Competição intrapartidária nas eleições para deputado federal: Um estudo exploratório sobre São Paulo em 2014

AutorCíntia Pinheiro Ribeiro de Souza - Luís Felipe Guedes da Graça
CargoPós-doutoranda na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Doutora em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). cprsouza@gmail.com - Professor do departamento de Sociologia e Ciência Política da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Doutor em Ciência ...
Páginas181-223
DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2019v18n42p181
181181 – 223
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Competição intrapartidária
nas eleições para deputado
federal: um estudo exploratório
sobre São Paulo em 2014
Cíntia Pinheiro Ribeiro de Souza1
Luís Felipe Guedes da Graça2
Resumo
Esse artigo aborda o tema da competição intrapartidária nas eleições proporcionais de lista aberta.
Embora a literatura espere que as regras eleitorais brasileiras incentivem a concorrência direta por
votos entre correligionários, poucos são os esforços para mensurar os níveis dessa competição.
A partir de correlações de votos, por zonas eleitorais, discutimos os graus de sobreposição espacial
das candidaturas dentro de quatro partidos na disputa pelo cargo de deputado federal no estado de
São Paulo em 2014. Encontramos variações nos níveis de competição intrapartidária que indicam
diferentes estratégias de coordenação na seleção de candidatos. Essa variedade mostra que, além
dos incentivos das regras eleitorais, as respostas estratégicas dos agentes a essas regras não devem
ser negligenciadas ao tratar desse tema.
Palavras-chave: Eleições. Deputado federal. Competição intrapartidária. Representação. São Paulo
Introdução
Os partidos brasileiros são tradicionalmente considerados fracos em
sua atuação na arena eleitoral, principalmente nas disputas por cargos
proporcionais. Essa fragilidade tem sido questionada por trabalhos mais
1 Pós-doutoranda na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Doutora em Ciência Política pelo Instituto
de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). cprsouza@gmail.com
2 Professor do departamento de Sociologia e Ciência Política da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Doutor em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da Universidade do Estado do Rio
de Janeiro (UERJ). lfggraca@gmail.com
Competição intrapartidária nas eleições para deputado federal: um estudo exploratório sobre São Paulo em 2014 | Cíntia Pinheiro
Ribeiro de Souza; Luís Felipe Guedes da Graça
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recentes e encontra, nas mudanças trazidas pela reforma eleitoral de 20153,
um teste à capacidade dos partidos em coordenar suas ações. Dentre as
alterações da lei, a mudança do art. 108 do Código Eleitoral de 19654 pas-
sa a exigir, do candidato, um mínimo de votos nominais igual a 10% do
quociente eleitoral. Essa mudança traz um custo claro para os partidos que
não coordenarem sua atuação eleitoral ao angariarem votos que poderão
não ser traduzidos em cadeiras. Concentrar votos em apenas um candidato
ou deixar que candidatos concorram pelos mesmos votos pode gerar ine-
ciência na busca por cargos no Legislativo.
O objetivo deste artigo é discutir o protagonismo, ou a guração, dos
partidos na coordenação das eleições proporcionais brasileiras. A ideia cen-
tral a orientar este exercício é explorar a discussão sobre o tamanho da
competição intrapartidária na disputa para o cargo de deputado federal.
O caso analisado é o do Estado de São Paulo, o distrito com a maior mag-
nitude eleitoral – 70 cadeiras – nesse tipo de eleição. Ao explorar a inten-
sidade dessa competição dentro de alguns partidos, buscamos discutir o
quanto esses contribuem para a denição das estratégias de campanha e
dos resultados eleitorais proporcionais.
Os candidatos aos cargos legislativos no Brasil têm sido vistos pela li-
teratura como muito independentes dos partidos e das lideranças durante
o processo eleitoral (MAINWARING, 1993; CAREY; SHUGART, 1995;
NICOLAU, 2006; SAMUELS, 2008). Grande parte dessa visão se deve
ao sistema eleitoral de lista aberta que opera no país. A existência do voto
preferencial é fonte de muitas expectativas teóricas sobre o funcionamento
dos partidos políticos, as coalizões de governo e a relação entre represen-
tantes e representados. O fato de os eleitores ordenarem os nomes nas
listas de candidatos eleitos de partidos e coligações cria competição intra-
partidária, situando a persona do candidato, em vez de reputação partidá-
ria, como crucial para a conquista de um assento no órgão representativo.
Baixa capacidade de controle de líderes partidários no processo de seleção
de candidaturas e predominância de redes de nanciamento ligadas mais
aos candidatos que aos partidos reforçariam o caráter personalista da dis-
3 Lei nº 13.165 de 2015, de 29 de setembro de 2015 (BRASIL, 2015).
4 Lei nº 4.737 de 1965, de 15 de julho de 1965 (BRASIL, 1965).
Política & Sociedade - Florianópolis - Vol. 18 - Nº 42 - Mai./Ago. de 2019
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puta. As decorrências desse incentivo seriam custos baixos para decisões
que fragilizem identidades partidárias, como o estabelecimento de rela-
ções paroquialistas com o eleitorado, indelidade partidária, migração de
candidatos eleitos e fraca disciplina legislativa (MAINWARING, 1995).
Parte da literatura, no entanto, tem buscado rever criticamente as hipóteses
iniciais sobre como funcionam coalizões governativas e partidos políticos
no Brasil (LIMONGI; FIGUEIREDO; 1999; BRAGA 2008, BOLOG-
NESI, 2013). Há mais racionalidade, coordenação e equilíbrios estáveis no
sistema político brasileiro do que apresentado pelas expectativas do come-
ço dos anos 1990.
A ideia de competição intrapartidária é central nas concepções sobre
como funcionam as eleições legislativas no Brasil. No entanto, ela continua
pouco explorada pela literatura. Carey e Shugart (1995), ao discutirem
formas classicatórias de sistemas eleitorais a partir dos incentivos perso-
nalistas que promovem, usam a ideia de competição intrapartidária como
um fator dicotômico, que existe quando o voto é preferencial e a lista é
ordenada pelo eleitor, ou que está ausente quando a composição da lista é
feita pelo partido. É essa crença de natureza dicotômica que ajuda a expli-
car a pouca atenção dada a medidas ou questionamentos sobre o grau dessa
competição intrapartidária dentro de cada partido.
Argumentamos aqui que a competição intrapartidária precisa ser ana-
lisada como algo além de um evento meramente dicotômico. Logicamen-
te, a competição intrapartidária existe apenas em sistemas que possuem
voto preferencial, mas ela pode tomar gradações diferentes. A atuação dos
partidos e líderes partidários na escolha dos candidatos e de estratégias de
campanhas tem efeitos diretos sobre a competição intrapartidária.
Dois candidatos competem por um voto quando apresentam suas can-
didaturas ao eleitor e buscam convencê-lo de que cada um deles é a melhor
escolha. Assim, a competição intrapartidária deve ser entendida como a
disputa eleitoral entre membros do mesmo partido pelo voto de um elei-
tor. Na disputa eleitoral por cargos na Câmara de Deputados, os candida-
tos concorrem em distritos iguais aos Estados da Federação. Por se tratar de
uma disputa com magnitude que varia de 8 a 70 cadeiras, para conseguir
sucesso eleitoral, os candidatos precisam conquistar somente uma fração

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