Comentários à Lei nº 10.028, de 19 de outubro de 2000

AutorEdson Jacinto da Silva
Páginas343-368

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Altera o Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a Lei n. 1.079, de 10 de abril de 1950, e o Decreto-Lei n. 201, de 27 de fevereiro de 1967.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º O art. 339 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 339. Dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou de ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente.”

“Pena - ...”

“§ 1º ...”

“§ 2º ...”

COMENTÁRIO_____________________________________________

O Decreto-Lei n. 2.848 de 7 de dezembro de 1940Código Penal, em seu art. 339 trata do crime de denunciação caluniosa, e até o advento da presente Lei 10.028, de 19.10.2000, possuía a seguinte redação: “Dar causa a instauração de investigação policial ou de processo judicial, contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente”.

Agora, conforme dispõe a nova redação acrescida pela Lei 10.028/00, aquele artigo passou a abranger também outros procedimentos, tais como a instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou de ação de improbidade administrativa, contra alguém, quando o agente sabe que aquele é inocente.

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O objeto jurídico do artigo supra é a proteção à administração da justiça, que não pode ficar a serviço daqueles que só pensam um usá-lo com fins escusos.

Portanto, o artigo modificado trata de crime comum, pois pode ser cometido por qualquer pessoa, servidor público ou não.

Segundo Damásio E. de Jesus:

Podem ser sujeitos ativos o Promotor de Justiça e o Delegado de Polícia, desde que estejam presentes as elementares do tipo (salvo quando movimentam a máquina policial ou judiciária em face de falsa denunciação).329

Para Heleno C. Fragoso:

Se o fato falsamente imputado for crime de ação privada ou crime de ação pública mediante representação, somente poderá haver denunciação caluniosa por parte daquele a quem compete oferecer queixa ou representação, pois é indispensável que haja possibilidade de início de um processo penal, para que seja atingido o interesse que a lei penal tutela.330

Com relação ao advogado, existem duas posições: a dos que acreditam que o mesmo poder ser sujeito ativo, e a dos que comungam a posição contrária. Esta última defende, porém, que o advogado deve responder como sujeito ativo, caso tivesse conhecimento da falsidade da imputação.

O sujeito passivo neste tipo penal será sempre a Administração Pública, pois:

A falsa imputação de crime não prejudica somente a pessoa contra quem é feita, mas também a Justiça. A pessoa se prejudica no seu sentimento de honra, no seu sossego, no seu prestígio moral, na estimação social, no seu crédito patrimonial. A Justiça prejudica-se também no seu prestígio, no seu crédito, exposta que fica a cometer injustiça e, ser convencida de ter agido mal, descriteriosamente e assim claudicar e se deixar apanhar em falso, desabonando-se, quer como garantidora de direitos, quer como repressora de crimes.331

É crime material que só se consuma com a efetiva instauração da “investigação policial”, “investigação administrativa”, “inquérito civil”, da “ação de improbidade administrativa” ou do “processo judicial332

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Assim, a tentativa, apesar de incomum, é possível quando, por exemplo, o agente denuncia o crime à autoridade competente, que, por razões alheias à vontade do agente, não chega a iniciar a investigação em razão de imediata comprovação da inocência do acusado. Para a consumação, portanto, é indispensável que a conduta do agente implique em efetiva possibilidade penal e processual penal de gerar a instauração do procedimento em questão, de forma que carecerá de elemento essencial à formação do tipo se o fato falsamente noticiado, por exemplo, for atípico, ou se estiver extinta a sua punibilidade, ou se incidir alguma excludente de ilicitude ou culpabilidade, pois nessas hipóteses inexistiria a possibilidade legal de instauração de investigação policial ou processo judicial ou dos outros procedimentos previstos no Art. 339 do CP.333Portanto, sendo crime contra a administração da justiça, é evidente que o sujeito passivo é o Estado. “Tendo-se em vista que a ação atinge ou coloca em perigo a honra, a liberdade da pessoa contra a qual a denunciação é feita, esta será também sujeito do crime”334.

Desse modo, a figura típica do art. 339 do Código Penal exige, para a sua caracterização, a presença do elemento moral, da má-fé resultante da ciência do agente que, sabendo inocente o acusado, ainda assim lhe imputa a autoria de fato penalmente relevante, dando causa ao procedimento policial, judicial, investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa.

Assim, a materialidade do fato consiste em dar causa à instauração de investigação policial ou a processo judicial, instauração de investigação administrativa, ou a inquérito civil ou ainda a ação de improbidade administrativa contra alguém a quem é imputada falsamente a prática de infração penal. Pode, assim, este crime ser praticado por uma denunciação formal (que os italianos chamam de calunnia diretta), hipótese em que o agente apresenta a denúncia diretamente (em forma oral ou escrita) à autoridade policial, judiciária ou administrativa. Pode igualmente, ser praticada de forma indireta, quando o agente dá causa, por qualquer meio, à instauração de investigação ou processo. Neste último caso, pode tratar-se de denúncia anônima ou feita maliciosamente a terceiro de boa-fé (para que este leve o fato ao conhecimento da autoridade), bem como de qualquer outra espécie de maquinação astuciosa (como se diz no Código suíço, art. 303), pela qual o agente aponta como culpada uma pessoa inocente (exemplo: colocação de coisa furtada no bolso de alguém). Como dizia Gautier335, é mister que tais manobras sejam bastante significativas, para constituírem inequivocamente uma falsa imputação.

A ação incriminada consiste em dar causa, ou seja, em provocar, por qualquer meio, a instauração de inquérito policial ou judicial, ou a inquérito civil ou a

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processo administrativo, imputando a alguém a prática de um crime (portanto, se o agente atribui à vítima a prática de uma contravenção, deve ter a pena atenuada). Crime é o fato que a lei penal vigente define como delituoso, impondo-lhe uma sanção penal criminal. Tanto faz que se trate de crime verdadeiramente ocorrido (praticado por terceiro), ou de fato imaginário. Não haverá denunciação caluniosa, pela razão já acima referida, se o crime imputado já tiver a punibilidade extinta (anteriormente à denunciação), pela prescrição, decadência, anistia, e outras.

A acusação deve ser objetivamente falsa, isto é, deve referir-se a fato inexistente ou que não foi praticado pela pessoa acusada. Deve ter por objeto fato e pessoa determinadas.336

Ocorre, portanto, a denunciação caluniosa não só quando é atribuída infração penal verdadeira, mas de que não participou, como quando se atribui a alguém infração penal inexistente. Nesta última hipótese se inclui a refalsada imputação de infração mais grave do que a realmente praticada, afirmando-se circunstâncias não ocorrentes. É indispensável que o fato constante da falsa denunciação seja imputado a pessoa determinada (facilmente identificável pela descrição ou sinais dados), constitua típico ilícito penal (correspondente a um molde penal), não excluído, declaradamente, por causa discriminante, ou cuja punibilidade não esteja extinta, ou não seja, excepcionalmente, afastada in concreto (hipótese de escusa absolutória), pois, de outro modo, estaria conjurada a possibilidade legal de instauração de investigação policial ou processo judicial, investigação administrativa, inquérito civil ou ainda a ação de improbidade administrativa. Assim, não se apresenta o crime de denunciação, por exemplo, se o denunciante afirma que X matou Y em legítima defesa, ou se, pela indicada data do crime, já se tenha operado a prescrição.

O delito de denunciação caluniosa exige dolo específico, consistente em ter, o denunciado, consciência de que não existiu o fato e mesmo assim vir a acusar dele algum inocente.337

Portanto, a denunciação caluniosa é eminentemente dolosa, não se configurando por culpa nem por dolo meramente eventual; é necessária a certeza moral da inocência do imputado.

Embora o delito de denunciação caluniosa se corporifique tão só com a instauração da investigação policial ou com a propositura da ação penal contra a pessoa que se sabe inocente, somente após o arquivamento do inquérito será possível qualquer iniciativa no sentido do processo contra o denunciante.338

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• • •

Art. 2º O Título XI do Decreto-Lei n. 2.848, de 1940, passa a vigorar acrescido do seguinte capítulo e artigos:

“CAPÍTULO IV

DOS CRIMES CONTRA AS FINANÇAS PÚBLICAS”

“Contratação de operação de crédito”

“Art. 359-A. Ordenar, autorizar ou realizar operação de crédito, interno ou externo, sem prévia autorização legislativa.”

“Pena - reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos.”

“Parágrafo único. Incide na mesma pena quem ordena, autoriza ou realiza operação de crédito, interno ou externo.”

“I - com inobservância de limite, condição ou montante estabelecido em lei ou em resolução do Senado Federal;”

“II - quando o montante da dívida consolidada ultrapassar o limite máximo autorizado por lei.”

COMENTÁRIO_____________________________________________

Sob este título, até a edição da presente lei, eram enquadrados 22 crimes e agora aquele título passa a ser acrescido de mais um capítulo (IV), que trata dos crimes contra as finanças públicas, composto por mais 8 (oito) tipos penais.

Assim, aquele título, que anteriormente tratava de 22 crimes, passa a enquadrar 30 crimes, sendo que os artigos acrescidos passaram a seguir a mesma numeração do artigo 359, sendo acrescido das...

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