Limitações para ampliação da cobertura previdenciária no Brasil e no Chile: um estudo sob a ótica da economia política dos sistemas-mundo

AutorGustavo Fabiano da Costa
CargoMestre em Economia e Professor Substituto no Departamento de Economia da Universidade federal de Santa Catarina
Páginas134-164
LIMITAÇÕES PARA AMPLIAÇÃO DA COBERTURA
PREVIDENCIÁRIA NO BRASIL E NO CHILE:
UM ESTUDO SOB A ÓTICA DA ECONOMIA
POLÍTICA DOS SISTEMAS-MUNDO
Gustavo Fabiano da Costa1
Resumo
O propósito deste artigo é analisar as transformações que a política de previ-
dência social sofreu no Brasil e no Chile após meados de 1970, relacionando-
as com movimentos da economia-mundo que delineiam uma conjuntura em
escala mundial com mudanças signif‌icativas nos processos de acumulação e
de intervenção estatal. No território chileno os investimentos em atividades
de produção e comércio líderes do processo de acumulação no pós-guerra já
mostravam saturação em meados de 1970, o que, paralelamente ao potencial
demonstrado por movimentos sociais em virtude do rápido crescimento da
população urbana, inf‌luenciou a instauração da ditadura que impôs uma série
de medidas impopulares no campo previdenciário entre 1974 e 1981. Como no
Brasil os investimentos em atividades de produção e comércio apresentaram
recuo signif‌icativo somente no início dos anos 1980, a vigência de governos
ditatoriais até aquele momento mais produziu do que enfrentou movimentos
democráticos no país. Medidas impopulares no campo previdenciário foram
tomadas especif‌icamente nos anos de 1998 e 2003, sem ligação com o autorita-
rismo. Apesar das defasagens temporais das mudanças nos dois países, devidas
às diferentes correlações de forças internas entre as classes, o artigo conclui
que a política de previdência social passa por transformações no Brasil e no
Chile em consonância com a conjuntura da economia-mundo capitalista.
Palavras-chave: Previdência Social; Seguridade Social; Previsão Social;
Capitalismo; Economia-Mundo.
Classif‌icação JEL: I18, N36,
1 Mestre em Economia e Professor Substituto no Departamento de Economia da Universidade federal de Santa
Catarina. E-mail: gustav_cost@yahoo.com
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Limitações para ampliação da cobertura previdenciária no Brasil e no Chile: um estudo sob a ótica da
Economia Política dos Sistemas-Mundo
Textos de Economia, Florianópolis, v.10, n.2, p.134-164, jul./dez.2007
1. INTRODUÇÃO
Há um quarto de século que a “reforma da previdência” se impõe
em uma quantidade crescente de países como algo que muitos dos atores
sociais julgam necessário, imprescindível ou mesmo inevitável. Esta não
é uma questão menor, pois ao aderirem a tal movimento os governos mo-
dif‌icam princípios fundamentais nos programas previdenciários que em
décadas anteriores pareciam ser inerentes à natureza dos próprios Estados
nacionais. Ocorre que os governos não têm podido ou mesmo desejado
resistir às pressões para se retirarem ou diminuírem a participação do
Estado na Previdência Social. Ora, isso representa uma grande mudança
em relação ao período anterior, vale dizer, aquele que vai dos anos 1930
até o início da década de 1980.
De fato, desde o imediato pós-guerra, no bojo de acordos internacionais
voltados à estabilização e mesmo restabelecimento das relações sociais nos
diferentes Estados nacionais, a política de previdência social passaria a ser
desenvolvida como mecanismo de equiparação das condições de existência
dos indivíduos no interior dos países, sob a bandeira da “justiça social”.2
Nesse momento a previdência é promovida como “direito de cidadania” no
sistema de Estados nacionais, e se desde então este direito não se realizou
em todas as regiões no mundo, ainda permanece como aspiração legítima
por parte das populações residentes nos diversos Estados nacionais.
O presente trabalho considera a estabilidade social alcançada no interior
dos países a partir do imediato pós-guerra uma condição decisiva para o
investimento massivo de capitais em atividades de produção e comerciali-
zação de bens materiais intensivas em força-de-trabalho, e que teve como
um de seus resultados a expansão de direitos sociais garantidos através da
2 Em um dos acordos internacionais que marcam o período do imediato pós-guerra, realizado ainda em 1944 na
cidade da Filadélfia nos Estados Unidos da América (EUA), vários representantes de Estado (governos) reuniam-se
por intermédio da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e concordavam com relação à necessidade de que
diversas práticas relacionadas ao trabalho passassem a ser pautadas pela “justiça social”, entre as quais “... proteção do
trabalhador contra enfermidades, sejam ou não profissionais, contra os acidentes de trabalho, proteção das crianças,
dos adolescentes e das mulheres, aposentadoria por idade e por invalidez (OIT, 1944: Preâmbulo)”. Esse conjunto
de práticas caracterizou a chamada política de previdência social implementada posteriormente em diversos países, a
qual, mesmo apresentando especificidades em cada local onde foi sendo desenvolvida, seguiu por décadas aqueles
princípios fundamentais que expressavam preocupações dos governos no imediato pós-guerra.

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