A Convenção n. 182 da OIT e o Compromisso do Brasil para eliminar as Piores Formas de Trabalho Infantil

AutorMaria Zuíla Lima Dutra
Páginas76-82
caPítulo 7
A Convenção n. 182 da OIT e o Compromisso
do Brasil para eliminar as Piores Formas de Trabalho Infantil
Maria Zuíla Lima Dutra(1)
(1) Mestre e Especialista em Direitos Fundamentais e das Relações Sociais. Desembargadora do Trabalho do TRT da 8ª Região. Gestora
Nacional e Coordenadora Regional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho.
1. RETROSPECTO DO TRABALHO DE CRIANÇAS
E ADOLESCENTES
Nos primórdios da humanidade, a criança não
tinha qualquer visibilidade ou proteção. Desde cedo
partilhava do trabalho dos adultos e vivia numa espé-
cie de anonimato. Para Philippe Ariès (2014, p. IX) “A
transmissão dos valores e dos conhecimentos, e de modo
geral, a socialização da criança, não eram, portanto, nem
assegurados nem controlados pela família. A criança se
afastava logo de seus pais, e pode-se dizer que durante
séculos a educação foi garantida pela aprendizagem, gra-
ças à convivência da criança ou do jovem com os adultos.
A criança aprendia as coisas que devia saber ajudando os
adultos a fazê-las”.
Segundo este autor, a primeira grande mudança
dessa prática ocorreu a partir das sociedades indus-
triais, sobretudo no fim do século XVII, quando a esco-
la substituiu a aprendizagem como forma de educação.
No final do século XIX teve início a tendência de sepa-
rar o mundo da criança do mundo dos adultos, com a
ideia de proteger a infância.
Ocorre que a desigualdade social tem contribuído
para que a criança nascida em família pobre não viva
plenamente essa fase da vida, tão necessária ao seu ple-
no desenvolvimento físico, mental, intelectual, emocio-
nal e educacional.
Neste sentido, Philippe Ariès (p. 129) defende
a possibilidade de ter havido “uma regressão duran-
te a primeira metade do século XIX, sob a influência da
demanda de mão de obra infantil na indústria têxtil. O
trabalho das crianças conservou uma característica da so-
ciedade medieval: a precocidade da passagem para a idade
adulta. Toda a complexidade da vida foi modificada pelas
diferenças do tratamento escolar da criança burguesa e da
criança do povo”.
O hábito de utilização da mão de obra precoce é
constatado ao longo da história. Por exemplo, na visão
de Marx (1994), o progresso econômico, científico e
tecnológico experimentado pela sociedade capitalista
durante a revolução industrial, e as transformações no
modo de produção favoreceram a exploração do traba-
lho humano e, por consequência, o trabalho de crianças
e adolescentes foi intensificado: “De um lado nós temos
um progresso histórico e fator de desenvolvimento econô-
mico da sociedade e, do outro, meio civilizado e refinado de
exploração”. Apesar dessa afirmativa ter sido feita ainda
no século XVIII, ela continua bem atual. Hoje convi-
vemos com a revolução tecnológica, cujo carro-chefe
continua sendo o capital, em busca de lucros cada vez
maiores.
O Brasil registra 13,1 milhões de pessoas desem-
pregadas (www.ibge.gov.br), em março 2019, o que
favorece o ingresso de crianças e adolescentes no mer-
cado de trabalho para ajudar na manutenção da família
ou somente em troca de comida, moradia e objetos de
higiene pessoal.
Diante dessa realidade, temos o propósito de ana-
lisar a efetividade da Convenção n. 182 e da Recomen-
dação n. 190, ambas da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), que tratam das piores formas de tra-
balho infantil, as quais incluem as práticas análogas à
escravidão, a exploração sexual e o recrutamento para
atividades ilícitas – como o tráfico de drogas – e os tra-
balhos que ameaçam a saúde e a segurança de crianças
e adolescentes. A educação fundamental gratuita de
qualidade e a integração social são neles incorporadas

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