Gestão cultural: algumas considerações

AutorJoão Heitor Silva Macedo
Páginas127-136

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1 Introdução

Nas últimas décadas1 tanto o poder público quanto o poder privado tem despertado seu interesse para a preservação e valorização do Patrimônio Cultural, percebendo neste setor um importante veículo de incentivo ao TurismoPage 128 Cultural quanto a políticas de responsabilidade social.

Desta forma é nosso interesse neste artigo abordar a questão da Cultura, ou melhor, a Gestão Cultural sob o enfoque do Patrimônio, trazendo assim a tona uma discussão e alguns referenciais importantes que se apresentam na atual realidade do mundo contemporâneo revertendo-se em um importante canal para o mundo da Administração.

2 A noção de patrimônio ao longo da história

A idéia de valorização do passado surge na Europa. Já no Renascimento entre os séculos XV e XVI a valorização das culturas clássicas greco-romanas apontava para a importância da herança cultural, pois estas serviam de inspiração para uma revitalização da cultura. Neste primeiro momento essa postura era difundida pela Igreja e pelos setores da burguesia que defendiam o patrimônio privado.

Mas é na França do século XVIII que há uma tomada de iniciativas realmente em defesa do patrimônio cultural, onde a monarquia assumia pra si tal tarefa, influenciada pelas idéias Iluministas. No entanto, os atos de vandalismo decorrentes da Revolução de 17892, pareciam um contra senso em um contexto de idéias que valorizavam a acumulação e difusão do saber. (CHOAY, 2001, p. 95)

Desta forma, o governo francês passa a tentar regular a proteção dos bens culturais, justificando este interesse como forma de garantir a instrução pública. Esses bens passaram a ter valor documental que contribuíam para a criação de uma noção de identidade nacional. Assim a defesa do Patrimônio passou a ser entendida como um forte instrumento político de construção da Identidade Nacional, e assim e construção do Estado Nacional Moderno.

Os bens culturais passaram a ser entendidos como bens de propriedade coletiva, e desta forma, conotam-se como um símbolo de cidadania e que passa a designar o conjunto de bens de valor cultural imensurável de propriedade da nação, ou seja, do conjunto de todos os cidadãos.

Os Estados Modernos passam a utilizar o patrimônio cultural como um instrumento de construção de uma identidade nacional. Assim, a preservação da cultura como atividade sistemática só se tornou possível porque, ao interesse cultural se acrescentou um interesse político e uma justificativa ideológica.

No início do século XIX a questão do patrimônio cultural recebe uma importância mais científica e a valorização da mesma passa a ser mais siste-Page 129matizada para cumprir seu papel fundamental e ideológico dentro deste “novo” estado moderno que surgia.

As referencias culturais do passado materializadas principalmente nas suas representações são a prova imputável do passado e da importância da construção histórica que leva a formação de um Estado-nação, assim sendo a efetiva criação de uma legislação que proteja e valorize tais bens é um processo que nasce no berço da França pós-revolucionária e assume dimensões universalistas no século XIX.

2. 1 A construção da noção de patrimônio no Brasil

É a efervescência sócio-cultural da década de vinte do século passado que traz a tona uma reflexão sobre a história e a construção de uma cultura legitimamente brasileira. Assim cabe aos modernistas o importante papel de iniciarem essa discussão, através de manifestos e artigos denunciando a perda da memória histórica através da destruição e depredação dos patrimônios arquitetônicos. Eram inúmeras as propostas que chegavam junto ao congresso para que se criasse dentro do Brasil mecanismos legais de proteção do patrimônio histórico.

Mas é na década de trinta que veremos a formalização de uma legislação patrimonial e a criação de uma estrutura legal que dava inicio a essa nova ordem nacional.

O projeto nacionalista idealizado e posto em pratica por Getúlio Vargas a partir de trinta trazia consigo as reivindicações dos modernistas e uma nova mentalidade sobre o perfil sócio-cultural do Brasil. O projeto nacionalista de Vargas não se limitava apenas a propostas de cunho econômico ou trabalhista, ele ia além, a idéia era unificar culturalmente o Brasil3.

Vargas aproximou-se de vários setores da sociedade civil para viabilizar tal projeto. A pedido do então Ministro da Educação Gustavo Capanema (SIMÃO, 2001) Mario de Andrade elaborou um anteprojeto onde ele propunha a criação de um órgão de preservação do patrimônio histórico e propunha as diretrizes de uma política patrimonial para o Brasil.

Em 30 de novembro de 1937 é promulgado o Decreto-Lei 25.

Art. 1. Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico.

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O referido decreto conceituava o patrimônio histórico e artístico nacional, e criava o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), como era inicialmente conhecido, que começa a funcionar experimentalmente em 1936, sob a direção de Rodrigo Melo de Andrade. Em 1937 o órgão passa a integrar oficialmente a estrutura do Ministério da Educação e Saúde.

Neste início de caminhada o órgão voltou seus olhos para o patrimônio representativo dos séculos XVI, XVII e XVIII além de esculturas e pinturas do mesmo período em um esforço...

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