Cúmulo de execuções e responsabilidade civil do exequente

AutorHumberto theodoro júnior
Ocupação do Autordesembargador aposentado do tribunal de justiça de minas gerais. professor titular aposentado da faculdade de direito da ufmg. doutor em direito
Páginas129-134

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57. Cúmulo objetivo de execuções

Na execução forçada não se discute mais o mérito do crédito do autor. O título lhe assegura o caráter de liquidez e certeza. Não importa, portanto, a diversidade de títulos para que o credor se valha de um só processo. Todos eles serão utilizados para um só fim: a realização da sanção a que se acha sujeito o devedor.

É por isso que, numa evidente medida de economia processual, admite o art. 780,1

do NCPC que o credor cumule num só processo várias execuções contra o mesmo devedor, "ainda que fundadas em títulos diferentes".

Quando isso ocorre, "sob o ponto de vista formal, a execução é só uma, porque fica correndo um único processo, mas sob o ponto de vista substancial, as execuções são tantas quantas as dívidas que o processo se destina a satisfazer"2.

Verifica-se, portanto, pluralidade de lides ou de pretensões insatisfeitas solucionadas dentro de um mesmo processo.

Não obstam à cumulação, nem a desigualdade de valores, nem a diversidade da natureza dos títulos3. Podem ser cumulados, assim, títulos cambiários com títulos comuns de confissão de dívida, etc.

Trata-se, outrossim, de mera faculdade do credor, que assim não está compelido sempre a unificar suas execuções contra o devedor. Mas, uma vez utilizada a cumulação, é evidente a economia tanto do juízo como do próprio devedor, que terá de arcar com as despesas e ônus de apenas um processo.

Para a admissibilidade da unificação das execuções, exigem-se os seguintes requisitos:

  1. Identidade do credor nos diversos títulos. O Código não permite a chamada "coligação de credores" (reunião numa só execução de credores diversos com base em títulos diferentes) a não ser na execução do devedor insolvente. Não impede, porém, o litisconsórcio ativo no caso em que o título executivo conferir o direito de crédito a mais de uma pessoa.

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  2. Identidade de devedor. As execuções reunidas terão obrigatoriamente que se dirigir contra o mesmo executado (NCPC, art. 780).4Admite-se o litisconsórcio passivo, mas repele-se a "coligação de devedores", tal como se dá com o sujeito ativo5. Entretanto, se um só contrato é garantido por fiança de uma pessoa e por hipoteca de bem de outra, a identidade do devedor principal, permitirá que a execução cumule os vários coobrigados num só processo, embora cada um deles responda por títulos diferentes e por valores diversos6.

  3. Competência do mesmo juiz para todas as execuções. Se a competência para uma das execuções for apenas relativa, não poderá ser declarada ex officio, mas apenas através de regular alegação. A natureza diversa dos títulos não impede a cumulação, que é perfeitamente viável entre hipoteca e cambial, por exemplo. Entre títulos judiciais procedentes de diversos juízos entendia-se à época do Código anterior, não ser possível a cumulação, porque a competência determinada pelo antigo art. 575, II,7do CPC/73 era firmada no juízo onde fora prolatada cada sentença, e, além disso, o processamento de cada execução deveria ocorrer nos respectivos autos da ação condenatória (art. 589, CPC/73).8Todavia, com a reforma do CPC/73 realizada pela Lei nº 11.232, de 22.12.2005, abriu-se a possibilidade de deslocar o procedimento de cumprimento da sentença para juízo diverso daquele em que a causa foi julgada: o art. 475-P, parágrafo único, que foi mantido pelo NCPC,9facultava ao exequente optar pelo juízo do local onde se encontravam os bens sujeitos à expropriação ou do atual domicílio do executado. Nestas circunstâncias, a competência funcional do juízo originário da causa cedia à competência territorial eleita pelo credor. Não há mais, por isso, vedação à cumulação de execuções de diversas sentenças contra o mesmo devedor, oriundas de ações diferentes, já que a lei permite a remessa dos autos dos processos de conhecimento a juízos diferentes, segundo a conveniência do exequente.

  4. Identidade da forma do processo. Não se permite cumulação, por exemplo, de execução de obrigação de dar com de fazer. O tumulto processual decorrente da diversidade de ritos e objetivos seria evidente, caso se reunissem num só processo pretensões tão diversas. Não há também como reunir títulos executivos judiciais com títulos extrajudiciais, dada a profunda diversidade do procedimento de cumprimento de sentença e o da execução dos títulos

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    extrajudiciais10. A aplicação mais frequente de execução cumulativa ocorre mesmo é com os títulos extrajudiciais de dívida de dinheiro.

    Em resumo, "os traços característicos da cumulação são: unidade do exequente, unidade de executado, unidade de processo e pluralidade de execuções".11A cumulação indevida pode ser repelida pelo devedor por meio de embargos, conforme dispõe o art. 917, III, do NCPC,12regra aplicável também às execuções de todos os títulos extrajudiciais (art. 745). Na hipótese geral de cumprimento da sentença, sem actio iudicati, e sem embargos, a discussão em torno do cúmulo indevido de execuções será provocada nos próprios autos, em impugnação (NCPC, art. 525, V).

    Sobre a reunião de execuções singulares em que se verifica a intercorrência de penhoras sobre os mesmos bens, veja-se adiante, o nº 275.

58. Cumulação sucessiva de execuções

A cumulação originária de várias execuções, ainda que fundadas em títulos diferentes, é expressamente autorizada pelo art. 780, do NCPC13e deve ocorrer por iniciativa do exequente no momento da propositura da ação.

Uma vez citado o executado, não cabe mais ao exequente acrescentar, unilateralmente, outras pretensões fundadas em títulos diversos daquele que sustentou a petição inicial. Isto, se admitido, representaria alteração do objeto do processo, o que não se permite em nosso sistema processual civil, a não ser mediante acordo entre as partes (NCPC, art. 329). Trata-se do fenômeno da estabilização da relação processual. No entanto, há casos...

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