Os contratos de trabalho especiais

AutorPedro Proscurcin
Ocupação do AutorDoutor em Direito pela PUC/SP. Professor de Direito na FECAP/SP
Páginas156-171

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1. Contratos de trabalho especiais

Conforme afirmamos nos dois capítulos anteriores, consideramos especiais os contratos de trabalho com regras específicas e/ou com o suprimento da CLT, cujas características justificam uma regulação peculiar. A atividade humana nessa modalidade tem uma complexão própria e é influenciada pela forma ou pelo local onde se materializa.

1.1. Contrato de trabalho no domicílio

Consideramos essa modalidade de contrato de trabalho especial. O posto de trabalho está no próprio domicílio do empregado. Existem certas peculiaridades que o diferenciam do contrato normal. O empregador costuma fornecer todos os materiais e recursos logísticos para o desenvolvimento da atividade. Além do próprio local de trabalho, ou seja, a residência do trabalhador, parte dos recursos também são do empregado, por exemplo, energia, ferramentas, entre outros apetrechos de trabalho. Dependendo do tipo de trabalho, dos controles realizados, é evidente a sujeição às ordens do empregador. Ainda que a jornada seja diferenciada quanto ao horário, sempre há trabalho extraordinário, graças aos formatos da atividade. Um trabalho nessas circunstâncias está sob regime jurídico da CLT, pois sua prestação não difere daquele prestado na empresa. Merece ser transcrito o art. 6a da CLT, conforme a alteração promovida pela Lei n. 12.551 de 15 de dezembro de 2011, que dispõe: "Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado à distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego". Vale atentar para o novo alcance da norma, abrangendo também o trabalho a distância, na forma que o estudaremos na sequência.

É verdade que existem trabalhadores autónomos que trabalham em casa, como lembra Alice Monteiro de Barros139, mas esse profissional não se confunde com trabalhador a domicílio. O autónomo, como se verá no próximo Capítulo, equipara-se à empresa. Ele dirige a prestação do seu trabalho, não tem patrão e faz preço pelo serviço executado. Atualmente, é complicado falarem autónomo autêntico considerando que os informais, para ostentarem um mínimo de dignidade, se anunciam com essa denominação. De qualquer modo, é possível acharmos autónomos em sua própria casa, mas a escassez é imensa.

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Voltando ao trabalhador a domicílio, a citada autora diz que o salário desse verdadeiro empregado "é fixado por peças produzidas". Aí mora o perigo. Para conseguir ocupação, esse trabalhador poderá assumir volumes de produção com jornadas intermináveis. Infelizmente, entre nós, não existem convenções coletivas que fixam a produção do trabalho em domicílio, como ocorre na Áustria, Itália e Alemanha, conforme informa Barros140. Aqui, no Brasil, esses trabalhadores não estão organizados em sindicatos, fato que torna impossível qualquer forma de ação coletiva em defesa de direitos e conquistas sociais.

1.2. Trabalho a Distância ou Teletrabalho

Vimos no tópico anterior que, no dia 15 de dezembro de 2011, foi promulgada a Lei n. 12.551, que ratificou o trabalho a domicílio como relação de emprego e passou a dispor também sobre o "trabalho a distância", vale dizer, trabalho prestado por empregado para o empregador, executado fora da localização físico-geográfica do estabelecimento da organização empresarial.

No Brasil, o legislador preferiu utilizar a denominação trabalho à distância, embora na doutrina e mesmo na prática do interior das empresas a expressão mais utilizada fosse teletrabalho. Para permanecer coerente com a lei, utilizaremos para essa modalidade de atividade a denominação trabalho a distância. Cumpre anotar que mundo afora a modalidade leva a denominação teletrabalho: teletravail, telearbeit, telelavoro, teletrabajo, entre outras.

1.2.1. Trabalho executado fora dos limites físicos da empresa

Temos diferentes modalidades de trabalho executados fora dos limites da empresa, tais como os vendedores, entregadores, motoristas, montadores, em suma, "empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho,..." (inciso I do art. 62 da CLT). Esta norma da CLT trata de empregados cuja atividade impede o controle de jornada. Podem trabalhar com meios eletrônicos, mas não exclusivamente. Esses trabalhadores poderão estar de algum modo sob a supervisão telemática do empregador, mas a atividade não é exclusivamente por tais meios. Nessa parte, ocupar-nos-emos apenas dos trabalhadores que estão sob comando, controle e supervisão por meios telemáticos e informatizados, fora dos limites físicos do estabelecimento empresarial. Por outras palavras, cuidaremos do trabalho a distância ou teletrabalho segundo a norma trabalhista brasileira.

1.2.1.1. Trabalho por meios eletrônicos executados a distância

A citada lei alterou o art. 6a da CLT, incluindo sob sua tutela o "trabalho a distância" e, no mesmo dispositivo legal, lhe acrescentou o parágrafo único, que trata do trabalho por "meios telemáticos e informatizados", que será transcrito adiante.

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O acréscimo da expressão trabalho "realizado a distância" é uma ampliação do alcance da relação de emprego para atividades produtivas executadas pelo empregado em benefício do empregador, fora do estabelecimento empresarial, particularmente por meios "telemáticos ou informatizados" executados não necessariamente no domicílio do empregado141. A ideia que se transmite pela nova redação pode ser, por exemplo, trabalho realizado na residência do empregado, na central eletrônica da empresa ou no estabelecimento do cliente do empregador, entre outros lociais mais inusitados. Neste tópico, importa ressaltar o impacto jurídico do reconhecimento pela lei de que o trabalho a distância para um empregador, e sob o controle deste, é, efetivamente, uma relação de emprego. Vale dizer, tanto no trabalho a domicílio quanto no trabalho a distância, presentes os pressupostos da relação de emprego, estaremos diante de um vínculo empregatício.

1.2.1.2. Equiparação dos meios de controle sobre o trabalho alheio

A grande novidade está na equiparação dos meios eletrônicos de controle aos meios pessoais e diretos de comando tradicionais, conforme se vê da transcrição do parágrafo acrescentado:

"Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão 'se equiparam', para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio".

"Meios telemáticos" são aqueles que combinam eletronicamente tecnologias de computador e de comunicação, objetivando a execução de múltiplas atividades produtivas, criativas e imateriais. O novo parágrafo trata também dos "meios informatizados". Essa expressão significa o tratamento da informação com a utilização de equipamentos de comunicação celular ou eletrônicos computadorizados, cujos sistemas possibilitam acessar bancos de dados, processar, elaborar, combinar e comunicar dados com imagens (virtuais ou não) e gráficos (inclusive o sistema CAD), sons, códigos alfanuméricos, algoritmos, hipertextos, entre outros.

Os meios segundo os quais a lei se vale de forma conexa e redundante, na prática integram o chamado teletrabalho na relação de emprego. Os referidos "meios" do citado parágrafo é apropriado e coerente com o "trabalho a distância", que passou a constar do art. 6a, nos termos da transcrição acima.

Os "meios pessoais e diretos de comando, controle ou supervisão do trabalho alheio" representam as formas clássicas da prestação de serviços pelos empregados aos empregadores, desde o surgimento do trabalho subordinado de que trata o direito do trabalho.

O parágrafo único afirma que os meios informacionais aqui analisados e que se prestam ao comando, controle e supervisão do empregador para realização de

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qualquer trabalho a distância se equiparam aos meios pessoais e diretos, "para os fins de subordinação jurídica". A ideia de subordinação jurídica de que se vale a lei substitui teoricamente a real subordinação substantiva - social e económica - preexistentes nas relações de trabalho convencionais. Neste sentido, a nova norma sobre o trabalho por meios telemáticos passa a atender à antiga reivindicação relativa ao reconhecimento do vínculo de emprego da categoria dos chamados teletrabalhadores ou trabalhadores a distância.

A partir da Lei n. 12.551, o trabalho por meios telemáticos e informacionais a distância, presentes o comando, controle ou a supervisão são formas organizadas de prestação de trabalho com vínculo empregatício simples, tuteladas pelo art. 6a e seu parágrafo, alterando o...

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