Criminologia Feminista com Criminologia Crítica: perspectivas teóricas e teses convergentes

AutorMariana Assis Brasil Weigert, Salo Carvalho
CargoMestre em Criminologia e Execução Penal (UAB/Barcelona) e em Ciências Criminais (PUCRS) e Doutora em Psicologia Social (UFRGS)/Professor adjunto de direito penal e criminologia da Faculdade Nacional de Direito/UFRJ e professor do programa de pós-graduação (mestrado e doutorado) em Direito da Unilasalle/RS. Mestre (UFSC) e Doutor (UFPR) em Direito
Rev. Direito Práx., Rio de Janeiro, Vol.11, N.03, 2020, p.1783-1814.
Mariana de Assis Brasil e Weigert e Salo de Carvalho
DOI: 10.1590/2179-8966/2019/38240| ISSN: 2179-8966
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Criminologia Feminista com Criminologia Crítica:
Perspectivas teóricas e teses convergentes
Feminist Criminology allied to Critical Criminology: theoretical perspectives and
convergent theses
Mariana de Assis Brasil e Weigert1
1 Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. E-
mail: mabw@terra.com.br. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7023-3833.
Salo de Carvalho2
2 Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil; Universidade Lasalle,
Canoas, Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: salo.carvalho@uol.com.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2006-9916.
Artigo recebido em 12/11/2018 e aceito em 10/07/2019.
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Rev. Direito Práx., Rio de Janeiro, Vol.11, N.03, 2020, p.1783-1814.
Mariana de Assis Brasil e Weigert e Salo de Carvalho
DOI: 10.1590/2179-8966/2019/38240| ISSN: 2179-8966
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Resumo
O estudo objetiva, em primeiro plano, apresentar o estado da arte das pesquisas que
possuem como objeto a criminalidade e a criminalização das mulheres. Ao mapear os
estudos criminológicos contemporâneos, busca, em segundo plano, delimitar os temas e
os problemas de investigação das criminologias feministas e crítica para,
posteriormente, identificar as zonas de convergência e de conflito. A hipótese central do
artigo é a de que é possível identificar a permanência da criminologia positivista nas
ciências criminais também nos estudos que envolvem cri mes praticados por e/ou contra
mulheres e que as criminologias feministas e a criminologia crítica, apesar de
divergências (reais e/ou aparentes) nos campos epistemológico e político-criminal,
apresentam uma identidade comum antipositivista que possibilita o
redimensionamento das perguntas que entrelaçam as questões penal e criminal com as
de gênero. O estudo se desenvolve a partir do levantamento das principais pesquisas
sobre os temas e propõe uma reflexão teórica que procura identificar uma hipótese
comum ou identidade compartilhada entre a teoria crítica (criminologia crítica) e o
feminismo (criminologias feministas).
Palavras-chave: Criminologia Feminista; Criminologia Crítica; Feminismo; Teoria Crítica;
Violência de Gênero.
Abstract
The aim of this paper is to, first, discuss the state of the art of the literature on
criminality and women’s criminalisation. In mapping contemporary criminological
studies, it seeks, secondly, to deli mit the themes and the topics of research of feminist
criminology and critical criminology, in order to identify zones of convergence and
conflict. The main hypothesis of the article is that it is possible to identify the constant
use of positivist criminology in studies involving crimes committed by and / or against
women, and that feminist criminology and critical criminology, despite differences (real
and / or apparent) in the epistemological and political-criminal fields, present a common
anti-positivist identity that allows the reshaping of questions that combine criminal and
gender issues. The study conducts a review of the main literature on the topic, followed
by a theoretical reflection that seeks to identify a common hypothesis or shared identity
between critical theory (critical criminology) and feminism (feminist criminology).
Keywords: Feminist Criminology; Critical Criminology; Feminism; Critical Theory; Gender
Violence.
Rev. Direito Práx., Rio de Janeiro, Vol.11, N.03, 2020, p.1783-1814.
Mariana de Assis Brasil e Weigert e Salo de Carvalho
DOI: 10.1590/2179-8966/2019/38240| ISSN: 2179-8966
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1. Introdução
A tensão entre criminologia crítica e criminologia feminista, sobretudo nos planos
epistemológico e político-criminal, é uma variável constante nos debates do campo há,
no mínimo, três décadas. Embora muitas hipóteses tenham sido consolidadas, ainda
existe um amplo espaço de problematização e, sobretudo, de aproximação entre ambas
as perspectivas criminológicas.
Neste cenário, os objetivos centrais do trabalho são (primeiro) delimitar os
objetos de investigação das criminologias feministas e da criminologia crítica; (segundo)
mapear os estudos criminológicos contemporâneos de corte positivista que possuem
como objeto a mulher autora e vítima de delitos; e (terceiro) identificar as zonas de
convergência entre as tendências crítica e feminista na qualidade de modelos
contrapostos ao positivismo criminológico. Como ponto de partida, optou-se por
identificar a permanência da criminologia positivista nas ciências criminais, inclusive
com uma importante projeção nos estudos que envolvem crimes praticados por e/ou
contra mulheres. A demonstração do atual estado da arte das investigações de corte
etiológico sobre temas que envolvem estas espécies de crimes possibilita, inclusive,
verificar os níveis de aproximação da criminologia positivista com algumas perspectivas
liberais do feminismo.
Fundamental referir que este ensaio é a primeira etapa de um projeto mais
amplo que propõe discutir as convergências e as divergências entre feminismo e teoria
crítica na criminologia. Neste momento, realizamos um esforço inicial para apresentar
as pautas confluentes e harmônicas entre as criminologia s feministas e crítica,
notadamente no que diz respeito à dimensão negativa antipositivista. O estudo abre
caminho para uma exploração seguinte, em fase de desenvolvimento, que ultrapassa os
limites deste artigo, e que tem como objetivo: (primeiro) discutir os contrapontos nos
planos epistemológico e político, inclusive político-criminal, apontando divergências
reais e/ou aparentes; e (segundo) problematizar a necessidade de compatibilização ou
de superação (dialética) dos modelos, notadamente em razão do respeito à identidade e
à autonomia de cada perspectiva crí tica. Alguns pontos de tensão entre as criminologias
feministas e as criminologias (positivista e crítica) podem ser identificados no clássico
debate proposto por Carol Smart (1990, pp. 71-84). Os problemas decorrentes desta
tensão vem sendo aprofundados e sofisticados nas últimas décadas, tendo a

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