Contribuições Previdenciárias na visão do TST, CNJ e do STF

AutorOcélio de Jesús C. Morais
Páginas57-81

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Após a detalhada investigação do problema das contribuições sociais do contrato de trabalho sob o enfoque normativo no sistema jurídico brasileiro, a última parte do estudo percorre os caminhos da jurisprudência nacional na visão do Tribunal Superior do Trabalho, do Conselho Nacional de Justiça e do Supremo Tribunal Federal. É imprimido especial destaque aos estudos das Súmulas ns. 288 (contribuições sociais para complementação de aposentadoria), 363 (efeitos previdenciários no contrato nulo), 368 (competência da JT e a modulação ativa ao fato gerador) do Tribunal Superior do Trabalho.

A Resolução n. 169/2013, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), quanto à retenção compulsória das contribuições sociais pelos tribunais judiciários em face de créditos das empresas prestadoras de serviços no âmbito da administração pública, é estudada na perspectiva do poder-dever-responsabilidade dos tribunais brasileiros à efetividade dos direitos trabalhistas e previdenciários dos trabalhadores terceirizados.

E a Súmula Vinculante n. 53, do STF, é objeto de percuciente exame a partir de seu precedente representativo em cotejo as normas (constitucionais e infraconstitucionais) relativas à competência da Justiça do Trabalho à execução das contribuições sociais das decisões judiciais trabalhistas, inclusive as incidentes sobre os salários do período reconhecido.

4.1. Obrigações previdenciárias no regime das súmulas NS 331 e 363 do TST

A possível situação de “limbo” trabalhista ou previdenciário do trabalhador terceirizado no regime da Lei n. 6.019/1974 — com a restrição imputação de responsabilidade da tomadora de serviços — motivou a primeira decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) em outubro de 1986, no Ac. TP 2208/1986.57

O art. 9º da CLT e esse precedente judicial fundamentaram a redação do Item I da Súmula n. 331, do TST, aprovada pela Resolução n. 121/2003 — Item ainda vigente sem alteração:

“A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei n. 6.019, de 03.01.1974)”.58

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O Item sumulado considerou o disposto no art. 9º da CLT, que trata da nulidade plena e absoluta dos atos praticados no âmbito do contrato de trabalho independentemente de sua natureza — atos cujo objetivo seja “desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”.

O art. 9º tem em conta a proteção dos direitos humanos do trabalhador, a partir da garantia de anotações na CTPS para a percepção e intangibilidade dos direitos trabalhistas e previdenciários decorrentes de qualquer tipo de contrato de trabalho, sempre na perspectiva do princípio da primazia da realidade consagrado nos arts. 442 e 443 celetistas.59

Por isso que o Item I da Súmula n. 331, ao lado do art. 9º da CLT, funcionam como espécie de freio às contratações de trabalhadores por empresa interposta, tidas ilegais e formando o vínculo empregatício com a empresa principal.

Com isso, o Item I dessa súmula, e desde que a contratação tenha sido por empresa interposta, garante aos “terceirizados” os iguais direitos inerentes aos trabalhadores da empresa tomadora de serviços.

Assim, na ocorrência da contratação irregular à prestação de serviços na Administração Pública, por empresa interposta, decorrem dois efeitos, consoante os termos do Item II da Súmula n. 33160:

O primeiro: não gera vínculo de emprego com os Órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional, visto que o regime constitucional brasileiro de 198861 — excetuado as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração — exige o concurso público para a investidura em cargo ou emprego público.

Isso significa que não se estendem os direitos estatutários e previdenciários inerentes do servidor público estatutário ao trabalhador.

O segundo: embora não gere o vínculo com o órgão da Administração Pública, são assegurados ao trabalhador terceirizado os idênticos direitos do trabalhador da empresa mãe, conforme o princípio protetivo do Item I da mesma súmula. Isso porque a relação empregatícia será reconhecida com a tomadora de serviços, eis que a contratação se dera por empresa interposta.

Uma terceira consequência (diferente da hipótese do Item V da Súmula n. 331) é a contratação irregular de trabalhador pela própria Administração Pública — contratação fora dos parâmetros do inciso II do art. 37 da CRFB de 1988.

Para casos dessa natureza, ainda que não forme vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública e, portanto, sejam inaplicáveis as garantias e direitos previdenciários do regime próprio de previdência social de que trata o art. 40 da CRFB/1988, de outro lado, assegura-se ao trabalhador o direito aos salários e aos depósitos do FGTS.

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Esses direitos estão previstos na Súmula n. 363 do TST:

“CONTRATO NULO. EFEITOS (nova redação) — Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. A contratação de servidor público, após a CF/1988, sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e § 2º, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do FGTS”.62

O TST poderia ter sido mais efetivo, na perspectiva da efetividade do princípio da proteção social previdenciária à garantia da fruição dos direitos previdenciários previstos no art. 201 e incisos da CRFB/198863, tendo ainda em conta que os direitos previdenciários são direitos humanos fundamentais, tal como configurados normativamente no art. 6º da CRFB/198864.

A imperatividade dos direitos fundamentais, por seus efeitos vinculantes e automáticos erga omnes é razão mais do que suficiente para a revisão da Súmula n. 363 do TST. Além disso, a força normativa da Constituição impõe — consoante o disposto na alínea A inciso I, art. 195 da CRFB/1988 — a obrigatoriedade dos recolhimentos das contribuições previdenciárias do período contratual declarado nulo, porque:

  1. dentre as fontes de custeio da previdência social, além da folha de salários, estão os “demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício” — contribuições que também são compulsoriamente oriundas, nos termos da Lei, dos “recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”;

  2. a contratação irregular pelo órgão da Administração Pública, quando exclui do trabalhador o direito à inclusão social previdenciária65, inegavelmente gera dano moral previdenciário66 ao trabalhador.

    Em casos dessa natureza, a Súmula n. 363 do TST poderia ter garantido o direito às contribuições sociais do período respectivo, considerando ainda:

  3. que o § 6º, art. 37 da CRFB de 1988 impõe a responsabilidade objetiva às pessoas jurídicas de direito público e às de direito privado prestadoras de serviços públicos, quando causarem danos a terceiros;

  4. que a inexistência do recolhimento das contribuições sociais do tempo de serviço real do período da contratação irregular excluirá do trabalhador a aquisição de vários direitos previdenciários previstos

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    na Lei n. 8.213/1991, específicos do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), por exemplo, os benefícios e prestações que exigem carência.

    É o caso concreto: a contratação irregular do trabalhador pelo Órgão da Administração Pública causa-lhe o dano moral previdenciário, porque o exclui da fruição dos benefícios do regime próprio de previdência social do servidor público.

    Portanto, considerando os princípios constitucionais da proteção e inclusão previdenciárias a partir das decisões trabalhistas, entendo que a revisão da Súmula n. 363 do TST é uma necessidade urgente, para adequá-la aos princípios protetivos inerentes aos direitos previdenciários decorrente das relações de trabalho e do contrato de trabalho, tendo ainda em conta que é assegurado o direito de regresso da União Federal contra o responsável pelos danos, nos casos de dolo ou culpa.

    Por certo que, nos termos do Item VI da Súmula n. 331 do TST, por uma interpretação extensiva guiada pelo princípio da condição mais benéfica ao trabalhador, nos casos de terceirização lícita no âmbito da Administração Pública, pode-se imputar a responsabilidade subsidiaria ao Órgão da Administração Pública, levando em conta que assim dispõe esse Item sumulado: “A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral”.

    Se no objeto da contratação referente ao período da prestação laboral terceirizada estiver incluído o dever ao recolhimento das contribuições sociais respectivas, o órgão público contratante (como tomador dos serviços) pode ser responsabilizado de forma subsidiária em caso de inadimplemento das obrigações trabalhistas e previdenciárias, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

    Contudo, exige-se a evidência da conduta culposa do ente da Administração Pública direta e indireta no cumprimento das obrigações da Lei n. 8.666, de 21.06.1993 para que seja cogitada a possibilidade de condenação subsidiária...

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