Cooperativismo de trabalho: uma forma de o trabalhador se organizar e ter melhores resultados a despeito da precarização do emprego

AutorAdriano Mauss
Páginas13-22

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1. Uma análise inicial sobre as tendências reformistas atuais

O ano de 2017 foi um período de extremo descompasso entre os anseios da população brasileira (que clamava por mais empregos, menor arrocho salarial e menores impostos) e as atividades governamentais (que a despeito de todo esse clamor social, aprovou, no âmbito federal, diversos instrumentos normativos que diminuem direitos sociais e trabalhistas dos trabalhadores).

No esteio das inovações aprovadas no Congresso Nacional está a nova Lei das Terceirizações (Lei n. 13.429 de
31.03.2017 que “altera dispositivos da Lei n. 6.019, de 3 de janeiro de 1974, que dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas e dá outras providências; e dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros.”) em que se busca criar um novo regime de contratações de mão de obra pelas empresas, em tese mais barata e com menor responsabilidade contratual, já que o negócio jurídico seria realizado entre duas pessoas jurídicas (uma que presta e a outra que toma o serviço). Nos livros de história do ano de 2017 também constará a aprovação da Reforma Trabalhista (Lei
n. 13.429 que entrou em vigor em 11.11.2017) que alterou substancialmente diversos aspectos da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) buscando, em suma, uma nova lógica para as relações de trabalho, em que o negociado prevalecerá sobre o legislado. Entretanto a reforma trabalhista ataca inúmeros outros aspectos do Direito Material e também Processual relativos à matéria trabalhista.

Estas duas leis são apenas alguns exemplos dos vários temas tratados durante o ano de 2017 que buscam mitigar direitos dos cidadãos por conta da necessidade de o Estado fazer frente aos seus compromissos fiscais e políticos com os mais diversos setores da sociedade.

Assim, considerando que a precarização das relações de trabalho já é um fato consumado, com a publicação dessas duas leis é necessário buscar novas formas de trabalho que minimizem seus efeitos nefastos. A nosso sentir o Cooperativismo é uma forma interessante de garantir direitos mínimos aos trabalhadores a despeito do que estabelecem os novos regulamentos.

Na sua origem, o Cooperativismo tem como característica o caráter solidário e colaborativo de seus participantes em que a lógica não é o lucro e sim a igualdade de todos. Além disso, o cooperativismo de trabalho possui um marco legal próprio que visa proteger o sistema contra as contratações indevidas entre empresas e essas entidades, além da má gestão, diminuindo a fraude contra os trabalhadores que nesse caso seriam os donos da entidade e os responsáveis pelas decisões gerenciais.

2. O marco regulatório das cooperativas de trabalho

Historicamente as Cooperativas de Trabalho eram tidas como entidades criadas para fraudar a legislação trabalhista. Com o advento da Lei n. 12.690/2012 as regras de contratação ficaram mais claras e os trabalhadores que são os sócios das cooperativas de trabalho receberam as garantias de direitos sociais constitucionalmente garantidos, parecidos com os dos empregados, ou seja, devem ser prestados a esses trabalhadores o salário mínimo, férias remuneradas, décimo terceiro salário, dentre outros, conforme o seu art. 7º, in verbis:

Art. 7º A Cooperativa de Trabalho deve garantir aos sócios os seguintes direitos, além de outros que a Assembleia Geral venha a instituir:

I – retiradas não inferiores ao piso da categoria profissional e, na ausência deste, não inferiores ao salário mínimo, calculadas de forma proporcional às horas trabalhadas ou às atividades desenvolvidas;

II – duração do trabalho normal não superior a 8 (oito) horas diárias e 44 (quarenta e quatro) horas semanais, exceto quando a atividade, por sua natureza, demandar a prestação de trabalho por meio de plantões ou escalas, facultada a compensação de horários;

III – repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos;

IV – repouso anual remunerado;

V – retirada para o trabalho noturno superior à do diurno;

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VI – adicional sobre a retirada para as atividades insalubres ou perigosas;

VII – seguro de acidente de trabalho.

O histórico de fraudadoras dos direitos trabalhistas atrapalhava a evolução dessas entidades que, como já foi mencionado, em sua essência, possuem uma natureza extremamente benéfica para o trabalhador, garantido-lhe democracia nas decisões e proteção na sua atuação profissional. Nesse sentido, a principal função da lei na época em que foi publicada foi combater as fraudes trabalhistas.

Inobstante as vantagens ao trabalhador, para o empregador a criação das cooperativas de trabalho também era vantajosa, pois na forma de cooperativa o “empregado” se tornava mais barato que o trabalho assalariado regular visto que tinha menos encargos sociais a serem pagos, o que reduzia os custos de produção e aumentava os lucros. Além disso o fato de não haver vinculação trabalhista com a empresa contratante também agradava os empresários fraudadores, havidos em evitar demandas trabalhistas.

Nesse sentido, esses empresários fraudadores criavam (e ainda criam) cooperativas de trabalho, devidamente registradas nos órgãos oficiais, faziam assembleias, elegiam representantes comprometidos com o empresário, tudo com ares de legalidade, mas no final tornavam seus empregados membros dessas organizações apenas para fraudar direitos trabalhistas, ou seja, as pessoas que antes eram empregados vinculados à empresa tomadora do serviço, agora são associados de uma entidade que presta serviço de forma exclusiva para essa empresa. Muitas dessas entidades, com o tempo, eram esquecidas, deixadas à deriva pela empresa criadora, sem qualquer suporte, quando o empresário não tivesse mais interesse em suas atividades. Muitos trabalhadores que a partir daí passam a ser sócios de uma cooperativa, não têm a mínima noção do que é uma organização assim, muito menos sua função perante a entidade, bem como quais são as suas garantias. Burlavam, assim, de uma só vez, os direitos trabalhistas, os encargos sociais decorrentes da relação empregatícia e, também, o espírito cooperativista, fundamental para o sucesso de entidades como estas.

Com relação ao ideário cooperativista a Lei n.
12.690/2012 traz em seu art. 3º uma relação dos princípios norteadores que fundam uma entidade desse ramo, sendo que o respeito a essa regra é que deve nortear a sua formação:

Art. 3º A Cooperativa de Trabalho rege-se pelos seguintes princípios e valores:

I – adesão voluntária e livre;

II – gestão democrática;

III – participação econômica dos membros;

IV – autonomia e independência;

V – educação, formação e informação;

VI – intercooperação;

VII – interesse pela comunidade;

VIII – preservação dos direitos sociais, do valor social do trabalho e da livre iniciativa;

IX – não precarização do trabalho;

X – respeito às decisões de asssembleia, observado o disposto nesta Lei;

XI – participação na gestão em todos os níveis de decisão de acordo com o previsto em lei e no Estatuto Social.

Diante dessa situação de precarização laboral gerada por meio da terceirização, é que a Lei n. 12.690/2012 em seu art. 5º proibiu que as Cooperativas de Trabalho fossem um instrumento de terceirização das atividades laborais de forma subordinada, conforme segue: “Art. 5º?

A Cooperativa de Trabalho não pode ser utilizada para intermediação de mão de obra subordinada.” Essa é uma medida extrema que visa eliminar as fraudes. Nesse sentido o art. 17, §2º da mesma lei esclarece o que é subordinação: “§2º. Presumir-se-á intermediação de mão de obra subordinada a relação contratual estabelecida entre a empresa contratante e as Cooperativas de Trabalho que não cumprirem o disposto no § 6º do art. 7º desta Lei.

A jurisprudência também é farta em julgados que verificam a existência de fraudes causadas pela contratação de cooperativas. Abaixo colacionamos um julgado do TST:

TST-1118382) RECURSO DE REVISTA. 1. COOPERATIVA. FRAUDE. VÍNCULO EMPREGATÍCIO RECONHECIDO DIRETAMENTE COM O TOMADOR DOS SERVIÇOS. Não viola a literalidade do parágrafo único do art. 442 da CLT, na redação anterior ao advento da Lei
n. 12.690/2012, a decisão regional que, com esteio na prova dos autos (art. 131 do CPC), reconhece relação de emprego entre pretenso associado e tomador de serviços da cooperativa – assim criada com intuito de burlar a legislação trabalhista -, quando, efetivamente, preenchidos os requisitos essenciais ao negócio jurídico (arts. , e da CLT). Impossibilidade de revolvimento de fatos e provas em esfera extraordinária. Inteligência da Súmula 126 do TST. Recurso de revista não conhecido. 2. REMUNERAÇÃO. JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. Seguindo a diretriz traçada nos arts. 128 e 460 do CPC, não pode o juiz prolatar decisão que extrapole os limites do pedido do autor e da resposta do réu, devendo compor a lide dentro dos estritos parâmetros estabelecidos pela litis contestatio. Assim, na hipótese vertente, não há que se falar em julgamento extra petita, uma vez que o posicionamento adotado pelo Regional considerou a alegação formulada na inicial. Recurso de revista não conhecido.
3. HORAS EXTRAS. ÔNUS DA PROVA. A evidência do enredo que leva à condenação repele o alegado maltrato às regras relativas à distribuição do ônus da prova. Recurso de revista não conhecido.

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4. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DESCABIMENTO. Na Justiça do Trabalho, os pressupostos para deferimento dos honorários advocatícios, previstos no art. 14 da Lei n. 5.584/70, são cumulativos, sendo necessário que o trabalhador esteja...

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