A constitucionalização dos direitos sociais

AutorJames Magno Araújo Farias
Ocupação do AutorDesembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região/MA; Presidente (2016/2017); Corregedor Regional (2014/2015)
Páginas26-31

Page 26

A presença do Estado sempre foi importante no desenvolvimento histórico da regulação do trabalho; embora a Mesopotâmia de 3.700 a.C. seja o primeiro estado formalmente reconhecido, o melhor conceito de Estado só apareceu efetivamente em 1513, com a obra O Príncipe, de Maquiavel,

Page 27

que reformulou o conceito essencial da polis grega e afirmou que "todos os Estados, os domínios todos que existiram e existem sobre os homens, foram e são repúblicas ou principados".19

Muito antes, porém, Aristóteles já dizia que a Constituição tinha por finalidade ordenar os poderes da Cidade, sendo que era sobre a organização do poder governamental que o filósofo grego já estava tratando, defendendo a política como forma de ação realizada pela razão, tendo como fim o bem da comunidade ou o bem comum.20

Inobstante, com a outorga da Magna Carta, em 1215, na Inglaterra, tem-se o primeiro marco na ideia de Constituição. Ironicamente, a referida Carta, que nem chega a ser formalmente uma constituição, foi imposta à realeza pela nobreza descontente com o governo despótico do Rei João (antes, "Sem Terra"), que não estava se aconselhando previamente com os nobres acerca do estabelecimento de impostos, como era o costume então; além de governar despoticamente, o Rei entrou em conflito com a nobreza.

Para pôr fim ao litígio, uma comissão redigiu a declaração dos direitos da nobreza, sob a liderança do arcebispo Stephen Langton.

Embora aceita a contragosto pelo monarca, a Magna Carta previa não apenas os direitos dos nobres, mas também dos súditos ingleses. Além de garantir a independência parlamentar para legislar sobre impostos e orçamentos, semeou também a ideia de direito à liberdade e garantia do acesso à justiça para dirimir os conflitos, com julgamento regular em harmonia com a lei da terra, no item 39 da declaração. No art. 40 consta a famosa frase "a ninguém venderemos, a ninguém recusaremos ou atrasaremos, direito ou justiça".21

Os princípios da Magna Carta foram confirmados posteriormente, ajudando a sedimentar o constitucionalismo inglês, com o advento de outros marcos históricos. A Petição de Direitos (Petition of Rights), durante o reinado do Rei Charles I, em 1628, afirmou o comando de que o rei não deveria criar tributos sem o consentimento do parlamento 22. O Instrumento de Governo, durante o governo quase republicano do Lorde Protetor Oliver Cromwell, em 1652, afirmou maiores poderes do Parlamento.

O Habeas Corpus Amendment Act, de 1679, durante o reinado de Charles II, garantiu liberdades aos cidadãos contra atos arbitrários. A Declaração de Direitos

Page 28

(Bill of Rights23), de 1689, foi elaborada pelo Parlamento após o fim da Revolução Gloriosa, tendo sido aceita por Guilherme III de Orange e sua esposa Maria Stuart II, antes de assumir seu reinado conjunto.24

Considera-se que a Inglaterra transitou rapidamente do modelo estamental para o Estado constitucional, mesmo com o célebre reinado absolutista e iconoclasta de Henrique VIII; esse processo foi acelerado pelas metamorfoses políticas ocorridas após a Guerra Civil de 1648 e a Revolução Gloriosa de 1688.25

Entretanto, observando-se a história ocidental, percebe-se que a evolução dos ordenamentos constitucionais foi muito lenta desde a edição da Magna Carta até o convulsionado século XVIII. Com a queda da Bastilha, iniciou-se a superação do modelo do despotismo esclarecido, marcado pela transição do absolutismo mais arraigado para uma forma mais limitada de governar, a exemplo de Frederico II da Prússia, Catarina da Rússia ou do primeiro-ministro Marquês de Pombal, em Portugal, ocasionando o posterior advento de governos republicanos ou monarquias constitucionais, calcados no liberalismo e na obediência, dentro do possível, aos ditames da Constituição.

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, símbolo da França revolucionária de 1789, inseriu os direitos do indivíduo dentro da ordem estatal. Antes dela, é certo, não se pode esquecer que já havia ocorrido a adoção de normas de caráter constitucional pelas antigas Treze Colônias Americanas, desde a vanguardista Carta da Virgínia, de 1776, após a Guerra de Independência.

A Revolução Americana quis conceder aos ex-colonos os mesmos direitos dos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT