Da condição, do termo e do encargo

AutorBassil Dower, Nelson Godoy
Ocupação do AutorProfessor Universitário e Advogado em São Paulo
Páginas300-325

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21. 1 Introdução

O negócio jurídico é constituído de elementos essenciais sem os quais não pode existir. Por exemplo, na compra e venda tem-se como elementos essenciais a coisa, o preço e o consentimento (res, pretium et consensus). A falta de um deles ocasiona a ineficácia do ato.

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É possível, ainda, a inclusão no ato, de elementos acidentais para modificar ou delimitar os seus efeitos normais. São estipulações acidentais ou facultativas, que por vezes acompanham os elementos fundamentais do negócio jurídico, modificando alguma ou algumas das suas conseqüências naturais. Por exemplo, na compra e venda é possível incluir que o vendedor não fique responsável pela evicção. Se não se incluir essa cláusula, o vendedor é o responsável pela evicção221. Em outras palavras, são elementos facultativos que podem ser introduzidos pelas partes restringindo os efeitos normais do negócio jurídico. Na verdade, o negócio jurídico forma-se sem eles, tem vida normal, mas uma vez introduzidos os elementos acidentais, estes passam a integram o negócio formando uma unidade orgânica.

Distinguem-se, pois, de um lado os elementos acidentais: aquelas cláusulas acessórias que se incluem no ato, modificando alguma ou algumas das suas conseqüências naturais, e, de outro, os elementos naturais: aqueles peculiares à natureza de cada ato. Na compra e venda, por exemplo, os elementos naturais são a entrega da coisa e o pagamento do preço.

21. 2 Dos elementos acidentais do negócio jurídico

Trataremos, no presente capítulo, dos elementos acidentais do negócio jurídico. São aquelas cláusulas que, pela vontade das partes, são introduzidas no negócio jurídico e que influem sobre os efeitos deste, tornando-o dependente e, portanto, não puro. São considerados elementos acidentais:

  1. a condição;

  2. o termo;

  3. o modo ou o encargo.

21. 3 A condição e seus requisitos

A condição caracteriza a modalidade do negócio jurídico. É uma cláusula aposta no negócio jurídico pela vontade das partes, que sujeita seus

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efeitos a um evento futuro e incerto. Ou como explica o art. 121 do CC, in verbis: "Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto".

Facilmente se conclui que a condição não prejudica a existência do negócio; apenas altera o momento de sua eficácia.

No conceito legal acima transcrito, encontramos os requisitos essenciais do instituto: a futuridade e a incerteza do evento. Devemos, ainda, considerar a vontade das partes também como um de seus requisitos, conforme mostra o artigo supratranscrito. Por essa razão, Clóvis Beviláqua conceitua a condição como sendo "a determinação acessória, que faz a eficácia da vontade declarada dependente de algum acontecimento futuro e incerto".222

  1. A FUTURIDADE:

    O fato presente ou passado não pode constituir pressuposto da condição; só deve ser considerado um fato futuro. Imagine a promessa que alguém faz de doar uma casa com a condição da beneficiária se casar. A condição está na dependência do evento casamento, uma determinação acessória, futura e incerta e, enquanto ele não se realizar, a beneficiária não pode exigir a entrega da casa, porque o evento futuro previsto não se consumou. A eficácia da promessa ou do negócio jurídico ficou em suspenso, até a realização do referido evento. Ou seja, a promessa está completa, não havendo dúvida sobre sua existência, porém, a sua eficácia fica dependente do evento futuro. Havendo o casamento, o ato gera seus efeitos jurídicos.

  2. A INCERTEZA:

    Os fatos certos, mesmo futuros, não constituem condição. Fatos certos, embora futuros, são termos. Por exemplo, a morte é certa e futura. A pessoa nasce e tem a certeza de que um dia irá morrer. Portanto, a característica da incerteza determina a distinção entre a condição e as demais modalidades do negócio jurídico.

  3. A VONTADE DAS PARTES, OU DO DECLARANTE:

    Há elementos que podem estar presentes no negócio jurídico integrando o plano de eficácia deste. Embora facultativo, a sua colocação

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    depende, no entanto, da vontade das partes, ou seja, a condição aposta deriva da vontade dos contratantes da obrigação, ou do declarante do negócio. O art. 121 do CC bem mostra essa situação: "Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto". Vê-se que o legislador condicionou, como único requisito indispensável para a caracterização da condição, que o fato futuro e incerto proceda exclusivamente da vontade dos contratantes. Quando a lei impõe que o negócio jurídico deve ser celebrado com a cláusula de não valer sem instrumento público, este é da substância do ato (CC, art. 109). Esta vontade, que deriva exclusivamente da norma jurídica, não é propriamente uma condição voluntária, mas sim um requisito formal de validade, legalmente exigido.223José Carlos Moreira Alves, um dos autores do projeto do Código Civil atual, esclarece devidamente. Eis suas palavras: "No que diz respeito à condição, o Projeto procurou aperfeiçoar o Código vigente, corrigindo-lhe falhas e suprimindo lacunas. No art. 119 (que corresponde ao 121 do Código atual), a inclusão da frase "derivando exclusivamente da vontade das partes?, serve para afastar do terreno das condições em sentido técnico as condiciones júris".224

21. 4 Espécies de condições

Há várias espécies de condições:

21.4. 1 Condição possível e impossível (física e juridicamente)

A condição pode ser introduzida em qualquer tipo de negócio jurídico, gratuito ou oneroso, inter vivos ou causa mortis, mas deve ser física ou juridicamente possível.

1) Condições fisicamente impossíveis - A condição físicamente impossível é aquela que é impossível de ser realizada por qualquer pessoa. A cláusula que condicionar o pagamento de um prêmio, por exemplo, a quem fizer o percurso da volta na Terra em uma hora, é condição fisicamente impossível. Se a condição físicamente impossível tiver natureza suspensiva,

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invalidará o negócio que lhe for subordinado (nulidade absoluta por violação a expressa disposição de lei - art. 123, I).

  1. Condições juridicamente impossíveis - A impossibilidade, aqui, se baseia em proibição legal. Exemplo típico dessa espécie é a de condicionar a eficácia do negócio jurídico à emancipação de pessoa solteira antes dos dezesseis anos, pois é certo que a emancipação de tal pessoa só pode ser concedida com a idade mínima de dezesseis anos (CC, art. 5.º, parágrafo único, inciso I); ou se renunciar à pensão alimentícia (CC, art. 1707).

21.4. 2 Condição casual, potestativa e mista
  1. CONDIÇÃO CASUAL:

    Se a condição subordina a eficácia do negócio jurídico a um acontecimento futuro e incerto, o efeito deste ato não poderá ser privado por ela. Assim, se o evento futuro e incerto depender unicamente do acaso, a condição passa, ipso facto, a ser proibida, porque o evento será inteiramente fortuito, ou seja, não dependerá da vontade das partes, elemento essencial para a presença da condição. Esta espécie de condição é chamada casual porque subordina o efeito do negócio jurídico a um evento fortuito, independente da vontade das partes. Por exemplo, "se chover amanhã, dar-te-ei R$ 1.000,00". É uma condição, portanto, proibida.

  2. CONDIÇÃO POTESTATIVA:

    "O eventual desemprego do devedor de alimentos não tem o condão de exonerá-lo da obrigação, pois, em tal hipótese, equivaleria a reconhecer, em favor do alimentante, uma condição potestativa, sujeitando os alimentados ao seu arbítrio, prática defesa nos termos do art. 115225 do CC-16" (in RT 779/220).

    Potestativas são as condições que dependem da vontade de uma das partes. Segundo De Plácido e Silva, potestativa designa o ato cuja prática ou execução dependa, simplesmente, da vontade da pessoa, podendo, assim, ser praticado ou feito, independentemente da intervenção ou da vontade de outrem".226Poderão ser "puramente potestativas ou simplesmente potestativas.

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    1) Condição puramente potestativa - Também chamada cláusula si voluero (se me aprouver) a condição puramente potestativa é aquela proibida, porque o acontecimento futuro e incerto só depende da vontade de um dos contratantes nos termos do art. 122 in fine, quando este menciona as condições proibidas sendo aquelas que sujeitarem o ato ao arbítrio de uma das partes. A ementa do acórdão supra ou a que segue bem mostra a sua existência: "Sujeitando-se à garantia que obrigava a notificar, comprovando o inadimplemento do afiançado e ficando o pagamento, assim, ao arbítrio do fiador,..." este "não se exonera por descumprimento da formalidade que implique em condição puramente potestativa" (in RT 703/88). In casu, o fiador pretendeu desonerar-se alegando inexistência da notificação. Mas a condição imposta no contrato era nula, rejeitada pela lei, porque a análise do inadimplemento ficou exclusivamente ao arbítrio dele, fiador. "São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas227 - art. 122 do CC - se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes". Portanto, a lei não reconhece validade na condição puramente potestativa. Potestativa deriva do latim potestativus,...

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