Culpa exclusiva da vítima em acidente durante atividade de risco pode afastar responsabilidade do empregador

AutorMin. Maria de Assis Calsing
Páginas51-56

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Tribunal Superior do Trabalho

Agravo de Instrumento em Recurso de

Revista n. 1721-04.2013.5.03.0040

Órgão Julgador: 4a. Turma

Fonte: DJ, 02.09.2016

Relatora: Ministra Maria de Assis Calsing

EMENTA

Agravo de Instrumento em Recur-so de Revista. Apelo interposto na vi-gência da Lei n. 13.015/2014. Danos morais e materiais. Acidente de traba-lho. Teoria do risco. Responsabilida-de objetiva. Culpa exclusiva da víti-ma. Demonstrada a divergência jurisprudencial, nos termos do artigo 896, "a", da CLT, determina-se o proces-samento do Apelo. Agravo de Instru-mento conhecido e provido. Recurso de Revista. Danos morais e materiais. Acidente de trabalho. Teoria do ris-co. Responsabilidade objetiva. Culpa exclusiva da vítima. Na forma do art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal, o empregador terá o dever de indenizar o acidente de trabalho quando incorrer em culpa ou dolo. O preceito constitucional trata da responsabilidade subjetiva do empregador. Todavia, consoante o entendimento pacífico desta Corte, na forma do art. 927, parágrafo único, do Código Civil, é possível a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva quando se tratar de atividade de risco desempenhada pelo trabalhador. No entanto, apesar de ser autorizada a aplicação da responsabilidade objetiva nos casos de acidente de trabalho, é possível se afastar a responsabilidade do empregador quando demonstrada a cul-pa exclusiva da vítima. Assim, afas-tada a tese de que a responsabilidade objetiva não pode ser excluída pela configuração de culpa exclusiva da vítima, deve ser determinado o retorno dos autos ao Tribunal a quo, para que se pronuncie sobre a ocorrência ou não desta excludente. Recurso de Revista conhecido e provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n. TST-RR-1721-04.2013.5.03.0040, em que é Recorrente "M". e Recorrida "W".

RELATÓRIO

Contra o despacho que negou seguimento ao Recurso de Revista, em razão de estarem desatendidos os pressupostos do artigo 896 da CLT, a parte agravante interpõe Agravo de Instrumento.

Contraminuta e contrarrazões da Reclamante a fis. 457/463-e.

Não houve remessa dos autos à Procuradoria-Geral do Trabalho (art. 83 do RITST).

Na análise do presente Recur-so, serão consideradas as alterações promovidas pela Lei n. 13.015/2014, visto que a publicação do acórdão regional se deu em 15/12/2015 (artigo 1º do Ato n. 491/SEGJUD.GP).

Ressalte-se, ainda, que as ques-tões serão analisadas sob o enfoque do CPC e 1973, vigente à época em que a decisão se tornou recorrível. Quanto às normas de natureza procedimental, aplicam-se de imediato as disposições do Novo CPC (Lei n. 13.105/2015), nos termos do artigo 1.046 do atual Diploma Processual. É o relatório.

VOTO

Admissibilidade

Conheço do Agravo de Instru-mento, pois preenchidos os seus pres-supostos extrínsecos.

MÉRITO

Danos morais e materiais - Aci-dente de trabalho - Teoria do risco

- Responsabilidade objetiva - Culpa exclusiva da vítima

O Regional deu provimento ao Recurso Ordinário do Reclamante, adotando os seguintes fundamentos:

"Indenizações decorrentes de aci-dente do trabalho. Responsabilidade objetiva

Pelos argumentos lançados às f. 194/201 de seu Recurso Ordinário, reitera a Autora o seu pleito pelo pagamento indenizatório a título de da-nos morais e materiais decorrentes do acidente trabalhista que levou a óbito o seu companheiro.

Em suma, sustenta a Recorrente que, à hipótese contemplada neste processado, deve ser aplicada a te-oria do risco objetivo, a fim de que a empresa Ré seja responsabilizada pelo sinistro e, destarte, compelida a promover as referidas indenizações.

Examino.

Trata-se a hipótese dos autos de ação ajuizada pela companheira do empregado falecido, Décio Henrique Fonseca Valadares, cuja união está-vel foi reconhecida pelo Órgão Pre-videnciário - INSS (f. 37).

In casu, restou incontroversa a ocorrência do acidente trabalhista típico, em que o empregado veio a óbito, após ser atingido, na cabeça, pela caçamba da escavadeira hidráu-lica locada pela Ré e operada por outro empregado (vide laudos de f. 129/136 e 137/138). No momen-to do acidente, o empregado vítima situava-se próximo ao equipamento, quando o seu operador, sem perce-ber a referida presença, realizou o repentino giro da plataforma, que veio a atingi-lo, fatalmente, na cabe-ça (vide f. 72-v do Boletim de ocorrência).

Pois bem.

De início, afirma-se que, para a responsabilização empresarial, por danos morais e materiais, são requisitos essenciais a prática do ato danoso, por parte do empregador, o dano, que pode se caracterizar como o sofri-

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mento ou prejuízo causado ao empre-gado, e o nexo causal entre ambos.

A responsabilidade civil de parti-culares, predominantemente - inclu-sive quando contextualizada na relação entre empregados e empregado-res -, baseia-se, a priori, no critério da culpa (negligência, imprudência ou imperícia), na linha normatizada pelo art. 186 do Código Civil.

Assim, a regra básica a ser obser-vada é aquela imposta pelo dispositivo legal supracitado que preceitua:

‘Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito’.

No caso destes autos, verifica-se, conforme minuciosamente analisado na sentença de origem, que o conjunto da prova oral - exclusivamente produzida pela Reclamada - revela que a empresa Ré, de fato, não foi, propriamente, a culpada pelo terrível acidente e as suas lamentáveis consequências. A decisão é bastante detalhada, no aspecto, sendo desne-cessárias ulteriores digressões no to-cante à ausência do elemento culposo patronal, embora seja indubitável a ocorrência do dano e do nexo causal, em se tratando de inequívoco e inconteste acidente trabalhista seguido do óbito do Laborista.

Todavia, em que pesem os doutos fundamentos do sentenciado, também é preciso considerar que, de acordo com as tendências jurisprudenciais mais recentes da responsabilidade civil, cada caso deve ser analisado com especial enfoque no dano sofrido pela vítima, visando a protegê-la, ou aos seus dependentes, levando-se em conta que o risco da atividade econômica desempenhada é sempre de quem dela tira proveito.

Na melhor acepção jurídica a ser direcionada ao caso em apreço, tem-se que o risco significa o perigo, a potencialidade e a previsibilidade de um dano, o que compreende os eventos incertos e futuros, os quais, embora inesperados, já possam ser antevistos e receados, na sua grande capacidade danosa. Por essa teoria, estabelece-se que todo prejuízo é imputado ao seu autor e, necessariamente, reparado por quem o causou, independentemente de se cogitar a ideia de culpa.

A teoria do risco está inserta no art. 927, parágrafo único, do Código Civil, em que se preconiza o dever de ressarcir, fundado em conceito objetivo, a dizer que, independentemente de culpa, haverá a obrigação de re-parar as consequências do ato lesivo, quando as atividades normalmente desenvolvidas pelo autor do dano implicarem, por sua própria natureza, risco para os direitos de outrem.

E, frise-se, não há delimitação específica das "atividades normalmente desenvolvidas pelo autor do dano que, por sua natureza, implicam risco para os direitos de outrem", o que leva o Julgador a avaliar cada caso concreto, conforme a realidade fática ocorrida.

Especificamente, no contexto da relação empregatícia, cumpre tam-bém elucidar que o caput do art. 7º da Constituição Federal ainda assegura a melhoria da condição social do tra-balhador, razão pela qual o seu inciso XXVIII, atinente à responsabilidade subjetiva do empregador, merece ser lido à luz do caput do já citado dis-positivo constitucional e das próprias normas...

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