Conhecimento tradicional associado, expressões culturais e recursos genéticos: uma análise de impacto da regulação de direitos

AutorDany Rafael Fonseca Mendes, Adalberto Amorim Pinheiro
Páginas33-49
Revista Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 6, n. 11, p. 33-49, jan./jun. 2015
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CONHECIMENTO TRADICIONAL ASSOCIADO, EXPRESSÕES CULTURAIS E
RECURSOS GENÉTICOS:
UMA ANÁLISE DE IMPACTO DA REGULAÇÃO DE DIREITOS
Dany Rafael Fonseca Mendes*
Michel Angelo Constantino de Oliveira**
Adalberto Amorim Pinheiro***
RESUMO: Considerando os conceitos relativos aos conhecimentos tradicionais e aos
recursos genéticos, assim como sua relação com os direitos de propriedade intelectual,
o objetivo deste estudo é analisar os possíveis impactos das propostas de acordos
internacionais para regulamentação do conhecimento tradicional associado e do acesso
ao patrimônio genético no âmbito da fase de pesquisa e desenvolvimento.
Palavras-chave: Conhecimento tradicional associado. Expressões culturais
tradicionais. Recursos genéticos. Convenção sobre a diversidade biológica. Protocolo
de Nagoya.
1 INTRODUÇÃO
Apesar de ser relativamente nova, a discussão acerca das propostas de acordos
internacionais para regulamentação do conhecimento tradicional associado e do acesso ao
patrimônio genético tem ganhado importância à proporção que os países detentores desses
saberes (conhecimento tradicional associado) e recursos (patrimônio genético) começam a
entender e, notadamente, a valorar tais bens. Logo, o entendimento e, especialmente, a
valoração desses recursos começaram a gerar uma demanda pela discussão de tais interesses,
após a constituição da Organização Mundial do Comércio (OMC1), com a entrada em vigor
* Advogado; mestre em Análise Econômica do Direito pela Universidade Católica de Brasília (UCB) e bacharel
em Direito pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
** Doutor em Eco nomia pela Universidade Católica de Brasília (UCB), Mestre em Desenvolvimento Local
(UCDB) e Administrador.
*** Advogado, graduado em Direito pela Universidade Federal de Ouro Preto; Pós-Graduado em Contratos
Comerciais (UCP-PT); Mestre em Direito Privado (UCP-PT/Rev. UFMG) e Doutorando em Biotecnologia
(Bionegócios e Marcos Legais em Biotecnologia - UFAL/Renorbio).
1 Nascida em 1º de janeiro de 1995, a OMC é uma das agências especializadas da Organização das Nações
Unidas (ONU) e todas as suas realizações são o resultado das ne gociações das quais é foro. A maior parte do
trabalho da Organização vem das negociações ocorridas entre 1 986 e 1994, chamadas de Rodada Uruguai de
Negociações, e daquelas ocorridas no âmbito do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT, sigla e m
inglês). Atualmente, a OMC é o foro anfitrião de novas negociações, no âmbito da Agenda de Doha para o
Desenvolvimento, lançada em 2012. Alé m das negociações comerciais, a Organização desenvolve, entre
outros papéis, a implementação e monitoramento de acordos comerciais, a sol ução de controvérsias no âmbito
da Organização, a construção de capacidades comerciais nos países em desenvolvimento e a d ivulgação do
trabalho da Agência (WTO, 2013).
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do Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados com o
Comércio (TRIPS2).
Deixando os conceitos sobre os recursos em análise para a seção 0 deste trabalho, a
primeira discussão acerca do tema é metodológica, pois é preciso delimitar se tais bens são ou
não espécies de propriedade intelectual. Posto que o conhecimento tradicional associado e o
acesso ao patrimônio genético sejam discutidos no âmbito da Organização Mundial da
Propriedade Intelectual (OMPI3), isso, por si só, não significa que tais recursos ganhem
imediato status de propriedade intelectual. Trata-se não apenas de uma discussão conceitual,
mas, sobretudo, de uma análise marginal (custo-benefício) relativa à atribuição e à aplicação
do status de propriedade intelectual aos conhecimentos tradicionais associados e ao acesso ao
patrimônio genético.
Superada a discussão sobre a aplicabilidade do status de propriedade intelectual aos
recursos em estudo, é importante saber quais são os jogadores (Estados, grandes grupos
farmacêuticos, comunidades tradicionais etc.) envolvidos na discussão e quais os interesses
desses players. Saber quem são os interessados e quais seus interesses no tema é
fundamental para entender as discussões que vêm ocorrendo na OMPI. Embora o Brasil seja
composto de interesses divergentes, é preciso unificar o discurso do país para maximizar os
benefícios e para minimizar os possíveis danos trazidos por eventuais tratados sobre o tema.
Dessarte, não seria concebível discutir internamente os possíveis impactos de acordos
internacionais livre da delimitação de interesses, tanto nacionais (de cada ministério
envolvido) quanto internacionais.
Vistos os conceitos e interesses atinentes ao tema, resta, por fim, verificar os possíveis
impactos das propostas de acordos internacionais para regulamentação do conhecimento
tradicional associado e do acesso ao patrimônio genético no âmbito da pesquisa e
desenvolvimento (P&D). Para tanto, além de expor a legislação nacional sobre uma parte do
2 Também conhecido por Anexo 1C do T ratado de Marrakesh, o Acordo é uma das exigências à permanência
de qualquer país nos quadros da OMC e, no Brasil, foi ratificado por meio do Decreto nº 1.355, de 30 de
3 A Organização Mundial da Propriedade Intelectual é uma entidade internacional de Direito Internacional
Público com sede em Genebra, Suíça, integrante do Sistema das Nações Unidas. Criada em 1967, é uma das
16 agências especializadas da Organização das Nações Unidas (ONU) e tem por propósito a promoção da
proteção da propriedade intelectual ao redor do mundo, através da cooperação entre Estados, e o uso da
propriedade intelectual como meio de promoção da inovação e criatividade. Atualmente, é composta de 185
Estados-membros e administra 24 tratados internacionais. Em resumo, a OMPI trabalha co m Estados-membros
e as partes interessadas para melhorar a compreensão e respeito po r PI no mundo todo, fornecendo análises
econômicas e estatísticas, e contribuindo, com soluções baseadas em propried ade intelectual, para o
enfrentamento de desafios globais (WIPO, 2013).

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