Correção parcial
Autor | Júlio César Bebber |
Ocupação do Autor | Juiz do Trabalho. Doutor em Direito do Trabalho |
Páginas | 456-462 |
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Como afirma Manoel Antonio Teixeira Filho, "não há exagero em asseverar que discorrer sobre a correição parcial é, quase sempre, caminhar em terreno minado, tamanhos são os riscos de uma empreitada dessa ordem".1011
Desde já, então, explico a opção pela expressão correção parcial em vez da tradicional correição parcial. O escopo desse instrumento é corrigir. Daí: correção e não correição.
Não há na Antiguidade instituto similar à correção parcial. Algumas figuras históricas, porém, podem explicar o aparecimento e o perfil da correção parcial, como é o caso:
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da supplicatio romana e da sopricação portuguesa. Tanto no direito romano quanto no direito português (à época de D. Afonso IV), havia restrições ao direito de recorrer. Por causa dessas restrições, então, surgiram a supplicatio (em Roma) e a sopricação (também denominada querima ou querimônia - em Portugal), da qual se valiam as partes para se insurgirem contra essas limitações;1012
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do agravo de ordenação não guardada do direito português. Tratava-se de medida destinada a levar ao conhecimento dos tribunais superiores as infrações formais (não cumprimento de normas prescritas nas ordenações) cometidas pelos juízes inferiores;
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do agravo por dano irreparável do direito brasileiro. Tratava-se de medida prevista no Regulamento n. 737/1850 destinada a assegurar a regularidade do procedimento, mediante impugnação de despachos interlocutórios causadores de danos às partes.
O agravo por dano irreparável foi reproduzido em quase todos os CPCs dos Estados, na vigência da CF de 1891.
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O Decreto n. 9.623/1911, que regulamentou a organização judiciária do Distrito Federal, valeu-se, pela primeira vez, da expressão correição parcial. O CPC dessa mesma unidade da federação, então, estabeleceu a sua finalidade para corrigir "omissão e deveres atribuídos aos juízes e funcionários da Justiça, ou para emendar erros, ou abuso, contra inversão tumultuária dos atos e fórmulas da ordem legal aos processos, em prejuízo do direito das partes".
Com a CF de 1934, a competência para legislar em matéria processual passou a ser privativa da União (art. 5º, XIX, a). Sobreveio, então, o CPC de 1939. Entre os recursos nele previstos, havia a apelação, os embargos de nulidade ou infringentes do julgado, o agravo, a revista, os embargos de declaração e o extraordinário (art. 808).1013
Para a impugnação de decisões interlocutórias, havia o agravo:
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no auto do processo, destinado a impugnar as decisões que rejeitavam as exceções de litispendência e de coisa julgada; que não admitiam a prova requerida ou cerceavam, de qualquer forma, a defesa do interessado; que concediam, na pendência da lide, medidas preventivas; que consideravam (ou não) saneado o processo (CPC, 851). Esse recurso deveria ser interposto verbalmente ou por petição, dele conhecendo o tribunal, como preliminar, por ocasião do julgamento da apelação (CPC, 852);
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de instrumento, destinado a impugnar as decisões que não admitiam intervenção de terceiro na causa; que julgavam exceção de incompetência; que denegavam ou concediam medidas requeridas como preparatórias da ação; que não concediam vista para embargos de terceiros, ou que os julgavam; que denegavam ou revogavam o benefício de gratuidade; que ordenavam prisão; que nomeavam ou destituíam inventariante, tutor, curador, testamenteiro ou liquidante; que arbitravam ou deixavam de arbitrar a remuneração dos liquidantes ou a vintena dos testamenteiros; que denegavam a apelação, inclusive de terceiro prejudicado, a julgavam deserta, ou relevavam a deserção; que decidiam a respeito de erro de conta ou de cálculo; que concediam ou não a adjudicação e a remição de bens; que anulavam a arrematação, a adjudicação, ou a remissão, cujos efeitos legais já se tinham produzidos; que admitiam ou não o concurso de credores, ou ordenavam a inclusão ou exclusão de créditos; que julgavam ou não prestadas as contas; que julgavam determinados processo nominados nos títulos XV a XXII do Livro V, ou os respectivos incidentes; que negavam alimentos provisionais; que, sem caução idônea, ou independentemente de sentença anterior, autorizavam a
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entrega de dinheiro ou quaisquer outros bens, ou a alienação, hipoteca, permuta, sub-rogação ou arrendamento de bens (CPC, 842). Esse recurso não suspendia o processo (CPC, 843), ressalvados casos especiais (CPC, 843, § 2º), e deveria ser interposto por petição (CPC, 844).
Como os recursos de agravos no auto do processo e de instrumento tinham suas hipóteses de cabimento delimitadas numerus clausus (como acima apontado), muitas decisões interlocutórias, causadoras de prejuízos às partes, não comportavam insurgência. Esse ponto de estrangulamento, então, foi o móvel que propiciou a disseminação da correção parcial (preteritamente prevista no Decreto n. 9.623/1911) nos códigos de organização judiciária dos Estados e nos regimentos internos dos tribunais. Criou-se, assim, a correção parcial com vistas a permitir a impugnação de decisões legalmente irrecorríveis, mas dotadas de capacidade de causarem prejuízos irreparáveis às partes, ou causadoras de tumulto processual.
O CPC de 1973 preservou, apenas, o recurso de agravo de instrumento (CPC, 496, II), destinado à impugnação de todas as decisões interlocutórias (CPC, 522), eliminando, desse modo, o ponto de estrangulamento existente no CPC de 1939.
Não obstante isso, a correção parcial persistiu nos códigos de organização judiciária dos Estados e nos regimentos internos dos tribunais, sendo aplicável até hoje.
A correção parcial possui previsão:
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legal - no âmbito do TST (CLT, 709, II);1014
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regimental - no âmbito dos TRTs.
A correção parcial tem por escopo corrigir os atos e as omissões...
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