A corrupção no Brasil à luz do direito econômico

AutorRicardo Antonio Lucas Camargo
CargoDoutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais
Páginas74-107
FACULDADE DE DIREITO DO RECIFE
ISSN: 1980-3087
Volume 87, número 1, jan./jun. 2015
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CORRUPTION IN BRAZIL ACCORDING TO ECONOMIC LAW
*
A CORRUPÇÃO NO BRASIL À LUZ DO DIREITO ECONÔMICO
Ricardo Antonio Lucas Camargo 1
ABSTRACT
One argues the search of rational judgments for understanding corruption as an
unlawful symbiosis among Public Power and private interests, with its repercussions in
elaboration and execution of economic policy so attracting Economic Laws interest By
applying the analytical-substantial method, one shall inquire into its presence in
economic reality, as well as its perception by economic agents, verifying the point it may
be or not undesirable for them, and then researching the constitutional targets of State
action in economic order, facing comprehension of being fair such an action only when
according to its own reason of being. At the end, one shall argue parameters employed in
qualifying measures of economic policy, to find out if there is or not corruption when
they are executed.
Keywords: Corruption. Economic Law. Economic policy.
RESUMO
Discute-se a busca de critérios racionais para a compreensão da corrupção enquanto
simbiose injurídica entre o Poder Público e interesses particulares, com suas
repercussões na formulação e execução da política econômica, atraindo, pois, o interesse
do Direito Econômico. Pela aplicação do método analítico-substancial, examinar-se-á a
sua presença na realidade da economia, bem como a sua percepção por parte dos
agentes econômicos, verificando até que ponto ela pode ser ou não indesejável para
estes e, em seguida, investigar-se quais são os fins constitucionais da ação do Estado na
ordem econômica, diante da compreensão de ela somente poder ser considerada lisa
quando em conformidade com a sua própria razão de ser. Ao cabo, discutir-se-ão os
parâmetros empregados na qualificação das medidas de política econômica, para se
concluir acerca da presença ou não da corrupção quando da respectiva execução.
Palavras-chave: Corrupção. Direito Econômico. Política econômica.
1 Doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor Adjunto da Faculdade de
Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Porto Alegre, RS/Brasil).
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A questão da lisura com o trato da coisa pública tem sido objeto de acirradas
discussões desde as primeiras experiências de participação dos cidadãos no exercício do
poder, sendo de notar, como exemplo, o dado de Cícero nos haver legado as Verrinas,
denunciando o Governador da Sicília.
Desde a condição de matéria para diálogo sem compromisso entre pessoas
conviventes, em caráter transitório ou permanente, entre si, a até a de razão de ser da
criação das estruturas de fiscalização e repressão, pode-se dizer que ela é tão
onipresente nos discursos e preocupações declaradas quanto a educação.
Nas conversas mais informais a palavra corrupto é agitada tanto para fins de
maledicência quanto para fins de insulto, enquanto, no momento de se extraírem
consequências jurídicas para ela, por exemplo, a punição do corrupto, torna-se
necessário, em primeiro lugar, individualizar o fato que autorize tal qualificação atirada
à pessoa e, em segundo lugar, individualizar o que, quando e onde teria feito a pessoa
que recebe a qualificação em tela para merecer sofrer a reprovação jurídica.
Neste artigo, pretende-se, fugindo ao cânone da pregação moral ou da pretensão
de encontrar a fórmula infalível para erradicar o câncer da corrupção trazer
elementos para a respectiva compreensão e combate no seio do Estado de Direito, bem
como o papel que pode o Direito Econômico, em interface com o Direito Administrativo,
desempenhar.
Para o exame nesta perspectiva, empregar-se-á o método analítico-substancial,
escandindo o problema das repercussões da corrupção no mercado enquanto
conteúdo econômico do direito, passando pelos fins constitucionalmente estabelecidos
para o Estado na ordem econômica, para se verificar, ao final, o quanto a questão da
corrupção interfere na própria possibilidade de formulação e execução da política
econômica pública e na percepção da respectiva validade.
Por se tratar da política econômica pública não se tomarão para o efeito deste
texto, situações em que os polos da relação sejam dois ou mais sujeitos privados, embora
não se desconheça a importância da consideração deste cenário, merecedor, por si só, de
estudo à parte.
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Por esta razão, também, de estar cingido à política econômica pública, não se
realizará uma tipologia da corrupção que caberia perfeitamente num estudo voltado a
uma teoria geral acerca desta categoria, tanto no âmbito da Teoria Geral do Direito
quanto da Sociologia.
Não se tratará aqui a palavra corrupção no sentido específico que tem no
Direito Penal, que tem os seus contornos bem delimitados nos artigos 317, 333 e 337-B
do Código Penal de 1940: o vocábulo será empregado para designar as simbioses
injurídicas entre o Poder Público e determinados interesses privados.
Reportar-se-ão os autores trazidos em sede de nota de rodapé, outrossim, mais
para que se saiba que trataram, de algum modo, do texto anotado, sem qualquer
compromisso com a concordância com a referência ou com a concordância deles entre
si, indicando-se fontes para futuros aprofundamentos.
A relação entre o problema da corrupção e o comportamento do mercado
A reprovabilidade moral da corrupção leva muitos a crerem que ela seria
necessariamente, hostil ao mercado.
Tem-se disseminado um senso comum associando os descalabros com a gestão
da coisa pública com o abandono da fidelidade ao credo na infalibilidade da mão
invisível uma vez que uma máquina administrativa pesada estimularia os agentes
privados a lançarem mão de expedientes para ladearem os custos de conformidade
2.
Como se sabe, um dos indicativos que se utilizam para mensurar o poder
econômico é a capacidade de o agente respectivo remover os obstáculos a que a
atividade respectiva produza resultados positivos no menor tempo possível.
2 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 366;
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Constituição e revisão. Rio de Janeiro: Forense, 1991, p. 485;
FERRAZ, Selma. Princípios da ordem econômica e o conceito d e sociedade justa. In: FERRAZ, Roberto
[org.]. Princípios e limites da tributação 2 os princípios da ordem econômic a e a tributação. São
Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 209-210; SITJA, Henrique Serra & BALBINOTTO NETO, Giacomo. Corrupção
e liberdade de imprensa: teorias e evidências. Revista de Controle e Administração. Rio de Janeiro, v. 4,
n. 1, p. 62-3, jan/jun 2008; CARRARO, André. Um modelo de equilíbrio geral computável com
corrupção para o Brasil. Porto Alegre: Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, 2003, p. 139 (tese de doutorado).

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