Exercício da cidadania e institutos consagradores da soberania popular: abordagem dos empecilhos existentes no ordenamento brasileiro

AutorMaureen Cristina Sansana
CargoAdvogada/PR
Páginas20-23

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1. Introdução

Almeja-se por meio desta pesquisa adentrar em temas que envolvem o exercício da cidadania e como a democracia semidireta permite que os cidadãos sejam atuantes.

Esclarece-se, desde já, que é cidadão quem realiza o alistamento eleitoral, ou seja, a prova da cidadania se perfaz por meio da apresentação do título de eleitor (art. 1 ° §3° daLei n° 4.717/65).

No que tange à atuação direta desses cidadãos, percebe-se que a Constituição da República prevê institutos que concretizam a soberania popular, são eles: plebiscito, referendo e iniciativa popular.

Ocorre que mesmo diante da previsão de tais institutos, apenas extraordinariamente observa-se a sua adoção; o porquê da presente situação pode ser encontrado no próprio ordenamento, quando este ao invés de promover, cerceia sua utilização.

As consultas populares e a iniciativa popular para dar propulsão ao processo legislativo não devem ser encaradas como exceção; se talvez os meios concedidos pela Constituição sejam complexos e pesarosos, o ideal seria que os representantes eleitos cumprissem seus papéis de atender os reais anseios dos cidadãos.

Não se está aqui defendendo a banalização de tais institutos, como se para cada questiúncula fosse promovido um plebiscito; cada ato normativo dependesse de ratificação por meio de um referendo, ou ainda que houvesse uma enxurrada de projetos de iniciativa dos eleitores; defende-se sim que para a efetivação desses instrumentos não seja necessária uma atuação árdua, mas, sim, ao menos, realizável.

De fato, a democracia é sobretudo um caminho: o da progressão para a liberdade (KELSEN, 1929, p. 3-13), apresentando-se, pois, (DURKHEIM, 1983, p. 81):

Como a forma política pela qual a sociedade chega à mais pura consciência de si mesma. Um povo é tanto mais democrático quanto mais considerável é o papel desempenhado, na marcha dos negócios públicos, pela deliberação, pela reflexão, pelo espírito crítico.

Mas para que a iniciativa popular busque sua concretização como meio de democratização e cidadania ativa, mister a informação e educação da população nesse sentido, desenvolvendo a percepção social e política. Conforme lembra AUAD (2005, p. 14):

Infelizmente, os mecanismos de participação popular no Brasil ainda não são direitos que fazem parte de nosso cotidiano político, tanto que muitos brasileiros nem sequer os conhecem. Provavelmente, o principal caminho para que a democracia semidireta saia do papel e integre nossa realidade é uma educação voltada para a cidadania, a fim de que as pessoas, ao conhecer seus direitos, sejam sujeitos ativos para sua implementação.

Na mesma linha de raciocínio, manifestam-se RODRIGUES, GONÇALVES, LYNCH, VERONESE e SANTOS (2003, p. 7):

"E se, de fato, uma democracia não se sustenta sem o respaldo das cortes e o ofício dos profissionais de direito, não é menos verdade que ela permanecerá somente no papel até que o acesso à Justiça seja amplo e irrestrito para todas as suas camadas."

E, se o acesso à Justiça - e aos tribunais - é um direito de todos, cunhado pelo princípio do amplo acesso à Justiça, ganha relevo o direito à participação de cada cidadão na realização da justiça, garantindo-se o Estado Democrático de Direito, o qual requer "o aprofundamento da democracia no cotidiano, por meio do exercício da cidadania" (PIOVESAN, 2005, p. 57).

Dentro desse contexto, passamos a analisar alguns instrumentos de democracia semidireta.

2. Plebiscito e referendo

Ao se ingressar na tentativa de se conceder uma noção do que vem a ser o plebiscito, observa-se ser relevante caracterizá-lo por meio da diferenciação que existe entre eleeo referendo. FERREIRA FILHO(2008, p. 98) denuncia que, diante de qualquer consulta feita ao povo, não raro ocorre o emprego indiscriminado dos termos plebiscito e referendo. Em seguida o autor expõe entendimento que, segundo ele, fixou-se: "plebiscito seria uma consulta extraordinária e excepcional exprimindo a opinião popular sobre medidas de base ou de princípio, tais como forma de Estado ou de governo, modificação das formas políticas, decisão acerca de mudanças de natureza territorial etc. Já o referendo consubstanciaria o poder de aprovar as leis. Seria a decisão popular sobre lei discutida e votada pelos representantes do povo. Page 21 cidadão, ao votar sim ou não a respeito do projeto oriundo do Parlamento, daria aceitação ou rejeição à medida legislativa proposta".

SILVA (2006, p. 142) também despende atenção a esses dois institutos, apresentando que "o referendo popular que se caracteriza no fato de que projetos de lei aprovados pelo legislativo devam ser submetidos à vontade popular, atendidas certas exigências, tais como pedido de certo número de eleitores, de certo número de parlamentares ou do próprio chefe do executivo, de sorte que o projeto se terá por aprovado apenas se receber votação favorável do corpo eleitoral, do contrário, reputar-se-á rejeitado; está previsto no mesmo art. 14, II, sendo da competência exclusiva do Congresso Nacional autorizá-lo (art. 49, XV), mas a Constituição não estabeleceu as condições do seu exercício; fica livre o Congresso Nacional de autorizá-lo também em matéria constitucional; ele pode mesmo expedir uma lei definindo critérios e requisitos para seu exercício; o plebiscito é também uma consulta popular, semelhante ao referendo; difere deste...

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