Cultura da violência, dispositivo do amor-paixão, sexualidade e machismo: uma análise do discurso feminino em relacionamentos conturbados

AutorÂngela Maria Rubel Fanini - Marcia Lopes dos Santos - Gilberto Gnoato
CargoDoutora em Teoria da Literatura pela Universidade Federal de Santa Catarina - Doutoranda do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Tecnologia e Sociedade da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil - Doutorando do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Tecnologia e Sociedade da Universidade Tecnológica ...
Páginas132-151
http://dx.doi.org/10.5007/1807-1384.2017v14n2p132
CULTURA DA VIOLÊNCIA, DISPOSITIVO DO AMOR-PAIXÃO, SEXUALIDADE E
MACHISMO: UMA ANÁLISE DO DISCURSO FEMININO EM
RELACIONAMENTOS CONTURBADOS
Ângela Maria Rubel Fanini
1
Marcia Lopes dos Santos2
Gilberto Gnoato3
Resumo:
Este artigo analisa as postagens virtuais de mulheres visitantes de Blog, focado em
problemas conjugais. A violência dos casais é analisada pela perspectiva relacional
de Santos e Izumino (2005). Sobre o machismo, adotamos a premissa de
Castañeda (2006), que o destaca como um discurso e prática não exclusivos dos
homens. A ideologia do amor-paixão (Rougemont, 1988) também fortalece a cultura
de violência. Partimos também das contribuições de Foucault (1982, 1984, 2012,
2013) sobre o poder e a violência, enquanto relacional, e o dispositivo da
sexualidade como outro fator que leva à violência. A pesquisa espera contribuir para
uma reflexão sobre a violência contra a mulher e os relacionamentos conjugais,
enfatizando a necessidade de alterar os paradigmas culturais, que reforçam atitudes
e discursos violentos dentro e fora da família.
Palavras-chave: Cultura da violência. Discursos sobre o Feminino. Sexualidade.
Amor-paixão. Machismo.
1 DELIMITAÇÃO DO CORPUS: O SOFRIMENTO AMOROSO NAS FALAS
FEMININAS NO UNIVERSO SÓCIO-VIRTUAL
O objeto de análise deste artigo são falas femininas, cujo conteúdo principal
consiste em reclamações advindas de sofrimento causado por relacionamentos
conjugais deteriorados. Essas falas advêm de sítio eletrônico que esteve em
funcionamento no período entre 2011- 2014, contando com o registro de 1882 (um
mil oitocentos e oitenta e duas) perguntas e comentários de visitantes mulheres, na
busca de respostas para seu infortúnio amoroso. Percebeu-se que o público
feminino ali apresentava-se ávido por obter soluções para a sua conduta e a de seus
1 Doutora em Teoria da Literatura pela Universidade Federal de Santa Catarina. Pós-doutorado na
Universidade de Aveiro, Portugal. Professora dos cursos de Letras e Comunicação Institucional da
Universidade Tecnológica Federal do Paraná e no Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em
Tecnologia e Sociedade da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil.
Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq. E-mail: rubel@utfpr.edu.br
2 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Tecnologia e Sociedade da
Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil. E-mail:
marcialopes_1@hotmail.com
3 Doutorando do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Tecnologia e Sociedade da
Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba, PR. Pesquisador do CNPq. Psicoterapeuta e
Professor da Universidade Tuiuti, Curitiba, PR, Brasil. E-mail: ggnoato@onda.com.br
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R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.14, n.2, p.132-151 Mai.-Ago. 2017
parceiros. Essas mulheres encontraram uma porta que se abriu tal como um acesso
ao atendimento psicológico e puderam compartilhar suas desditas conjugais,
familiares, existenciais. Focou-se nas análises discursivas da linguagem, apostando
que a investigação e a análise dos discursos são fontes importantes para entender a
ação das pessoas na sociedade. A linguagem informa a forma como pensamos e
quais são os nossos valores sobre o feminino, o masculino, a família, a política, a
educação, ou seja, sobre a sociedade em que vivemos, trabalhamos e amamos. A
linguagem violenta também contribui para uma ação violenta, demonstrando que
estamos imersos em uma cultura da agressão de longa duração, que atinge a todos,
constituindo seres humanos que se relacionam por intermédio de dominação,
submissão e agressão.
Das 1882 perguntas e comentários, delimitamos 894 registros, cujo teor
majoritário constituía-se de queixas, que se repetiam mais substantivamente acerca
do sofrimento amoroso, excluindo 419 perguntas menos representativas. A partir
desse passo, selecionamos alguns agrupamentos de queixas, às quais
denominamos de categoria. Categoria 1 - Agressão e Submissão: ocorrem
reclamações sobre violência psicológica (humilhação, depreciação, xingamento) e
agressão física. Categoria 2 - Esperança e Culpa: informa-se o esforço para
manter ou recuperar a relação com seus parceiros, culpando-se da própria conduta
amorosa. Categoria 3 - Ciúme e Controle: reclama-se do ciúme, da posse, do
domínio e do controle de seus parceiros. Categoria 4 - Infidelidade conjugal:
destaca-se a infidelidade masculina. Categoria 5 - Sexualidade: ocorre a queixa,
envolvendo problemas com a sexualidade, a beleza física e o uso de sítios
pornográficos.
Tomamos o devido cuidado para não identificar as respondentes. As
postagens estiveram no espaço virtual de modo público, o que nos permitiu
selecioná-las. Com o fito de delinear um perfil de nossas postagens, elaboramos um
questionário on-line, solicitando que as reclamantes o respondessem. Este
permaneceu no ar por duas semanas. A devolutiva nos fez chegar ao seguinte perfil.
Quanto à localização geográfica, 82% das participantes residem no Paraná.
Visitantes de outros Estados se distribuíram pela ordem entre o Rio Grande do Sul,
Santa Catarina, São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Goiás, Distrito Federal e
Alagoas. Assim, a amostragem é nacional, indicando uma generalização dos

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