Coordenadores de comunidades de repositórios institucionais: o caso do repositórium

AutorFlávia Garcia Rosa - Maria João Gomes
CargoDoutoranda do Programa de Pós-graduação Multidiscplinar em Cultura e Sociedade da Facom\UFBA - Doutora em Educação ? Tecnologia Educativa Universidade do Minho
Páginas100-115

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Flávia Garcia Rosa

Doutoranda do Programa de Pósgraduação Multidiscplinar em Cultura e Sociedade da Facom\UFBA

Universidade Federal da Bahia

flaviagr@ufba.br

Maria João Gomes

Doutora em Educação – Tecnologia Educativa

Universidade do Minho

mjgomes@ie.uminho.pt

1 Introdução

Compete aos investigadores o registo dos novos saberes, fruto das teorias e suas relações com o mundo real, através de métodos científicos de refutação ou confirmação de hipóteses e teorias (POPPER, 1972, 1971). É dessa forma que a ciência avança numa dinâmica que tem

*A realização deste estudo foi apoiado pela CAPES – Brasil e pelo CIEdUM – Portugal. As autoras agradecem a Eloy Rodrigues, Director dos SDUM e Ricardo Saraiva a disponibilização de muitos dos dados referidos neste texto.

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na comunicação científica o seu ciclo, no qual se inclui o registo, armazenamento, recuperação e disseminação desses saberes e resultados das investigações para um público mais amplo.

A chegada da Internet, e particularmente a sua enorme expansão com o surgimento do WWW no início dos anos de 1990, modificou o ciclo da disseminação da comunicação científica. Uma mudança, sobretudo estrutural – ao nível do tempo e espaço – alterando o fluxo da informação (BARRETO, 1998). No processo da construção da ciência “[...] é fundamental um trabalho coletivo, em que pesquisadores e grupos de pesquisa trabalham sobre resultados já obtidos por seus pares, e têm como objetivo acrescentar um tijolo a mais num vasto edifício.” (MARCONDES, SAYÃO, 2002, p. 44), suportado pelas tecnologias de informação e comunicação (TIC) que contribuem e facilitam o processo de troca de ideias, a discussão de resultados de investigação em tempo real e a colaboração entre investigadores.

Um dos problemas associados à disseminação do conhecimento científico decorre do elevado custo de muitas publicações periódicas de carácter científico, frequentemente na dependência de interesses editoriais e comerciais que raramente revertem em prol dos autores ou das instituições em que os mesmos estão filiados. Segundo Marcondes (2009, p. 91), “A maior parte dos títulos de periódicos acadêmicos é editada por um mercado protagonizado por oligopolistas, que assim, passaram a usufruir de ganhos.”

A partir da década de 1970, e com maior ênfase nas décadas de 1980 e 1990, o crescente custo dos periódicos científicos e as crescentes restrições financeiras de muitas universidades e centros de investigação tornou o processo de aquisição de assinaturas por parte destas instituições cada vez mais difícil, dificultando o acesso às informações geradas no âmbito das diferentes disciplinas científicas, consequentemente aumentando os obstáculos ao desenvolvimento da ciência e ampliando a desigualdade de condições de acesso ao conhecimento por parte de diferentes países, instituições e investigadores. Esta, denominada por alguns autores de “crise dos periódicos acadêmicos” (MARCONDES, 2009; RODRIGUES et al., 2004, STUMPF, 1996), causou um enorme impacto no acesso ao conhecimento produzido nos meios académicos e científicos, com destaque particular nas bibliotecas ao nível dos países em desenvolvimento.

Foi a partir desses dois eventos, primeiro o aperfeiçoamento das TIC que facilitou a disseminação e acessibilidade da informação, e segundo, a criação de barreiras associados aos elevados valores cobrados por parte das grandes editoras que controlavam o mercado das publicações cientificas, que surgiu o Movimento do Acesso Livre – Open Access Movement (OAM) – referente às publicações científicas. Este surge como “[…] uma forte reacção, de âmbito internacional, por parte de investigadores, académicos, bibliotecários e gestores de informação […]”2 (JORGE, 2006, tradução nossa). Este movimento é definido pelo “uso de ferramentas, estratégias e metodologias que denotam um novo modelo de representar um igualmente novo processo de comunicação científica.” (COSTA, 2006) e engloba questões como: software livre ou aberto; arquivos abertos; acesso aberto; e a ideia de eliminar a obrigatoriedade de cedência do copyright de artigos publicados permitindo aos autores a inserção da sua produção científica, sem restrições, em repositórios temáticos ou institucionais (LINCH, 2003), facilitando a sua disseminação de forma mais rápida, eficaz e gratuita. Segundo King (2010, p. 2, tradução nossa), “[…] o livre acesso a toda a literatura

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científica não tem apenas valor substancial para os investigadores financiados por órgãos federais enquanto leitores, mas também para outros cientistas, além de ser um ganho para a ciência e suas contribuições para economia e para a sociedade.”3

A adopção de Repositórios Institucionais tem crescido em todos os países, com ênfase nas universidades, graças ao contexto descrito anteriormente. Segundo Crow (2002, p. 16, tradução nossa), “[...] repositório institucional é um arquivo digital da produção intelectual criada pelos académicos, investigadores e alunos de uma instituição, e acessível a utilizadores finais, quer internos quer externos à instituição, com poucas ou nenhumas barreiras de acesso.”4

A Universidade do Minho (UM), situada em Braga, Portugal, participou desde 2001 em discussões em torno do Open Access Movement (OAM). Na sequência desse envolvimento, o projecto de criação e implantação do Repositório Institucional (RI) da UM – RepositóriUM5

– iniciouse em maio de 2003, tendo recolhido desde o início o apoio e confiança da reitoria da Universidade, segundo Rodrigues (2010). Esse apoio e reconhecimento da relevância do projecto para a instituição revelouse um factor essencial para o sucesso do mesmo, o qual, em Janeiro de 2010 completou seis anos de implantação e de funcionamento aberto a todas as comunidades, para além das comunidades piloto iniciais. À data de escrita deste texto, o Repositórium possui 35 comunidades activas, as quais se enquadram em diferentes unidades orgânicas (Departamentos e Centros de Investigação) da UM. Destas comunidades, duas estão directamente ligadas aos SDUM sendo uma delas destinada à disponibilização de teses e dissertações de mestrado e doutoramento.

A criação do RI da Universidade do Minho pode considerarse um marco de relevo no processo de criação de RI em língua portuguesa, uma vez que foi o primeiro repositório deste tipo em Portugal e tem constituído um referencial ao desenvolvimento de outros repositórios, nomeadamente em Portugal e nos países de língua oficial portuguesa. Assim, considerouse importante estudar, sob diferentes ângulos, o processo de implementação e disseminação do RI da Universidade do Minho, procurando aumentar o conhecimento disponível nesta área, de forma a que o mesmo possa vir a ser rentabilizado no processo de criação e desenvolvimento do RI de outras instituições. Neste texto apresentase um estudo levado a cabo entre Janeiro e Março de 2010, na Universidade do Minho, tendo como foco de análise os coordenadores das diferentes comunidades que constituem o RepositóriUM.

Optouse por estruturar este texto iniciandoo com um enquadramento geral da problemática associada ao surgimento dos RI, a que acabamos de nos reportar nos parágrafos anteriores, prosseguindo com breve revisão de literatura na qual se focam aspectos relacionados com as políticas institucionais de estímulo e dinamização de comunidades de RI contemplando os aspectos da política da instituição para a coordenação das comunidades do RI do Minho. O artigo prossegue fazendo referência aos objetivos do estudo e apresentando o desenho da pesquisa apresentando os grupos de sujeitos envolvidos e os procedimentos e instrumentos de

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recolha de dados. Na última parte fazse a apresentação e discussão dos dados recolhidos finalizando com as conclusões decorrentes dos mesmos, juntamente com um conjunto de recomendações passíveis de aplicação não só ao RI da UM, mas também a outros repositórios.

2 Das políticas institucionais à coordenação das comunidades do repositórium

O processo de implementação e desenvolvimento de RI implica um processo de dinamização dos mesmos que assegure o seu crescimento, alargue a sua visibilidade quer interna à instituição, quer externa à mesma, e que promova a sua utilização, quer por parte dos potenciais depositantes, quer por parte dos utilizadores finais. Este processo, para ser bem sucedido, passa pela definição de políticas institucionais de diversa ordem e por opções organizacionais de diferente natureza.

Briceno et al (2009), com base na experiência de oito anos de funcionamento do Repositório Institucional SABERULA da Universidade dos Andes, em Mérida, Venezuela, referem que um dos factores que contribuiu para a promoção do livre acesso ao conhecimento produzido na instituição através do repositório, foram as políticas institucionais desenvolvidas que incentivaram os produtores de conhecimento a realizar o depósito no RI.

No que diz respeito à...

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