Raça, classe e revolução no Partido Comunista Brasileiro (1922-1964)

AutorPedro C. Chadarevian
CargoProfessor nos Cursos de Graduação e Mestrado em Economia da Universidade Federal de São Carlos ? Campus Sorocaba. Graduação e Mestrado em Economia pela Universidade de São Paulo; Doutorado em Economia pela Universidade de Paris 3 ? Sorbonne Nouvelle
Páginas255-283
Política & Sociedade - Florianópolis - Volume 11 - Nº 20 - abril de 2012
Artigo
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Raça, classe e revolução no Partido
Comunista Brasileiro (1922-1964)
Pedro C. Chadarevian1
Resumo
O PCB, ativo participante no debate econômico brasileiro entre sua
fundação em 1922 e 1964, tem uma contribuição pouco conhecida
para a análise do problema racial. A partir de um levantamento junto
a documentos, revistas e manifestações de economistas e intelectuais
do partido, foi possível distinguir duas fases radicalmente opostas
na abordagem comunista da questão. Em um primeiro momento, até
meados dos anos 1930, o PCB nega a existência de um problema de
desigualdade racial no país, posição que lhe custaria duras críticas por
parte de Moscou. Em seguida, o partido esteve por vezes na vanguarda
da crítica do racismo, apesar dos limites de seu quadro analítico para a
leitura dos problemas econômicos do país de uma maneira geral.
Palavras-chave: comunismo, questão racial, pensamento econômico e
social brasileiro.
1. Introdução
Que lugar ocupou a questão racial no debate econômico do de-
senvolvimento no Brasil? Se nos dedicássemos a ler apenas a
contribuição de autores centrais do desenvolvimentismo que domi-
nam o debate no período 1945-1964, tais como Roberto Campos,
1 Professor nos Cursos de Graduação e Mestrado em Economia da Universidade
Federal de São Carlos – Campus Sorocaba. Graduação e Mestrado em Economia pela
Universidade de São Paulo; Doutorado em Economia pela Universidade de Paris 3 –
Sorbonne Nouvelle. E-mail: pedro-chadarevian@ufscar.br.
http://dx.doi.org/10.5007/21757984.2012v11n20p255
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Celso Furtado ou Ignácio Rangel, seríamos levados a constatar a
ausência completa de análise do fenômeno. Por outro lado, é certo
que a versão sociológica do desenvolvimentismo – a sociologia da
modernização – produziria uma extensa contribuição ao estudo
das relações raciais no país2. Esta visão, como veremos a seguir,
teve uma influência determinante no período, ao colocar o precon-
ceito como elemento indissociável do modo de funcionamento da
sociedade brasileira.
Com este artigo, queremos chamar a atenção para o fato
que um dos atores centrais do pensamento econômico daquele
período, o Partido Comunista Brasileiro (PCB), teve uma participa-
ção política e teórica considerável nas discussões sobre o racismo
no país. Contrariamente do que se supõe e do que se tem afirmado
na literatura sobre o assunto3, o PCB possuía uma interpretação
complexa e articulada da questão racial no Brasil. A gênese desta
interpretação, sua evolução, seus equívocos e reviravoltas, serão o
objeto de análise do presente artigo. É indiscutível que, à luz do
pensamento dos autores comunistas, o discurso econômico que
deriva do período evolui em relação ao racismo científico, paradig-
ma que havia regido o debate até a II Guerra Mundial e cujo dog-
ma justificava a pobreza negra sob o fundamento da inferioridade
inata. Porém, – e esta é nossa hipótese central –, a fundamentação
epistemológica que orienta o discurso e a prática do economista
no período, conduz a uma concepção extremamente limitada do
problema racial, condenando-a a uma prioridade de segunda or-
dem, e contribuindo, indiretamente, à manutenção das desigual-
dades raciais na economia.
A produção teórica do PCB tem sido classificada como a ver-
tente socialista ou democrático-burguesa, dependendo do autor, do
ciclo ideológico do desenvolvimentismo do pensamento econômico
brasileiro (MANTEGA, 1991; BIELSHOWSKY, 2000). É fundamental
2 Veja-se, especialmente, Bastide e Fernandes (1955), Costa Pinto (1953) e Fernandes
(1965).
3 Gevanilda dos Santos afirma por exemplo, em recente artigo, que o PCB “desconhece
e, consequentemente, não debate as relações raciais” (IANNI et al., 2005, p. 24)

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