Constitucional

Páginas227-230
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REVISTA BONIJURIS I ANO 30 I EDIÇÃO 654 I OUT/NOV 2018
ACÓRDÃOS EM DESTAQUE
tima da posse, conf‌igura-se a tradição,
de modo que o risco pela perda do nu-
merário deixa de ser do devedor, por-
que cessada sua disponibilidade sobre
o bem, e passa a ser do credor que o
detém.
Nessa linha, convém destacar o pre-
ciso ensinamento de Orlando Gomes:
Da qualif‌icação da obrigação pecu-
niária como dívida de soma de valor
resultam duas importantes consequ-
ências: a) o risco de sua perda não se
transmite ao credor quando o devedor
envia o dinheiro; b) se a espécie mone-
tária desaparecer da circulação, o de-
vedor não se libera, pois f‌ica obrigado
a pagar em outra espécie em que seja
convertida. (Op cit. p. 57).
Trata-se, pois, de regra extraída do
princípio de que “a coisa perece para o
dono” (res perit domino), tido por dono,
com relação ao bem móvel fungível di-
nheiro, aquele que detém, licitamente,
a sua posse.
É dizer, depois de transmitida a pos-
se do dinheiro, arcará o vendedor com
o prejuízo de sua perda.
Todavia, no particular, não se sabe,
ao certo, qual o montante entregue aos
recorridos, tendo em vista que o di-
nheiro foi deles subtraído por terceiro
antes de efetivada sua conferência.
A controvérsia, então, reside, não
no campo da tradição, mas no campo
do adimplemento, uma vez que a con-
tagem do dinheiro recebido é ato vin-
culado à quitação da dívida, pela qual
o credor atesta o pagamento, exoneran-
do o devedor.
6. Da quitação da dívida
Pelo contexto delineado no acór-
dão recorrido, há de ser aplicada, no
particular, a regra do tudo ou nada:
ou se reconhece o inadimplemento do
recorrente ou se declara a quitação da
dívida.
Ora, se o adimplemento é o exato
cumprimento da prestação assumida,
a quitação total, na hipótese, pressu-
punha o pagamento, pelo recorrido, da
quantia de R$ 150.000,00 em dinheiro.
Incontestavelmente, houve a en-
trega de dinheiro pelo recorrente aos
recorridos. No entanto, a indef‌inição
quanto ao valor efetivamente recebido
por estes impede se af‌irme, com segu-
rança, que houve o pagamento direto
(stricto sensu) ou o adimplemento da
obrigação assumida por aquele.
Nada obstante, como dito, no mo-
mento em que a quantia foi entregue
pelo recorrente quando e onde pactua-
do entre as partes – tanto que o dinhei-
ro foi recebido, sem qualquer oposição,
pelos recorridos, que se encontravam,
no instante do roubo, contando as cé-
dulas – assumiram estes o risco da per-
da, ainda que em virtude de caso fortui-
to ou força maior.
Isso, por si só, é suf‌iciente para que
se rejeite a pretensão deduzida pelos re-
corridos na ação monitória, de receber
o valor integral da parcela, acrescida de
multa contratual, pois é incontroverso
que pelo menos uma parte da dívida foi
paga no tempo e lugar acordados.
Aliás, chama a atenção o fato de não
terem os recorridos sequer menciona-
do, em sua petição inicial, a ocorrência
do roubo, tampouco declarado a quan-
tia efetivamente conferida por eles até
aquele momento, a f‌im de contradizer a
af‌irmação do recorrente de que entre -
gou os R$ 150.000,00.
Veja que o valor comprovadamente
recebido pelos recorridos não é objeto
de discussão nos autos.
Dessarte, se os recorridos aceitaram
receber o pagamento de vultosa quan-
tia em dinheiro, nas dependências de
sua imobiliária, apostaram na seguran-
ça da operação, de tal modo que, dian-
te da incerteza do valor perdido, mas
da certeza de que houve a entrega de
quantia para os recorridos, o f‌iel da ba-
lança deve pender para a conf‌irmação
do pagamento e, portanto, para que se
declare a quitação da referida parcela,
nos termos do art. 319 do CC⁄02.
Quitada a dívida, há de ser outorga-
da, em favor do recorrente, a escritura
def‌initiva do imóvel, bem como reali-
zado o pagamento do aluguel acertado
entre as partes, devido desde a quita-
ção.
7. Da divergência jurisprudencial
Em virtude do exame do mérito, por
meio do qual foi acolhida a tese susten-
tada pelo recorrente, f‌ica prejudicada a
análise da divergência jurisprudencial.
Forte nessas razões, conheço em
parte do recurso especial e, nessa ex-
tensão, dou-lhe provimento para julgar
improcedente a ação monitória e julgar
procedentes os pedidos deduzidos pelo
recorrente na ação por ele ajuizada.
Inverte-se a sucumbência, mantido
o valor dos honorários estabelecido na
sentença.
CERTIDÃO
Certif‌ico que a egrégia terceira tur-
ma, ao apreciar o processo em epígrafe
na sessão realizada nesta data, proferiu
a seguinte decisão:
A Terceira Turma, por unanimida-
de, conheceu em parte do recurso espe-
cial e, nesta parte, deu-lhe provimento,
nos termos do voto da Sra. Ministra
Relatora.
Os Srs. Ministros Paulo de Tarso
Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cue-
va, Marco Aurélio Bellizze (Presidente)
e Moura Ribeiro votaram com a Sra.
Ministra Relatora. n
654.203 Constitucional
COMPATIBILIDADE PENAL
Figura penal do desacato é compatível com a
Convenção Americana de Direitos Humanos
Supremo Tribunal Federal
Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo n. 1.049.152/DF
Órgão Julgador: 2a. Turma
Fonte: DJ, 28.05.2018
Relator: Ministro Dias Tof‌foli
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