Contratação Coletiva

AutorJosé Claudio Monteiro de Brito Filho
Ocupação do AutorDoutor em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Páginas165-213

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Dentro de sua finalidade básica, coordenar e defender interesses profissionais e económicos, as entidades sindicais apresentam-se como formuladoras de normas jurídicas que versam, principalmente, sobre condições de trabalho.

Isto é feito por intermédio dos contratos coletivos de trabalho, que constituem, no Brasil, fonte formal do Direito do Trabalho e do Direito Sindical, como visto no capítulo 1, item 61.

A admissão de outras fontes formais do Direito, que não a lei, entretanto, não é fenómeno que ocorra apenas no Brasil.

No plano internacional, esta é uma realidade, sendo a contratação coletiva estimulada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Verifique-se, por exemplo, a Convenção n. 98 que, em seu art. 4e, prescreve:

"Deberán adoptarse medidas adecuadas a Ias condiciones nacionales, cuando ello sea necesario, para estimular y fomentar entre los empleadores y Ias organizaciones de empleadores, por una parte, y Ias organizaciones de trabajadores, por outra, el pleno desarollo y uso de procedimientos de negociación voluntária, con objeto de reglamentar, por médio de contratos colectivos, Ias condiciones de empleo."2

A contratação coletiva é, também, prática generalizada nos países, podendo ser citados, somente a título de exemplo, Itália, Espanha, Portugal, Estados Unidos, entre os inúmeros que a admitem.

O Brasil não é exceção. As convenções e os acordos coletivos de trabalho são expressamente garantidos pela Constituição Federal de 1988, que preceitua:

"Art. 7e São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXVI — reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho."

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Isto, entretanto, no setor privado, nos termos dos arts. 611 a 625 da Consolidação das Leis do Trabalho (Título VI).

É que, no setor público, em razão do princípio da legalidade, previsto no art. 37, caput, do texto constitucional, resta impossível a fixação de condições de trabalho ou outras, por meio de norma convencional, como veremos no último item deste capítulo.

Nosso objetivo, aqui, é verificar a contratação coletiva, em relação a alguns aspectos básicos.

7.1. Denominação

Não existe uniformidade a respeito da denominação dada a esta fonte formal do Direito do Trabalho e do Direito Sindical, resultante do consenso entre trabalhadores e empregadores e que importa, principalmente, na criação de condições de trabalho.

Alfredo J. Ruprecht, depois de afirmar que "A terminologia ainda não atingiu fixidez nessa matéria, razão pela qual convém nos determos em seu estudo. Basta ler os livros que têm sido escritos sobre o particular para se dar conta da diversidade de denominações que tem tido e tem em sua breve existência", relaciona as seguintes denominações: contrato coletivo de trabalho; contrato de tarifa; convenção coletiva normativa; convenção coletiva de trabalho; pacto coletivo; convenção cole- tiva de condição de trabalho; regulamentação sindical; convenção coletiva sindical; concordata intersindical; contrato sindical de trabalho; regulamento intersindical de serviços profissionais; tratado intersindical; concordata de trabalho e regulamento corporativo3

O Brasil já adotou mais de uma denominação. Segundo Octavio Bueno Magano, a denominação convenção foi adotada na Constituição de 1934, mudando para contrato coletivo, na de 1937, por se inspirar no modelo fascista italiano. A denominação foi alterada, com a Constituição de 1946, novamente para convenção4

Atualmente, as denominações utilizadas são convenção coletiva de trabalho e acordo coletivo de trabalho5

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A denominação convenção coletiva é, também, a utilizada em Portugal, conforme se verifica com António Menezes Cordeiro6, e na Argentina, de acordo com Ernesto Krotoschin7. Na Espanha, a denominação é convénio coletivo, segundo António Ojeda Avilés8 e Carlos Molero Manglano9. Na Itália, por outro lado, a denominação utilizada é contrato coletivo (contratto colettivo, em italiano), como se observa em Gino Giugni10 e em Luisa Galantino11, a mesma usada pela Organização Internacional do Trabalho na Recomendação n. 91.

Octavio Bueno Magano, tratando do contrato coletivo de trabalho12, afirma não ser esta a melhor denominação, demonstrando sua opção por convenção e explicando que tudo indica que a Constituição de 1934 acolheu este termo (convenção) pela ideia de que tal ajuste não vincula pessoas determinadas, sendo suas cláusulas normativas "genéricas e indeterminadas, vale dizer, desprovidas de caráter vinculativo imediato". Entende o autor que, mesmo com o contrato coletivo sendo concebido como ajuste para fixar condições de trabalho para múltiplos setores da economia, não deveria receber esta denominação, mas sim a que entende correta: convenção13

Segadas Vianna, referindo-se a esta discussão sobre a denominação correta, não vê razões para a distinção, afirmando que, embora a denominação convenção tenha obtido reconhecimento universal graças à doutrina e à lei francesas, tanto contrato como convenção são vocábulos usados pelo legislador francês14

Carlos Moreira de Luca, depois de observar a necessidade de a linguagem jurídica usar termos unívocos e precisos, afirma:

"Reconhecendo a sinonímia fundamental entre as expressões contrato coletivo e convenção coletiva, usamos às vezes (à vista do nosso Direito Positivo) a primeira delas num sentido genérico, compreendendo as convenções e os acordos coletivos; e a última na acepção que lhe empresta a lei brasileira. Tal critério é meramente de ordem prática e quando o adotamos é porque entendemos que tais expressões, consagradas entre nós, permitem a perfeita identificação do instituto, não havendo dúvidas quanto ao seu sentido."15

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É como procedemos, por acreditarmos que: 1. nao existe imprecisão, no caso dos ajustes coletivos que fixam condições de trabalho, em tratar contrato e convenção como sinónimos, e 2. por ser mais prático, principalmente do ponto de vista didático, situar contrato coletivo como género e a convenção como uma de suas espécies, sendo a outra, no caso brasileiro, o acordo coletivo de trabalho16

7.2. Definição

Diversas são as formas de definir o ajuste firmado, no plano coletivo, entre empregados e empregadores.

A Organização Internacional do Trabalho, através da Recomendação n. 91 (Reco-mendación sobre los contratos colectivos), de 1951, define "contrato colectivo" como: "todo acuerdo escrito relativo a Ias condiciones de trabajo y de empleo, celebrado entre un empleador, un grupo de empleadores o una o varias organizaciones de empleadores, por una parte, y, por outra, una o varias organizaciones representativas de trabajadores o, en ausência de tales organizaciones, representantes de los trabajadores interesados, debidamente elegidos y autorizados por estos últimos, de acuerdo con Ia legislación nacional."17

A definição da OIT, observa-se, está calcada na indicação de ser o "contrato coletivo" negócio jurídico bilateral (acordo), entre representantes do capital e do tra-balho, com o objetivo de regular condições de trabalho. A respeito dela, é importante verificar o posicionamento assumido pela OIT a respeito dos sindicatos que, para ela, devem ser os responsáveis pela contratação, salvo em sua ausência.

Ela é criticada por Octavio Bueno Magano, que a define como tautológica, optando por conceituar de forma sintética e não analítica a convenção coletiva de trabalho, o que faz da seguinte forma: "Convenção coletiva é o negócio jurídico através do qual sindicatos estipulam condições de trabalho", observando que ela indica o género próximo a que pertence o objeto definido18

A Consolidação das Leis do Trabalho, por outro lado, no art. 611, caput, define convenção coletiva de trabalho como: "acordo de caráter normativo, pelo qual dois ou mais Sindicatos representativos de categorias económicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais de trabalho."

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Ela, segundo Amauri Mascara Nascimento, permite verificar os principais aspectos da convenção, abrangendo sua natureza jurídica, revela os sujeitos legitimados e demonstra o âmbito de aplicação das cláusulas estipuladas19

É importante salientar que, enquanto a definição da OIT é genérica, com a pretensão de abarcar toda uma série de situações e hipóteses que podem ocorrer, em relação aos contratantes, em estipulação coletiva de condições de trabalho, a da CLT é mais específica, por tratar, apenas, da hipótese de a contratação ocorrer entre sindicatos.

É que, como visto no item anterior, existe mais de um ajuste coletivo de condições de trabalho no setor privado brasileiro.

Ao lado da convenção coletiva de trabalho, existe o acordo coletivo de trabalho, previsto no mesmo art. 611, § 1e, que se diferencia da primeira por ser firmado entre sindicato(s) profissional(is) e empresa(s), ou seja, como afirma Segadas Vianna, "não são pactos intersindicais, mas acordos em que há, de um lado, um sindicato e, do outro, uma ou mais empresas da correspondente categoria económica e sua aplicação será no âmbito da empresa ou das empresas acordantes"20

Carlos Moreira de Luca, tratando do contrato coletivo de trabalho italiano, após afirmar que não são muitos os autores que formulam um conceito próprio, apega-se ao entendimento de Gino Giugni a respeito de sua função e o define como "negócio jurídico através do qual sindicatos ou outros sujeitos devidamente legitimados com-põem conflitos de interesses e de direitos entre grupos profissionais que compreendam empregados e empregadores"21

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