Common reporting standard e sigilo bancário no Brasil

AutorMateo Scudeler
CargoAdvogado. Provessor voluntário na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (FD/UnB). Mestrando em Direito Econômico pela Universidade do Porto. Bacharel em Direito pela Universidade de Brasília
Páginas59-75
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COMMON REPORTING STANDARD E SIGILO BANCÁRIO NO BRASIL
COMMON REPORTING STANDARD AND BANK SECRECY IN BRAZIL
Mateo Scudeler64
RESUMO
Acompanhando a tendência global de cooperação intergovernamental e boas práticas fiscais,
por meio de programas de transparência e trocas de informações, o Brasil assinou a
Convenção Multilateral para Intercâmbio Internacional de Informações Tributárias, aderindo
formalmente, com isso, ao Common Reporting Standard (CRS). Contudo, apesar de a recente
mudança da jurisprudência do STF haver rechaçado, por fim, a tese de inconstitucionalidade
da flexibilização do segredo bancário, consubstanciando-se em um importante avanço na
questão, verifica-se, todavia, que a internalização do tratado no ordenamento jurídico,
finalizada no ano de 2016, e a respectiva prática cooperativa internacional podem ainda vir a
sofrer questionamentos judiciais residuais em face do quadro infralegal vigente.
PALAVRAS-CHAVE: Common Reporting Standard. Trocas automáticas de informações.
Sigilo bancário.
ABSTRACT
Following the global trend of intergovernmental cooperation and best fiscal practices, through
transparency programs and exchange of information, Brazil signed the Multilateral
Convention on Mutual Administrative Assistance in Tax Matters, formally joining the
Common Reporting Standard (CRS). However, despite the fact that the recent change of the
Supreme Court jurisprudence has finally rejected the thesis of the unconstitutionality of the
flexibilization of banking secrecy, being a great step forward, it is considered, nonetheless,
that the internalization of the treaty in the legal order, completed in 2016, and the respective
international cooperative practice may still face some legal residual challenges in face of the
current legal board.
KEYWORDS: Common Reporting Standard. Automatic exchange of information. Banking
secrecy.
1. INTRODUÇÃO
A cooperação para troca de informações fiscais entre diferentes autoridades tributárias
nacionais surge como uma prática contemporânea destinada ao concertamento de países e
governos em torno do combate ao terrorismo, à corrupção, à lavagem de dinheiro e à
sonegação – e evasão – fiscal (TEIXEIRA, 2016. p. 283).
64 Advogado. Provessor voluntário na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (FD/UnB). Mestrando
em Direito Econômico pela Universidade do Porto. Bacharel em Direito pela Universidade de Brasília. Contato:
mateo@atkr.adv.br.
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A junção de esforços transnacionais para a criação de uma rede de recolha e
monitoramento automáticos de dados e perfis tributários de pessoas singulares e coletivas
visa, sobretudo, ao encerramento do cerco contra movimentos criminosos que atuam à
margem do poder estatal, bem como à repressão das práticas de planejamento fiscal abusivo
ou agressivo e evasão de divisas – dentro do conceito de base erosion and profit shifting65.
Essa estratégia político-tributária – iniciada ao longo da primeira década dos anos 2000
–, contudo, encontra-se ainda em fase de implementação jurídica e amadurecimento legal no
âmbito dos ordenamentos dos Estados que se têm comprometido com a tarefa, dentre os quais
o Brasil. Hodiernamente, o Common Reporting Standard – protocolo subsidiário à Convenção
Multilateral para Intercâmbio Internacional de Informações Tributárias da OCDE, da União
Europeia e do G20 – desponta como a maior revolução mundial acerca do tema, contando
com o envolvimento de mais de uma centena de países66.
Diante desse cenário e considerando-se a entrada em vigor da Instrução Normativa RFB
nº 1.680/201667, com efeitos a partir de 1º de janeiro de 2017 (e já com troca efetiva de
informações em setembro do mesmo ano), a questão é deveras atual, sobretudo em razão dos
possíveis conflitos internos que podem ser suscitados entre a automaticidade das trocas e a
atual ordem jurídica interna relativa ao sigilo bancário. Nesse sentido, o presente estudo
explorará a questão já sob a óptica do mais recente entendimento prolatado pelo Supremo
Tribunal Federal (STF) no Tema 225 da sistemática da repercussão geral (RE 601.314/SP).
Para tanto, será realizada, a priori, uma breve contextualização da evolução histórica
dos acordos internacionais para troca de informações, seguida da exposição sintética dos
termos gerais da internalização do Common Reporting Standard no Brasil.
Em sequência, analisar-se-á a recente jurisprudência do STF acerca das hipóteses – e
respectivos limites e condicionantes – da derrogação do sigilo bancário em favor da
Autoridade Tributária, tratada no julgamento com repercussão geral do RE 601.314/SP.
Por fim, apontar-se-á como o procedimento para trocas automáticas de informações
65 Para aprofundamento acerca do tema e pormenores das práticas enquadradas como planejamentos fiscais
abusivos ou agressivos, recomendam-se os estudos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Económico (OCDE) acerca das BEPS Action, bem como o Working Paper nº 61-2015 da Comissão Europeia
(Study on Structures of Aggressive Tax Planning and Indicators). Disponíveis, respectivamente, em:
http://www.oecd.org/tax/beps/beps-actions.htm> e http://ec.europa.eu/taxation_customs/sites/taxation>.
Acessos em: 22.fev.2017.
66 Conforme informativo da Receita Federal, o acordo em tela conta com 103 jurisdições signatárias,
encontrando-se já ratificado no ordenamento interno de 86 delas inclusive o Brasil. D isponível em:
http://idg.receita.fazenda.gov.br/noticias/ascom/2016/agosto/promulgada-convencao-multilateral-para-
intercambio-internacional-de-informacoes-tributarias>. Acesso em: 22.fev.2017.
67 Último diploma pendente para a plena transposição do acordo à jurisdição pátria, na sequência Decreto
Legislativo nº 105 (de 14 de abril de 2016) e do Decreto nº 8.842 (de 29 de agosto de 2016).

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