A possibilidade de execução dos créditos previdenciários provenientes da declaração do vínculo empregatício pela Justiça do Trabalho

AutorGustavo Borges da Costa
CargoFuncionário Público Federal no cargo efetivo de Analista Judiciário
Páginas106-118

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1. Introdução

A execução dos créditos previdenciários provenientes dos julgados trabalhistas já é uma realidade na Justiça do Trabalho. Ocorre que atualmente existe um grande embate doutrinário, jurisprudencial e até legal em face das execuções das contribuições sociais provenientes do reconhecimento do vínculo empregatício pela Justiça Laboral.

A atual jurisprudência sumulada do Colendo Tribunal Superior do Trabalho entende que a Justiça do Trabalho não tem competência para a execução dos créditos previdenciários referentes ao período de vínculo empregatício declarado nas sentenças proferidas pela Justiça do Trabalho.

Até o Supremo Tribunal Federal está em vias de editar súmula vinculante nesse sentido.

Nesse passo, em julgamento do Recurso Extraordinário n. 569.056-3-PA interposto, à época, pelo Instituto Nacional do Seguro Social
— INSS —, o STF entendeu que a matéria ali debatida — tratando do alcance do art. 114, inciso VIII, da Constituição Federal —, tem repercussão geral, requisito essencial para a criação de súmula vinculante, a qual, até meados de maio de 2009, ainda não foi editada.

Não tendo a pretensão de esgotar essa vasta matéria, confrontarei o entendimento das Cortes superiores com o estampado na Constituição Federal e legislação infraconstitucional a fim de trazer uma contribuição para a elucidação da real competência da Justiça Laboral sobre o tema.

2. Da controvérsia sobre a execução, de ofício, dos créditos previdenciários provenientes do reconhecimento do vínculo de emprego declarado em sentença transitada ou acordo homologado pela Justiça do Trabalho

Há algum tempo a jurisdição processual da Justiça do Trabalho vem se avolumando tornado-a competente para o processamento de causas que vão além das empregatícias.

Outrora matéria controversa entre os doutrinadores e na jurisprudência, a execução dos créditos previdenciários provenientes de reclamações trabalhistas tornou-se uma realidade nos domínios do processo do trabalho, principalmente após a entrada em vigor da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, responsável pela introdução do § 3º ao art. 1141 da Constituição Federal de 1988.

A Emenda Constitucional n. 45, de 30 de dezembro de 2004, transferiu o texto em que tratava das execuções previdenciárias pela Justiça do Trabalho para o inciso VIII, mantendo redação semelhante, consolidando a competência da Justiça Laboral para a execução dos créditos previdenciários provenientes de seus julgados, vejamos:

“Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 45, de 2004)
(...)

VIII – A execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;”.

Embora a Emenda Constitucional n. 20 tenha apaziguado as discussões até então existentes sobre a execução previdenciária, necessitou de regulamentação infraconstitucional por meio da Lei federal n. 10.035, de 25 de outubro de 2000, a qual alterou artigos da Consolidação das Leis do Trabalho.

O Tribunal Superior do Trabalho, seguindo o então recente entendimento constitucional, elaborou a Orientação Jurisprudencial n. 141 da SDI-1, inserida em 27.11.1998 e posteriormente convertida no inciso I do enunciado da Súmula
n. 3682, senão vejamos:
“(...) A competência da Justiça do Trabalho para execução das contribuições previdenciárias

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alcança as parcelas integrantes do salário de contribuição, pagas em virtude do contrato, ou de emprego reconhecido em juízo, ou decorrentes de anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social — CTPS, objeto de acordo homologado em Juízo. (...)”.

Em suma, o entendimento da Corte superior trabalhista era de que a Justiça do Trabalho tinha plena competência para execução dos créditos previdenciários provenientes das sentenças que proferir, não apenas sobre as verbas condenatórias ou homologatórias de natureza salarial, mas também sobre a incidente sobre a declaração do vínculo empregatício:

“RECURSO DE REVISTA. RITO SUMARÍSSIMO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. EXECUÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ART. 114, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. RECONHECIMENTO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO. ANOTAÇÃO NA CARTEIRA DE TRABALHO. O art. 114, § 3º, da Constituição da República dispõe que compete ainda à Justiça do Trabalho executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no art. 195, I, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir. Percebe-se que o legislador quis que as contribuições sociais incidissem sobre os valores apurados em qualquer sentença trabalhista, inclusive as declaratórias. Recurso de Revista de que se conhece e a que se dá provimento. (RR – 930/2003-002-23-01.4 , Relator Ministro: João Batista Brito Pereira, Data de Julgamento: 24.8.2005, 5a Turma, Publicação: 16.9.2005)”. (grifei)

Assim, o Tribunal Superior do Trabalho dirimiu quaisquer possíveis controvérsias e ratificou o entendimento sobre a execução dos créditos previdenciários, inclusive sobre o reconhecimento do vínculo empregatício declarado em sentença.

Quando o entendimento já estava pacificado e com plena aplicabilidade o TST, por meio da Resolução n. 138/2005, resolveu alterar o inciso I do enunciado da Súmula n. 368, mudando entendimento em relação à competência da

Justiça do Trabalho para execução dos créditos previdenciários sobre o vínculo declarado em sentença, vejamos:

“368. DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS. COMPETÊNCIA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO. FORMA DE CÁLCULO (inciso I alterado) – Res. n. 138/2005, DJ 23, 24 e 25.11.2005

I – A Justiça do Trabalho é competente para determinar o recolhimento das contribuições fiscais. A competência da Justiça do Trabalho, quanto à execução das contribuições previdenciárias, limita-se às sentenças condenatórias em pecúnia que proferir e aos valores, objeto de acordo homologado, que integrem o salário de contribuição. (...)”.

Pelo teor do enunciado supracitado podemos concluir que a Colenda Corte Superior trabalhista adotou entendimento de que a Justiça do Trabalho tem competência tanto para determinar o recolhimento previdenciário das sentenças que proferir como também para executá-las, consequentemente, se pronunciar, na execução, sobre a incidência ou não da contribuição previdenciária, mas não tem para executar as verbas previdenciárias atinentes ao vínculo empregatício que declara.

Como muito bem assevera Fabrício Lopes Oliveira3 buscando explicar o posicionamento atualmente adotado pela Corte trabalhista:

“o TST, por intermédio de sua presidência, passou a reconhecer certo desprestígio de sua atuação, pelo fato de o INSS, (...), não repercutir de forma direta e imediata o conteúdo das declarações de vínculo realizadas às suas sentenças. Uma autêntica capitis diminutio.”

A diminuição de valor dos efeitos dos julgados trabalhistas por parte da autarquia previdenciária ocorre pelo fato de não considerá-los plenamente quando da concessão de uma aposentadoria, por exemplo, em que o tempo de serviço estaria demonstrado em decisão judicial trabalhista

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transitada em julgado, ou de acordo homologado judicialmente.

O referido posicionamento baseia-se na possibilidade da falta de início de prova material4 por parte das sentenças trabalhistas ou acordos homologados que venham a reconhecer vínculo empregatício, por exemplo, baseando-se apenas em provas testemunhais.

Nessa linha, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar lides envolvendo justamente a discussão sobre a validade das sentenças trabalhistas sobre o reconhecimento do vínculo de emprego, adota o seguinte posicionamento:

“AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. PROVA MATERIAL. 1. A jurisprudência pacífica desta Corte é de que a sentença trabalhista pode ser considerada como início de prova material, sendo hábil para a determinação do tempo de serviço enunciado no art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/1991, desde que fundada em elementos que evidenciem o exercício da atividade laborativa na função e períodos alegados na ação previdenciária, ainda que o INSS não tenha integrado a respectiva lide. 2. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1058268/RS, Rel. Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, julgado em
28.8.2008, DJe 6.10.2008).”

Em sua mais recente obra Luciano Athayde Chaves5 disseca tal situação reconhecendo a existência de decisões trabalhistas reconhecedoras de liame empregatício que podem vir a carecer de uma comprovação mais acurada, por exemplo, em homologação de acordo judicial em fase de conhecimento sem a devida averiguação dos documentos acostados pelas partes, ou nos casos de julgamento da lide em face de revelia sem analisar as provas que demons-trem o vínculo, asseverando que ele próprio, como Juiz do Trabalho que é, já negou a chancela a acordo judicial sobre o tempo de serviço não comprovado.

Ocorre que tal situação, para o referido autor, deve ser analisada sob o seguinte prisma6:

“o problema aqui ainda ganha outros contornos pelo fato de que a Constituição Federal atribui à jurisdição trabalhista estreita relação com o terreno previdenciário. Se da sentença trabalhista resulta, como efeito secundário, a formação de relação obrigacional para reconhecimento das contribuições decorrentes do decisium, por óbvio deve esta mesma sentença produzir eficácia reflexa (Liebman) ao INSS como terceiro, de modo a fazer valer os termos da sentença para fins de comprovação do tempo de serviço perante a autarquia previdenciária ou qualquer outro órgão, máxime quando dispõe o INSS de meios de impugnação expressamente admitidos em lei para atacar eventual...

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