Cumulatividade dos adicionais

AutorRegina Célia Buck
Ocupação do AutorAdvogada. Consultora Jurídica. Professora de Direito. Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil e Mestra em Direito do Trabalho pela UNIMEP
Páginas122-145

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5.1. Da legislação em vigor e da doutrina

Os juristas e os aplicadores do direito interpretam o § 2º, do art. 193, da Consolidação das Leis do Trabalho de forma equivocada.

Diz esse parágrafo: “O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que por ventura lhe seja devido”.

Importante salientar que a opção dos adicionais de periculosidade e de insalubridade originou-se na Lei n. 2.573, de 15 de agosto de 1955, regulamentada pelo Decreto n. 40.119, de 15 de outubro de 1956, ambos revogados pela Lei n. 6.514/77.

A Lei n. 2.573/55 instituiu o salário adicional para os trabalhadores que prestavam serviços em contato permanente com inflamáveis em condições de periculosidade, cujo art. 5º mencionava: “Os trabalhadores beneficiados pela presente lei poderão optar pela cota de insalubridade que por ventura lhes seja devida”.

O Decreto n. 40.119/56 que regulamentou a citada lei, em seu art. 11, estatuía que “aos trabalhadores beneficiados por este decreto fica assegurado o direito de optar pela remuneração adicional ou pela cota de previdência, que porventura lhes sejam devidas, não podendo, entretanto, acumular esses benefícios.”

A maioria dos juristas e dos aplicadores do direito interpreta que o referido dispositivo legal indica a incompatibilidade da acumulação dos dois adicionais, devendo o trabalhador optar por aquele que lhe seja mais favorável.

Vale esclarecer que com a ratificação e vigência nacional da Convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) 155, o § 2º, do art. 193, da Consolidação das Leis do trabalho (CLT), foi revogado pela letra “b”, do art. 11, da citada convenção, determinando-se que deverão ser considerados os riscos para a saúde decorrente da exposição simultânea a diversas substâncias ou agentes.280O parágrafo segundo do referido artigo281 usa a expressão “poderá”, ou seja, é uma faculdade e não uma determinação proibitiva de cumulação de adicionais.

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O entendimento doutrinário sobre este parágrafo é no sentido de que, se o trabalhador estiver exposto aos riscos da insalubridade e da periculosidade, terá de optar pelo recebimento de um só dos adicionais.282Há, ainda, o entendimento de que o adicional de periculosidade não pode coexistir com o da insalubridade e, com fundamento nos termos do art. 193, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), havendo periculosidade e insalubridade no ambiente de trabalho, o obreiro deverá optar por um dos adicionais, visto que é vedada a acumulação.283No mesmo diapasão, advertem os doutrinadores que se deve observar que o trabalhador não pode receber concomitantemente o adicional de insalubridade e o de periculosidade. O empregado pode optar por um dos dois adicionais.284Com relação à opção, esta cabe ao trabalhador e não ao empregador, podendo o primeiro escolher o adicional que quiser, na hipótese de serem devidos os dois, inclusive o pior, ou seja, o que lhe for menos favorável. Não poderá, porém, haver o pagamento dos dois adicionais ao mesmo tempo.285Porém, na prática, o trabalhador opta pelo adicional que lhe for mais favorável economicamente.

Há vários tipos de adicionais em nossa legislação. Adicional noturno, adicional de horas extras, adicional de transferência, entre outros.

A regra geral aplicada para compensar, separadamente, cada condição adversa, é a cumulação dos respectivos adicionais. No caso do obreiro trabalhar à noite, em sobrejornada, receberá o adicional das horas extras e o adicional noturno; se for transferido e laborar em local perigoso, receberá os adicional de transferência e de periculosidade, cumulativamente.286Entretanto, como podemos verificar pela análise no campo doutrinário, no caso do trabalhador estar exposto a agentes insalubres diversos (ruídos excessivos, calor, radiações, vibrações, frio, umidade, agentes químicos e biológicos, entre outros) e agentes perigosos diversos (inflamáveis, explosivos, energia elétrica, roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial) a cumulação não poderia ocorrer, devendo o

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trabalhador optar pelo recebimento do adicional de periculosidade ou do adicional de insalubridade, o qual lhe fosse mais favorável.

A maioria dos doutrinadores afirma que a cumulação do adicional de insalubridade com o de periculosidade é vedada pela legislação e, por isso, não admite a cumulação de adicionais.

No campo doutrinário, à época do primeiro estudo, encontramos apenas uma obra divergente das outras doutrinas em matéria de cumulatividade de adicionais287.

Todavia, esta obra, de autoria do Desembargador do Trabalho do TRT-3, Sebastião Geraldo de Oliveira288, divergia dos demais doutrinadores tratando resumidamente de adicionais cumulativos, reconhecendo que, se o trabalhador estiver exposto simultaneamente a mais de um agente insalubre, terá direito a receber tantos adicionais de insalubridade quantos forem os agentes a que estiver exposto, tomando-se por base cada anexo da norma regulamentadora NR-15, da Portaria n. 3.214/78, do Ministério do Trabalho.

Admite, ainda que vagamente, a possibilidade de cumulação do adicional de insalubridade com o da periculosidade.289Atualmente encontramos alguns artigos que também admitem a cumulativi-dade dos adicionais de insalubridade e periculosidade, mas tal entendimento ainda não é majoritário.

Neste presente estudo reforçamos a importância do amadurecimento no entendimento dos doutrinadores e aplicadores do Direito quanto a cumulatividade dos adicionais, uma vez que a insalubridade diz respeito às condições prejudiciais a saúde do trabalhador e a periculosidade sobre o risco de vida ao qual o trabalhador está exposto, ou seja, dizem respeito a bens jurídicos diversos: saúde x vida.

“São bens jurídicos a vida, a liberdade a propriedade, o casamento, a família, a honra, a saúde, enfim, todos os valores importantes para a sociedade”290 e ainda “bens jurídicos são valores éticos sociais que o Direito seleciona, com o objetivo de assegurar a paz social, e coloca sob a sua proteção para que não sejam expostos a perigo de ataque ou a lesões efetivas.”291

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Vida, saúde e dignidade são bens jurídicos fundamentais do ser humano. A saúde é considerada um direito fundamental, conforme disposto no art. 6º da Constituição. Outras normas constitucionais garantem o direito à vida e à integridade física (art. 5º).292

5.2. Do entendimento jurisprudencial

A regra majoritária utilizada por nossos tribunais não difere muito da maioria dos doutrinadores, mas encontramos desde o primeiro estudo algumas divergências jurisprudenciais que, embora minoritárias, dão guarida a nossa tese.

Os aplicadores do direito justificam seus entendimentos no sentido de que a lei é que impede a cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, por estrita observância da não incidência de um adicional sobre outro, imputando ao trabalhador a opção, no caso de sua atividade achar-se caracterizada entre as duas hipóteses de proteção legal (art. 193, § 2º).293Interpretam que a cumulatividade dos adicionais é vedada pela legislação.294Afirmam que estando presentes as condições insalubres e condições perigosas no ambiente de trabalho do obreiro, deve ser-lhe deferida a maior vantagem, evidenciando, em regra, que o adicional de periculosidade é financeiramente mais vantajoso e deve ser observado o princípio da regra mais benéfica.295Para a jurisprudência majoritária, não há amparo na lei para acumulação de adicional de insalubridade pela constatação de agentes insalubres com o de periculosidade, sendo esta a justificativa para a não concessão da cumulatividade dos adicionais.

O posicionamento majoritário é no sentido de que, quando a prova pericial constatar a existência do adicional de periculosidade, uma vez que as atividades

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do trabalhador são desenvolvidas em área considerada de risco, nos termos do anexo 2 da Norma Regulamentadora NR-16, da Portaria n. 3214/78, e o adicional de insalubridade por exposição a agentes insalubres, previsto na NR-15, da Portaria mencionada, é imposta a opção pelo recebimento de um ou outro adicional por ser: vedado o pagamento simultâneo do adicional de insalubridade, no grau médio, e do adicional de periculosidade e, sendo este último mais benéfico ao trabalhador, defere o pagamento do adicional de periculosidade ao obreiro, à razão de 30% sobre a sua remuneração, com reflexos.296Todavia, em sentido contrário, encontramos algumas (raras) jurisprudências, favoráveis à cumulação dos adicionais, quando na realização da perícia, se já apurado mais de um agente insalubre nas atividades do obreiro, impondo, desta forma, o pagamento dos adicionais correspondentes, cumulativamente, visto que, neste caso, os riscos a saúde são também multiplicados.297Esses entendimentos jurisprudenciais afirmam que, quando apurado por laudo pericial a existência de dois agentes insalubres, é devido o pagamento dos adicionais correspondentes, cumulativamente, vez que também são multiplicados os riscos à saúde do obreiro e que a Portaria n. 3.214/78 quando aprovou as normas regulamentadoras do adicional de insalubridade, proibindo a acumulação de mais de um agente insalubre, excedeu de sua competência, porque estabeleceu restrição a direito não previsto na lei. Por outro lado, o pagamento de apenas um adicional, quando são dois ou mais agentes insalubres, incentiva a manutenção de um ambiente de trabalho agressivo à saúde do trabalhador. 298Outra justificativa favorável à cumulação dos adicionais é que, encontrados dois agentes...

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