Acórdão correspondente ao TRT da 10ª Região

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Poder Judiciário


Justiça do Trabalho
Tribunal Regional do Trabalho — 10ª Região

Processo: 00727-2008-006-10-00-6-RO

Acórdão do(a) Exmo. (a) Desembargador(a) Federal do Trabalho Douglas Alencar Rodrigues

Ementa: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ENTIDADE VINCULADA À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA. PRORROGAÇÃO DO PRAZO DE VALI-DADE DE CONCURSO PÚBLICO. PREVISÃO EM EDITAL. DECISÃO NEGATIVA. ATO DISCRICIONÁRIO. MOTIVAÇÃO EXPOSTA AO MINIS-TÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. POSSIBILIDADE DE SUBMISSÃO AO CONTROLE JUDICIAL. I — Embora a prorrogação do prazo de validade de concurso público encerre ato discricionário do Administrador, vinculado a juízos próprios de conveniência e oportunidade, a indicação das razões que justificam a conduta viabiliza e legitima a sua submissão à sindicância judicial — à luz das teorias do desvio de poder e dos motivos determinantes —, sem que isso implique invasão da margem de liberdade conferida à Administração. Precedentes do STF. II — No Estado Democrático de Direito, não se tolera a prática de atos abusivos e arbitrários, infensos ao controle judicial (CF, art. 5º, XXXV). Assim, se os motivos apresentados para justificar a decisão de nãoprorrogação do prazo de validade de concurso público ressentem-se da ausência de razoabilidade, se há candidatos aprovados aguardando convocação e se está demonstrada a necessidade de contratação

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imediata de empregados pelo ente público envolvido, será impositiva e irrecusável a obrigação de processar, em respeito ao interesse público e aos princípios constitucionais aplicáveis (CF, art. 37), a contratação dos trabalhadores aprovados no processo democrático de seleção realizado. Recurso conhecido e provido.

Relatório

A Excelentíssima Juíza do Trabalho Substituta Raquel Gonçalves Maynarde, em exercício na MMª 6ª Vara do Trabalho de Brasília DF, proferiu a r. sentença de fls. 281/297, julgando improcedentes os pedidos deduzidos pelo Ministério Público do Trabalho em face do Banco do Brasil S.A. Inconformado, recorre ordinariamente o Requerente às fls. 298/312, insistindo no deferimento dos pleitos formulados na peça inicial. Contrarrazões apresentadas pela Reclamada às fls. 323/335. O Recorrente é isento do recolhimento de custas processuais (art. 790-A, II, da CLT). A despeito do disposto no art. 102, IV, do Regimento Interno desta Corte, os autos foram remetidos ao Ministério Públio do Trabalho, que se manifestou no sentido da desnecessidade de emissão de parecer (fls. 340/341). É, em resumo, o relatório.

Voto

1. Admissibilidade

Alega o Recorrido, em contrarrazões, que o apelo está desfundamentado, porquanto as razões de irresignação não refutaram a fundamentação principal da sentença prolatada. Pretende, por esse motivo, o não conhecimento do apelo, com base no art. 514, II do CPC. Não lhe assiste razão. Muito embora a legislação laboral assegure maior informalidade na interposição de recursos que não sejam de natureza meramente técnica, a exemplo do recurso ordinário (CLT, art. 899), fato é que a convivência harmônica entre a simplicidade — que preside o processo especializado — e o princípio da devolutibilidade — próprio ao reexame dos atos judiciais decisórios — torna imperiosa a existência de fundamentação regular e argumentação lógica que traduzam a irresignação da parte contra o provimento que lhe foi desfavorável. No caso em exame, o Recorrente desenvolve sólida argumentação, fun-dada em lições doutrinárias e em precedentes jurisprudenciais, asseverando a possibilidade de controle judicial de quaisquer atos, bem como a ilegalidade da não-convocação dos aprovados remanescentes do concurso iniciado em 2006. As razões do apelo, na forma como expostas, permitem o conhecimento do recurso, não se revelando razoável, data venia, exigir do Recorrente o ataque particularizado a cada parágrafo julgado impugnado. Rejeito a preliminar. Tempestivo e regular, conheço do recurso.

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2. Mérito

Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho — Procuradoria Regional do Trabalho da 10ª Região em face do Banco do Brasil. Na petição inicial, disse o Requerente ter recebido denúncia de irregularidade praticada pelo Requerido no que tange à gestão de pessoal, envolvendo a convocação de candidatos aprovados em concurso público para o emprego de escriturário. Afirmou que a referida denúncia envolvia a publicação de edital pelo Requerido, informando a abertura de novo concurso para o emprego de escriturário no Distrito Federal, quando ainda em vigor o prazo de validade do concurso anterior destinado ao provimento de idênticos empregos, realizado em 2006, em cujo edital estava prevista a possibilidade de prorrogação por mais dois anos daquele prazo. Narrou que, em razão da denúncia, deu início a procedimento preparatório de inquérito civil público, notificando o Banco do Brasil a prestar esclarecimentos e a apresentar os documentos necessários à apuração dos fatos. Acrescentou que o Banco do Brasil justificou a realização de nova seleção e a não-prorrogação do concur-so de 2006 como opção gerencial, nos exatos termos do item 13.7 do edital do certame. Anotou que o Diretor de Gestão de Pessoas do Requerido, Sr. Juraci Masiero, em audiência realizada na sede da Procuradoria Regional do Trabalho, explicou que a decisão de não prorrogar o concurso deveu-se à constatação de que a aceitação à convocação diminui à medida que o prazo de validade do concurso vai chegando ao seu termo final. Asseverou que foi proposta a assinatura de termo de ajuste de conduta com a finalidade de obter a prorrogação do prazo de validade do concurso, o que não foi aceita pelo Réu, razão pela qual propôs ação cautelar inominada, cujo pedido foi liminarmente deferido pelo juízo de origem. Destacou que a demanda visa à tutela dos direitos dos cidadãos aptos a postular a aprovação em concurso para ingresso em emprego público, preservando-se os princípios da moralidade, legalidade e impessoalidade. Ressaltou que 1.453 candidatos do certame de 2006 foram chamados, restando 1.291 aprovados que ainda aguardam convocação, tendo sido aberta nova seleção quando ainda vigente aquele concurso de 2006. Após transcrever trechos de julgados, deduziu o pedido inicial com o objetivo de que seja o Réu condenado a i) prorrogar o prazo de validade do concurso público de que trata o Edital n. 1-2006/001; ii) abster-se de convocar os candidatos aprovados e classificados por meio do Edital n. 1-2008/001, até que tenham sido convocados todos os candidatos aprovados no concurso regido pelo Edital n. 1-2006/001; iii) pagar indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 100.000.000,00 (cem milhões de reais);
iv) pagar multa diária de R$ 100.000,00 em caso de descumprimento do provimento judicial. O pedido de antecipação dos efeitos da tutela restou indeferido pelo juízo de origem em decisão lavrada às fls. 212/213.

Defendeu-se o Réu alegando que os editais das seleções de 2006 e 2008 não asseguram a contratação de todos os aprovados para a formação

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de cadastro de reserva. Disse que não foram demonstradas quais normas alusivas ao concurso estariam sendo desrespeitadas, aduzindo que o preen-chimento da vagas subordina-se aos limites impostos pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (Dec. n. 6.081/07). Alegou não ter suspendido a contratação dos candidatos aprovados no concurso de 2006, tanto que, da abertura da seleção de 2008 até o dia 9.6.2008, ocorreram 537 convocações. Sustentou que inexiste lei que impeça a realização de novo concurso dentro do prazo de validade do certame anterior (arts. 5º, II, e 37, caput, da CF), inexistindo violação à expectativa de direito dos candidatos aprovados para formação do cadastro de reserva. Afirmou não ter violado os princípios informativos da atuação da Administração Pública, destacando que a prorrogação do prazo de validade do concurso é ato discricionário do administrador. Com outros argumentos, disse que o inciso IV do art. 37 da CF não obriga a prorrogação do prazo de validade do certame e que a Justiça do Trabalho não pode interferir em seu juízo de conveniência e oportunidade, atribuindo ilegalidade ao seu ato por suposto desvio de poder. Solucionando a controvérsia, a d. juíza sentenciante pontuou que a prorrogação do concurso, como aludido no próprio edital da seleção de 2006, se daria a critério exclusivo do Réu, tratando-se de ato discricionário, conforme pacificado entendimento jurisprudencial. Sentenciou que o ato discricionário do administrador só pode ser analisado pelo Judiciário sob a óptica da legalidade, pelo que não cabe discussão sobre o mérito administrativo, sob pena de ofensa aos princípios da separação e independência dos poderes. Pontuou que a hipótese dos autos não diz respeito ao preenchimento de vagas — caso em que o ato prorrogativo tornar-se-ia vinculado —, pois o concurso foi lançado para constituição de cadastro de reserva. Anotou que o ato discricionário de não prorrogar o concurso não depende de fundamentação e até já caducou, não podendo ser praticado sequer pelo Administrador. Acrescentou que o Autor não fez prova de que o ato tornou-se vinculado em razão da imediata necessidade de contratação de novos empregados. Decidiu que a situação verificada nos autos não se assemelha à dos precedentes colacionados pelo Autor, eis que a hipótese versada nos autos não é de preterição de candidato pela contratação de terceirizados. Assinalou que a abertura da seleção de 2008 quando ainda em vigor o concurso de 2006 não foi impugnada nos presentes autos, sendo certo que o item 1.3 do edital daquele certame resguardou a preferência dos aprovados neste, no prazo remanescente de sua vigência, razão por que preservada a regra do art. 37, IV, da CF. Concluiu, ao final, que não houve desvio de poder, nem qualquer ilegalidade na ausência de prorrogação do concurso de 2006. Em suas razões recursais, o Ministério Público do...

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