Contornar e contorcer(-se): contorcionismos na objetificação das mulheres em contexto político pelos média portugueses

AutorSara Moreira - Sara I. Magalhães - Conceição Nogueira
CargoFaculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto - Centro de Psicologia da Universidade do Porto - Centro de Psicologia da Universidade do Porto
Páginas172-192
Periódico do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Gênero e Direito
Centro de Ciências Jurídicas - Universidade Federal da Paraíba
V. 6 - Nº 01 - Ano 2017 Mídia, Gênero & Direitos Humanos
ISSN | 2179-7137 | http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/ged/index
172
CONTORNAR E CONTORCER(-SE)i:
CONTORCIONISMOS NA OBJETIFICAÇÃO DAS MULHERES EM
CONTEXTO POLÍTICO PELOS MÉDIA PORTUGUESES
Sara Moreira
Faculdade de Psicologia e Ciências da Educa ção da Universidade do Porto. Email:
moreirasa ra10@gmail.com
Sara I. Magalhães
Centro de Psicologia da Universidade do Porto (CP UP). Email: saraisabelmagalhaes@gmail.com
Conceição Nogueira
Centro de Psicologia da Universidade do Porto (CPUP). Email: cnogueira@fpce.up.pt
Resumo: O presente artigo visa
compreender e analisar as representações
mediáticas das mulheres que exercem
cargos políticos, auscultando os
mecanismos de objetificação acionados
pelos média informativos neste processo.
Neste sentido, realizou-se um estudo
qualitativo, de cariz exploratório, com
recurso à análise temática, a partir de
notícias publicadas no semanário
Expresso, no período compreendido entre
julho e dezembro de 2014. Os resultados
mostram que prevalecem representações
genderizadas, essencialistas e pouco
inclusivas, sendo que a despersonalização
surgiu como o mecanismo mais recorrente
de objetificação das mulheres que exercem
cargos políticos. Enquanto importantes
agentes de socialização, os média
informativos tendem, pois, a contribuir
para a manutenção da ordem social
(androcêntrica) e a cristalização das
desigualdades de género.
Palavras-chave: Género. Objetificação.
Despersonalização. Média informativos.
Política.
Abstract: This paper aims to understand
and analyze media representations of
women politicians by exploring the
objectification mechanisms activated by
news media. In this sense, we conducted a
qualitative study, using a thematic
analysis, drawing on the news published
on the weekly journal Expresso between
July and December 2014. Our findings
showed that gendered, essentialist and not
very inclusive representations prevail in
the media, while depersonalization was the
most common mechanism of
objectification of women politicians. As
they are important socialization agents,
news media tend therefore to contribute to
Periódico do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Gênero e Direito
Centro de Ciências Jurídicas - Universidade Federal da Paraíba
V. 6 - Nº 01 - Ano 2017 Mídia, Gênero & Direitos Humanos
ISSN | 2179-7137 | http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/ged/index
173
the maintenance of an (androcentric)
social order and to the crystallization of
gender inequality.
Keywords: Gender. Objectification.
Depersonalization. News media. Politics.
Introdução
Nas últimas décadas, vários
estudos têm chamado a atenção para o
poder que os média (informativos)
adquirem nas sociedades contemporâneas,
sobretudo através da construção de
discursos, representações e práticas (e.g.,
Croteau e Hoynes, 2014). Gill (2007:113)
refere que “the critical examination of
news has been a central concern of media
studies for decades, but it is only relatively
recent that this interest has involved a
sustained focus upon gender”. Em
Portugal, apesar de o estudo das
representações de género não ser recente
nas ciências da comunicação (e.g.,
Álvares, 2007; Cerqueira, 2012;
Silveirinha, 2004), a reflexão crítica sobre
o modo como as mulheres com cargos
políticos surgem na imprensa é ainda
residual (e.g., Cabrera, Flores e Mata,
2012; Martins, 2015; Santos, Cabecinhas e
Cerqueira, 2015a), o que é particularmente
preocupante quando se considera o papel
dos média informativos na (re)construção
do género (van Zoonen, 1994), na
veiculação de informação de cariz político
(Ross, 2003) e na (re)configuração do
espaço público (Croteau e Hoynes, 2014).
No contexto nacional, a Lei da
Paridade (Lei Orgânica nº. 3/2006)
estabelece uma representação mínima de
33% de cada um dos sexos na composição
das listas para a Assembleia da República
Portuguesa, o Parlamento Europeu e as
Autárquicas Locais, bem como estipula
que as listas não podem incluir, de forma
consecutiva, mais de duas/dois
candidatas/os do mesmo sexo. Porém, nem
sempre uma maior participação das
mulheres na política corresponde a uma
mudança nas representações mediáticas: a
investigação feminista tem, justamente,
demonstrado que os média informativos
tendem a apoiar uma mediação de género
na cobertura de assuntos políticos
(Sreberny-Mohammadi e Ross, 1996) que
contribui, em última instância, para a
manutenção de assimetrias sociais
(Gallego, 2009).
De acordo com inúmeros estudos
internacionais (e.g., Heflick e Goldenberg,
2010; Heldman e Wade, 2011), as
mulheres (políticas) podem ver ser-lhes
retirado poder através do processo de
objetificação (Nussbaum, 1995). Ainda
que reconheçamos as diferentes formas de
conceptualizar este conceito, partimos dos

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT