do papel. A atualização dos limites impostos à propaganda da advocacia, para inserir regência específica quanto ao uso da internet e dos modos de divulgação que esta oferece, também era necessidade cada vez mais presente (em decorrência, não só das omissões dos regramentos então vigentes, quanto da divergência de interpretação entre Tribunais de Ética das diversas Seccionais brasileiras). A OAB também avançou na proteção de seus inscritos ao exigir que o advogado que se valer do concurso de colegas na execução de suas atividades, dispense a estes tratamento condigno, não os tratando como subalternos, nem

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lhes aviltando a remuneração por seus serviços. Essa determinação visa a proteger a remuneração e o tratamento dignos em favor dos advogados que prestam serviços a outros advogados (individualmente, por sociedade de advogados ou por departamento jurídico de empresas privadas e órgãos públicos). A OAB também materializou neste Código a vedação ao tráfico de influência, proibindo o advogado que exercer função em qualquer órgão da OAB de atuar em processos que tramitem perante a entidade, ou de emitir pareceres destinados a instruí-los. Mais ainda, a redação atual ingressa no âmbito da própria probidade na gestão, proibindo os titulares de cargos na OAB de prestar serviços ou fornecer produtos à entidade, ou de adquirir bens de propriedade desta. A advocacia pública ganhou capítulo próprio e, entre seus postulados, determinou que seus integrantes contribuam para a redução da litigiosidade excessiva. O sigilo profissional foi estendido ao advogado que esteja exercendo as funções de mediador, conciliador ou árbitro, assim como àqueles que integrem órgãos da OAB. No campo procedimental, este Código também solucionou diversos conflitos existentes quanto aos ritos e competências, dando-se especial ênfase: a) à mais detalhada especificação do rito do processo disciplinar, tanto no âmbito da Seccional, quanto no âmbito dos Tribunais de Ética e Disciplina; b) à solução de alguns conflitos, como, por exemplo, a competência originária para o julgamento da revisão e reabilitação. Outro grande entrave que existia no sistema procedimental anterior era o desmembramento da competência disciplinar: o processo era instruído pelo Conselho Seccional, mas julgado pelo Tribunal de Ética e Disciplina. Este Código abriu a possibilidade de unificação dessas duas fases ao admitir que o Regimento Interno das Seccionais delegue ao TED a competência para instruir o processo disciplinar. Foram prestigiadas, a um só tempo, tanto a atuação e a própria razão existencial dos Tribunais de Ética no que diz respeito à disciplina dos advogados, quanto a competência recursal característica do Conselho Seccional em matéria disciplinar. Este Código consegue ser modernista e progressista sem se desapegar dos preceitos éticos que já estão arraigados em nossa profissão desde o seu nascedouro, que inspiram a advocacia a manter-se ímproba o suficiente para autorizá-la a exigir a valorização, o tratamento digno e o respeito às suas prerrogativas.

TÍTULO I

DA ÉTICA DO ADVOGADO

Capítulo I Dos princípios fundamentais

Art. 1º O exercício da advocacia exige conduta compatível com os preceitos deste Código, do Estatuto, do Regulamento Geral, dos Provimentos e com os princípios da moral individual, social e profissional.

Os advogados, em sua conduta, estão submetidos a uma dupla regência: o Estatuto da OAB e o presente Código de Ética e Disciplina. O primeiro tipifica as infrações disciplinares e suas respectivas sanções. Este último cuida especificamente das condutas que devem permear suas relações com seus clientes, seus pares, as autoridades e serventuários e as formas de ofertar sua atividade sem mercantilizar a advocacia, entre outros aspectos de conduta. A violação ao presente Código, em si, caracteriza infração disciplinar, conforme previsto no art. 36, inc. II, do EAOAB, isso se não estiver incursa em uma das infrações relacionadas no art. 34.

Art. 2º O advogado, indispensável à administração da Justiça, é defensor do Estado Democrático de Direito, dos direitos humanos e garantias fundamentais, da cidadania, da moralidade, da Justiça e da paz social, cumprindo-lhe exercer o seu ministério em consonância com a sua elevada função pública e com os valores que lhe são inerentes.

Parágrafo único. São deveres do advogado:

I - preservar, em sua conduta, a honra, a nobreza e a dignidade da profissão, zelando pelo caráter de essencialidade e indispensabilidade da advocacia;

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II - atuar com destemor, independência, honestidade, decoro, veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé;

III - velar por sua reputação pessoal e profissional;

IV - empenhar-se, permanentemente, no aperfeiçoamento pessoal e profissional;

V - contribuir para o aprimoramento das instituições, do Direito e das leis;

VI - estimular, a qualquer tempo, a conciliação e a mediação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios;

VII - desaconselhar lides temerárias, a partir de um juízo preliminar de viabilidade jurídica;

VIII - abster-se de:

  1. utilizar de influência indevida, em seu benefício ou do cliente;

  2. vincular seu nome a empreendimentos sabidamente escusos;

  3. emprestar concurso aos que atentem contra a ética, a moral, a honestidade e a dignidade da pessoa humana;

  4. entender-se diretamente com a parte adversa que tenha patrono constituído, sem o assentimento deste;

  5. ingressar ou atuar em pleitos administrativos ou judiciais perante autoridades com as quais tenha vínculos negociais ou familiares;

IX - pugnar pela solução dos problemas da cidadania e pela efetivação dos direitos individuais, coletivos e difusos;

X - adotar conduta consentânea com o papel de elemento indispensável à administração da Justiça;

XI - cumprir os encargos assumidos no âmbito da Ordem dos Advogados do Brasil ou na representação da classe;

XII - zelar pelos valores institucionais da OAB e da advocacia;

XIII - ater-se, quando no exercício da função de defensor público, à defesa dos necessitados.

A Constituição Federal reconheceu a importância do advogado para...

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