Controle de Constitucionalidade e Ação Civil Pública

AutorAna Lúcia Porcionato
CargoMestranda pela Universidade de Ribeirão Preto - UNAERP
Introdução

A supremacia das normas constitucionais1 perante as demais normas do ordenamento jurídico significa que as normas infraconstitucionais devem guardar entre si uma relação de compatibilidade, ou seja, os conteúdos destas não devem violar no todo ou em parte a Constituição Federal.

Sendo assim, a própria Carta Magna para assegurar a inviolabilidade de seus preceitos normativos, prescreve o controle de constitucionalidade ou controle de validade da ordem jurídica.

Da falta de consonância do conteúdo de lei ou ato normativo com a Constituição Federal, ocorre a Inconstitucionalidade.

O presente trabalho tem como finalidade mostrar as formas de coibir a inconstitucionalidade das leis ou ato normativo, além de relacionar tal instituto com a ação civil pública.

1. A Inconstitucionalidade

Ocorre a inconstitucionalidade quando há conflito entre normas que constam de um mesmo sistema jurídico com a Constituição, sendo que este sistema não se conforma com tais incompatibilidades. Portanto, esse conceito de inconstitucionalidade tem como referência a Constituição, em relação de conformidade com todo o ordenamento jurídico, e com a ação ou omissão estatal, de qualquer outra pessoa.

Ensina Jorge de Miranda: “Não é inconstitucional toda e qualquer desconformidade com a Constituição, visto que também os particulares ao agirem na sua vida cotidiana podem contradizer ou infringir a Constituição ou os valores nela inseridos. Não é inconstitucionalidade a violação de direitos, liberdades e garantias por entidades privadas (...), e nem sequer a ofensa de normas constitucionais por cidadãos em relações jurídico-públicas. Logo o ato inconstitucional está vinculado ao poder público, pois com relação aos particulares, como já foi dito, não há ato inconstitucional que possa ser censurado pelos tribunais”2

Regina Maria Macedo Nery Ferrari esclarece sobre a inconstitucionalidade lembrando que “concerne à supremacia constitucional, isto é, ao fato de que a Constituição é a lei fundamental da ordem jurídica, ou, ainda, para que uma norma seja válida necessita buscar sua validade na norma superior – de tal forma que sistematicamente escalonada em um ordenamento jurídico, a sua unidade reduz-se à confirmação de todo o ordenamento jurídico à lei fundamental, que, considere como a de maior escalão, é orientadora da produção de todas as demais normas inferiores, que buscam validade nas normas superiores.”3

As normas que compõem o sistema jurídico nacional “só serão válidas se conformarem com as normas da Constituição Federal4, tal argumento é válido, pois em nosso sistema vigora a supremacia da Constituição5.

A garantia da constitucionalidade visa obter como finalidade última a subordinação à Constituição de leis e atos normativos dos órgãos públicos, que é, em verdade, a expressão da supremacia da Constituição. Essa supremacia traduz hierarquia entre as normas jurídicas.

Celso Ribeiro Bastos entende que “desde as simples normas contratuais, estabelecidas entre particulares, até a Constituição Nacional, forma-se, desta maneira, uma autêntica pirâmide jurídica, na qual a juridicidade de cada norma é haurida da juridicidade da norma que a suspende”6.

O controle de Constitucionalidade é o meio para atingir este fim, ou seja, garantir a supremacia da Constituição, prevalecendo como parâmetro de controle de todo o conteúdo constante da Constituição Federal.

2. Controle de Constitucionalidade

As garantias de realização da Constituição, com as devidas sanções pelo descumprimento ou violação, existem para que haja obediência aos pressupostos constitucionais, gerando, portanto, tais garantias, a estabilidade, observância e conservação das normas constitucionais7.

2.1. Conceito

Toda lei ou ato normativo deve estar de acordo com a Constituição Federal, a verificação de estar ou não conforme às normas constitucionais é o que se denomina de controle de constitucionalidade. Trata-se de um sistema de defesa da Constituição a fim de retirar do ordenamento jurídico tudo o que possa vir contaminá-lo.

Haverá inconstitucionalidade material quando o conteúdo do projeto de lei ou do ato normativo não estiver de acordo com o que determina a Constituição, tal conteúdo deve ser fundado sobre valores consagrados no texto constitucional, pois esta “representa um momento de redefinição das relações políticas e sociais desenvolvidas no seio de determinada formação social”8

Já a inconstitucionalidade formal ocorre quando houver desobediência a procedimento legislativo estabelecido pela Constituição, não acerca do conteúdo.

Jorge Miranda conceitua a constitucionalidade e inconstitucionalidade como:

Conceitos de relação: a relação que estabelece entre uma coisa – A Constituição – e outra coisa – um comportamento – lhe está ou não conforme, que com ela é ou não compatível, que cabe ou não sentido. Não se trata porém, de relação de mero caráter lógico normativo e valorativo, embora implique sempre um momento de conhecimento. Não estão em causa simplesmente a adequação de uma realidade, ou a descorrespondência entre este e aquele acto, mas o cumprimento ou não de certa norma jurídica9.

Já Merlin Cléve descreve a inconstitucionalidade de maneira mais sintética: é a desconformidade do ato normativo (inconstitucionalidade material) ou do seu processo de elaboração (inconstitucionalidade formal) com algum preceito ou princípio constitucional”10

2.2. Espécies de Controle de Constitucionalidade

O controle de constitucionalidade pode ser efetuado enquanto projeto de lei (controle preventivo), ou quando a lei já faz parte do ordenamento jurídico (controle repressivo). O controle preventivo ocorre quando há necessidade de evitar que norma maculada por vício de inconstitucionalidade ingresse no ordenamento jurídico. Esse controle ocorre por meio de comissões de constituição e justiça, que possuem a função de analisar se há compatibilidade com a Constituição, projeto de lei ou proposta de emenda. Há controle preventivo também por meio do veto (ato político), emanado pelo chefe do Poder Executivo.

No direito constitucional brasileiro, em regra, foi adotado o controle de constitucionalidade repressivo jurídico, em que é o próprio Poder Judiciário quem realiza o controle da lei ou do ato normativo, já editados, perante a Constituição Federal, para retirá-los do ordenamento jurídico, desde que contrários à Carta Magna11. Há dois sistemas ou métodos de controle Judiciário de Constitucionalidade : 1) sistema aberto ou difuso, onde existindo um caso concreto e através da alegação incidental de uma das partes, qualquer órgão do poder judiciário estará apto a apreciar a inconstitucionalidade de uma lei e, 2) o sistema concentrado ou reservado, o qual “concentra” a apreciação de inconstitucionalidade ao Supremo Tribunal Federal, ou ao Tribunal de Justiça, dependendo da matéria12.

Excepcionalmente, porém, a Constituição Federal previu duas hipóteses em que o controle de constitucionalidade repressivo será realizado pelo próprio Poder Legislativo. Em ambas as hipóteses, o Poder Legislativo poderá “retirar” normas editadas, com plena vigência e eficácia, do ordenamento jurídico, que deixarão de produzir seus efeitos, por apresentarem um vício de inconstitucionalidade.

Vejamos as exceções:

2.2. 1 Controle Repressivo Realizado Pelo Poder Legislativo
3.2.1. 1 Pela Sustação dos Efeitos De Lei Delegada Via Decreto Legislativo

A primeira hipótese é regida pelo inciso V do artigo 49 da Constituição Federal, o qual prevê competir ao Congresso Nacional sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa13. “Sempre que o Presidente da República extrapolar os limites fixados na resolução, concedente da lei delegada, o Congresso nacional poderá sustá-la via decreto legislativo, paralisando todos os seus efeitos”14 (Destaque nosso).

Neste caso, o ato que susta a lei delegada logra eficácia “ex nunc”, pois não produz efeitos retroativos, operando-se a partir da publicação do decreto legislativo. Equivale dizer, na espécie, não será declarada de nulidade da lei delegada, mas simples sustação de seus efeitos.

Vale esclarecer, que este dispositivo (art. 49, V, Constituição Federal) consagra uma espécie de controle legislativo que não suplanta a declaração de inconstitucionalidade pelo Poder Judiciário. Assim, havendo violação dos requisitos formais do artigo 68 da Constituição Federal15, tal declaração poderá ser acionada. Nessa hipótese o ato de sustação produzirá efeitos “ex tunc”, isto é, desde a edição da espécie normativa, desempenhando efeitos retroativos.

2.2.1.2. Pela Apreciação das Medidas Provisórias

Uma vez editada a Medida Provisória pelo Presidente da República, nos termos do artigo 62 da Constituição Federal16, ela terá vigência e eficácia imediata, e força de lei, pelo prazo de 60(sessenta) dias, devendo ser submetida de imediato ao Congresso Nacional, que poderá aprová-la, convertendo-a em lei, ou rejeitá-la.

Preleciona Alexandre de Moraes: “Na hipótese de o Congresso Nacional rejeitar a medida provisória, com base...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT