Cuidados paliativos: entre autonomia e solidariedade

AutorAna Carolina Brochado Teixeira, Maria de Fátima Freire de Sá
Páginas240-258
D: 10.14210/nej.v23n1.p240-258
ISSN E 2175-0491
D : www.univali.br/periodicos
240
CUIDADOS PALIATIVOS:
ENTRE AUTONOMIA E
SOLIDARIEDADE
PALLIATIVE CARE: BETWEEN AUTONOMY AND SOLIDARITY
Ana Carolina Brochado Teixeira1
Maria de Fátima Freire de Sá2
Resumo: O conceito de saúde na contemporaneidade pressupõe um bem estar físico,
psíquico e social. A forma de vivência da saúde, portanto, é individual, na medida em
que cada pessoa arquiteta sua vida segundo os próprios valores. Por isso, faz parte indel-
ével da ideia de saúde a autonomia corporal, tanto para a vida, quanto para a morte. A
autonomia no processo do morrer tornou-se um direito fundamental, porquanto a pop-
ulação tem envelhecido consideravelmente e as doenças também têm se instalado de
forma permanente. Quando o médico conclui que não há mais meios de cura, é possível
que a pessoa se valha de cuidados paliativos, que são uma forma de cuidar do doente
terminal - e não da doença. Trata-se de medidas que visam alívio da dor, tratamento mais
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se sentir mais seguro, de modo que ele participe ativamente do seu processo de morrer,
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heroicos que objetivam apenas prolongar a vida, sem qualquer qualidade. Defende-se,
nesse artigo, que os cuidados paliativos são parte do direito fundamental à saúde, pois a
vida é um direito e não um dever, sendo possível a escolha por uma morte mais natural
e que projete de forma mais íntegra os desejos do paciente, calcados na sua autonomia
Palavras-chave: Cuidados paliativos. Autonomia. Solidariedade. Morte. Saúde.
1 Ana Carolina Brochado Teixeira. Doutora em Direito Civil pela UERJ, Mestre em Direito Privado pela
PUC Minas, Especialista em Direito Civil pela Scuola di Diritto Civile di Camerino-Itália. Professora de
Direito Civil do Centro Universitário UNA, Belo Horizonte-MG, Brasil. Pesquisadora do CEBID. Advoga-Pesquisadora do CEBID. Advoga-. Advoga-
da. E-mail: anacarolina@teixeiraemirandaadvogados.com.br.
2 Maria de Fátima Freire de Sá, Doutora em Direito pela UFMG. Mestre em Direito pela PUC Minas. Pro-Doutora em Direito pela UFMG. Mestre em Direito pela PUC Minas. Pro-
fessora do Curso de Graduação e do Programa de pós-graduação (mestrado e doutorado) em Direito
da PUC Minas, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Pesquisadora do CEBID. E-mail: mfatimasa@uol.
com.br.
D: 10.14210/nej.v23n1.p240-258
R N E J - E, V. 23 - . 1 - - 2018 241
Abstract: The concept of health in contemporary society presupposes good physical,
mental and social welfare. The form of experiencing health, therefore, is individual insofar
as each person architects their lives according to their own values. Thus, bodily autonomy
is an indelible part of the idea of health, both for life and for death. The autonomy in the
process of dying has become a fundamental right, considering that population has aged
considerably and diseases have also been permanently installed. When the doctor con-
cludes that there are no means of healing, it is possible for the person to receive palliative
care, which is a way to take care of the terminally ill patient - and not of the disease. These
are measures that aim to relieve pain, a more humane treatment involving the family, in
which the patient can stay at home or other place able for feeling safer, in such a way that
active participation in one’s own process of dying is allowed, as part of the biographic con-
struction. In this sense, one can renounce heroic treatments that aim only to prolong life,
without any quality. It is argued in this article that palliative care is part of the fundamental
right to health, for life is a right and not a duty, and it is possible to choose a more natural
death which projects the patient’s desires more straightforwardly, based in their autonomy.
Keywords: Palliative care. Autonomy. Solidarity. Death. Health.
INTRODUÇÃO
“Quando você chegar a um dos muitos momentos da vida em que

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que não se esqueça de que você preencheu os dias de um homem
à beira da morte com uma alegria plena, uma alegria que me foi
desconhecida em todos os meus anos passados, uma alegria que não
pede cada vez mais e, sim, descansa, saciada. E, neste momento, isso
é algo enorme.3

pouco antes de morrer de câncer, aos trinta e sete anos de idade. Em O último
sopro de vida, livro publicado no Brasil em 2016, Paul relatou sua experiência,
tanto como médico, no início e ao longo de sua carreira, quanto sua experiência
como paciente terminal: como eu podia ser tão autoritário usando um jaleco de
cirurgião e tão humilde numa camisola de paciente?4
Paul foi residente-chefe do Hospital de Stanford e, infelizmente, a doença o
surpreendeu em uma fase de vida em que não só a sua carreira, mas também a
de sua esposa Lucy, estavam no auge. Com mestrado em Literatura e apaixonado
3 KALANITH, Paul. O último sopro de vida. Rio de Janeiro: Sextante, 2016, p. 148.
4 KALANITH, Paul. O último sopro de vida. Rio de Janeiro: Sextante, 2016, p. 19.

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