O combate à obsolescência no Brasil: a análise do ordenamento jurídico brasileiro

AutorCristiano Dos Reis Fernandes, José Heder Benatti
Páginas148-166
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Cristiano dos Reis Fernandes • José Heder Benatti
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 11, n. 2, p. 148-166, jul./dez. 2020.
correlating it to the contemporary way of life, analyzing the protection of consumers and the
environment against this practice, both in Brazil and in countries such as France and Spain,
when the lack of specic legislation is observed in Brazil. Thus, it concludes that the ght
against planned obsolescence is not regulated in Brazil and that it has much to contribute to
avoid the generation of solid waste. It points to the need to dene the criteria for the useful life
of a product, the application of extended civil liability to suppliers based on the polluter pays
principle, the adoption of measures to the National Policy on Climate Change regarding Carbon
Credits, the need to legislative measures under national jurisdiction to regulate the ght against
planned programmed in the National Policy on Consumer Relations and the National Policy for
Waste Management.
Keywords: Planned obsolescence. National Policy for Waste Management. Consumer.
1 INTRODUÇÃO
A rapidez com que os produtos se tornam obsoletos e necessitam serem substituídos
é uma percepção que cada vez mais é notada pelas pessoas. Desse fenômeno dois aspectos se
destacam, um no campo do direito do consumidor, uma vez que essa substituição constante
causa prejuízos aos consumidores especialmente os mais pobres, e outro no campo da
proteção ao meio ambiente em razão do descarte dos produtos e de existência de elementos
altamente contaminantes nesses resíduos sólidos.
Foi necessário investigar como o Estado Brasileiro está protegendo os consumidores
e o meio ambiente em relação a esse fenômeno que tem aumentado a descartabilidade dos
produtos adquiridos pelos consumidores.
Dentre as possibilidades para explicar esse fenômeno de diminuição da vida útil dos
produtos adquiridos pelos consumidores está a obsolescência programada que consiste na
intencional redução do tempo de vida útil dos produtos (OLIVEIRA DA SILVA, 2012), o que
implica no induzimento dos consumidores à aquisição de novos bens, uma prática que já é
expressamente considerada ilegal e combatida em alguns países como a França e a Espanha,
mas que no Brasil não está regulamentada.
Portanto, investigamos como o Brasil está tratando e reprimindo a prática da
obsolescência programada considerando que essa prática dos produtores de bens implica em
majoração da geração de resíduos sólidos e investigamos a realidade da geração de resíduos
sólidos de uma grande capital do Brasil, que foi Manaus, capital do Estado do Amazonas, uma
vez que são os municípios que gerem o sistema de coleta de resíduos sólidos.
Partimos da hipótese de que há prejuízo aos indivíduos em seu aspecto econômico e
n ance iro , e há pr eju ízo à so cie dad e qua ndo à ut ili zaçã o dos recu rsos natur ais pa ra a pro duç ão
de novos bens sem o adequado exaurimento do uso dos bens produzidos anteriormente que
em tese ainda são ser víveis. Outro efeito direto é o lixo que surge com o descarte dos bens
articialmente tornados “inservíveis”.
Dess a forma, entendemos que ex iste uma g rande impor tância no estudo aprofundado
desse fenômeno de encurtamento da vida útil dos produtos, já que isso provoca consequências
na s re servas de re curs os natu ra is , mui tos de ste re cu rsos mi ne rai s sã o ra ros , devid o ao au me nto
da demanda de produtos novos que implica também no aumento da geração de resíduos
sólidos e no estímulo aos consumidores à uma roda viva de gastos com a aquisição de novos
produtos em substituição dos propositalmente tornados obsoletos. Esta lógica acaba afetando
mais gravemente os mais pobres, pois sacrica suas escassas receitas de forma exauriente.
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O COMBATE À OBSOLESCÊNCIA NO BRASIL: A ANÁLISE DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 11, n. 2, p. 148-166, jul./dez. 2020.
Diante da possibilidade de a obsolescência programada estar prejudicando os
consumidores, o meio ambiente e por consequência a economia sustentável, esta pesquisa
busca investigar como os Estado Brasileiro tem enf rentado o problema.
A partir dessas considerações, esta pesquisa busca responder a seguinte pergunta: É
preciso ter lei que implemente de forma expressa o combate à obsolescência programada?
Para responder esta indagação analisaremos a obsolescência programada a partir da
Política Nacional de Proteção das Relações de Consumo e da Política Nacional de Resíduos
Sólidos, e como a matéria tem sido tratada no Brasil.
Antes disso, inves tigamos o modo de vida do humano contemporâneo como sujeito
de uma sociedade de consumo e sua dependência do mercado de consumo. Em seguida,
conceituamos a prática da obsolescência programada e suas implicações, seguida da análise
do impacto que ela causa prática causa
Para enm ser analisada a proteção jurídica dos consumidores e do meio ambiente
contra a prática da obsolescência programada, investigando o cenário jurídico no Brasil e
comparando-o a países como a França e Espanha, pois há nesses ordenamentos jurídicos leis
de defesa do consumidor e leis de proteção ao meio ambiente que tratam dessa prática de
redução da vida útil dos produtos.
Por conseguinte, apresentamos suges tões de modicações legislativas entendidas
necessários para a efetivação do combate à obsolescência programada.
Para cumprir esses objetivos, esta pesquisa é exploratória em relação aos fenômenos
jurídicos, qualitativa por interpretar os fenômenos objetos da pesquisa, por procedimento
bibliográco e documental, limitando-se no aspecto jurídico à análise do direito do
consumidor e do direito ambiental do Brasil em relação à prática da obsolescência programada,
correlacionando-o aos ordenamentos jurídicos da França e da Espanha.. A coleta de dados
ocorreu por levantamento de informações em bibliograas e documentos e a análise desses
dados ocorreu pela síntese das informações obtidas.
Assim, esperamos que os resultados desta pesquisa possam despertar olhares para
o tema do combate à obsolescência programa e com isso sejam adotadas medidas para a
proteção dos consumidores, do meio ambiente e, por consequência, da economia sustentável.
2 O MODUS VIVENDI DO HUMANO CONTEMPORÂNEO COMO SUJEITO DE
UMA SOCIEDADE DE CONSUMO
Há determinadas mudanças no modus vivendi do humano que causaram signicativas
alterações de rea lidade. Schwab (2016) dest aca a ocor rência da Revolução Ag rícola há cerca de
10.000 anos quando o humano passou a agregar força própria e força animal para produção,
transporte e comunicação. Muito tempo depois, após um lento processo de urbanização,
houve uma grande aceleração da transformação do modo de vida humano fomentada pelas
revoluções industriais.
A 1ª Revolução Industrial ocorreu entre 1760 e 1840 com a produção mecânica movida
por motores a vapor (carvão e aço) substituindo a força motriz humana e animal. Já no nal
do Século XIX e início do Século XX houve a 2ª Revolução Industrial decorrente do emprego
da energia elétrica e da massicação da produção industrial por emprego de técnicas de
produção denominada “linha de montagem” (SCHWAB, 2016).
E na década de 1960 ocorre a 3ª Revolução Industrial, chamada de “Revolução Digital
ou do computador” quando foram empregados semicondutores e computação (anos 60)
seguida de acesso pessoal a computadores (anos 70 e 80) até o acesso à internet (anos 90).

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