Cúmulo de execuções e responsabilidade civil do exequente
Autor | Humberto theodoro júnior |
Ocupação do Autor | desembargador aposentado do tribunal de justiça de minas gerais. professor titular aposentado da faculdade de direito da ufmg. doutor em direito |
Páginas | 129-134 |
Page 129
Na execução forçada não se discute mais o mérito do crédito do autor. O título lhe assegura o caráter de liquidez e certeza. Não importa, portanto, a diversidade de títulos para que o credor se valha de um só processo. Todos eles serão utilizados para um só fim: a realização da sanção a que se acha sujeito o devedor.
É por isso que, numa evidente medida de economia processual, admite o art. 780,1
do NCPC que o credor cumule num só processo várias execuções contra o mesmo devedor, "ainda que fundadas em títulos diferentes".
Quando isso ocorre, "sob o ponto de vista formal, a execução é só uma, porque fica correndo um único processo, mas sob o ponto de vista substancial, as execuções são tantas quantas as dívidas que o processo se destina a satisfazer"2.
Verifica-se, portanto, pluralidade de lides ou de pretensões insatisfeitas solucionadas dentro de um mesmo processo.
Não obstam à cumulação, nem a desigualdade de valores, nem a diversidade da natureza dos títulos3. Podem ser cumulados, assim, títulos cambiários com títulos comuns de confissão de dívida, etc.
Trata-se, outrossim, de mera faculdade do credor, que assim não está compelido sempre a unificar suas execuções contra o devedor. Mas, uma vez utilizada a cumulação, é evidente a economia tanto do juízo como do próprio devedor, que terá de arcar com as despesas e ônus de apenas um processo.
Para a admissibilidade da unificação das execuções, exigem-se os seguintes requisitos:
-
Identidade do credor nos diversos títulos. O Código não permite a chamada "coligação de credores" (reunião numa só execução de credores diversos com base em títulos diferentes) a não ser na execução do devedor insolvente. Não impede, porém, o litisconsórcio ativo no caso em que o título executivo conferir o direito de crédito a mais de uma pessoa.
Page 130
-
Identidade de devedor. As execuções reunidas terão obrigatoriamente que se dirigir contra o mesmo executado (NCPC, art. 780).4Admite-se o litisconsórcio passivo, mas repele-se a "coligação de devedores", tal como se dá com o sujeito ativo5. Entretanto, se um só contrato é garantido por fiança de uma pessoa e por hipoteca de bem de outra, a identidade do devedor principal, permitirá que a execução cumule os vários coobrigados num só processo, embora cada um deles responda por títulos diferentes e por valores diversos6.
-
Competência do mesmo juiz para todas as execuções. Se a competência para uma das execuções for apenas relativa, não poderá ser declarada ex officio, mas apenas através de regular alegação. A natureza diversa dos títulos não impede a cumulação, que é perfeitamente viável entre hipoteca e cambial, por exemplo. Entre títulos judiciais procedentes de diversos juízos entendia-se à época do Código anterior, não ser possível a cumulação, porque a competência determinada pelo antigo art. 575, II,7do CPC/73 era firmada no juízo onde fora prolatada cada sentença, e, além disso, o processamento de cada execução deveria ocorrer nos respectivos autos da ação condenatória (art. 589, CPC/73).8Todavia, com a reforma do CPC/73 realizada pela Lei nº 11.232, de 22.12.2005, abriu-se a possibilidade de deslocar o procedimento de cumprimento da sentença para juízo diverso daquele em que a causa foi julgada: o art. 475-P, parágrafo único, que foi mantido pelo NCPC,9facultava ao exequente optar pelo juízo do local onde se encontravam os bens sujeitos à expropriação ou do atual domicílio do executado. Nestas circunstâncias, a competência funcional do juízo originário da causa cedia à competência territorial eleita pelo credor. Não há mais, por isso, vedação à cumulação de execuções de diversas sentenças contra o mesmo devedor, oriundas de ações diferentes, já que a lei permite a remessa dos autos dos processos de conhecimento a juízos diferentes, segundo a conveniência do exequente.
-
Identidade da forma do processo. Não se permite cumulação, por exemplo, de execução de obrigação de dar com de fazer. O tumulto processual decorrente da diversidade de ritos e objetivos seria evidente, caso se reunissem num só processo pretensões tão diversas. Não há também como reunir títulos executivos judiciais com títulos extrajudiciais, dada a profunda diversidade do procedimento de cumprimento de sentença e o da execução dos títulos
Page 131
extrajudiciais10. A aplicação mais frequente de execução cumulativa ocorre mesmo é com os títulos extrajudiciais de dívida de dinheiro.
Em resumo, "os traços característicos da cumulação são: unidade do exequente, unidade de executado, unidade de processo e pluralidade de execuções".11A cumulação indevida pode ser repelida pelo devedor por meio de embargos, conforme dispõe o art. 917, III, do NCPC,12regra aplicável também às execuções de todos os títulos extrajudiciais (art. 745). Na hipótese geral de cumprimento da sentença, sem actio iudicati, e sem embargos, a discussão em torno do cúmulo indevido de execuções será provocada nos próprios autos, em impugnação (NCPC, art. 525, V).
Sobre a reunião de execuções singulares em que se verifica a intercorrência de penhoras sobre os mesmos bens, veja-se adiante, o nº 275.
A cumulação originária de várias execuções, ainda que fundadas em títulos diferentes, é expressamente autorizada pelo art. 780, do NCPC13e deve ocorrer por iniciativa do exequente no momento da propositura da ação.
Uma vez citado o executado, não cabe mais ao exequente acrescentar, unilateralmente, outras pretensões fundadas em títulos diversos daquele que sustentou a petição inicial. Isto, se admitido, representaria alteração do objeto do processo, o que não se permite em nosso sistema processual civil, a não ser mediante acordo entre as partes (NCPC, art. 329). Trata-se do fenômeno da estabilização da relação processual. No entanto, há casos...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO